Brasil

Crítica de Haddad à mídia não inclui os próprios erros


 
Por Gabriel Priolli
O depoimento-ensaio de Fernando Haddad, publicado na revista piauí e reproduzido aqui no Nocaute, é certamente um texto político de alta octanagem, razão pela qual, com toda justiça, ele já incendeia o debate público.
 
O texto contém inúmeros temas que merecem ser dissecados e no mínimo um furo jornalístico – a informação de que os presidentes Putin e Erdogan, da Rússia e da Turquia, telefonaram para Dilma em 2013, para alertá-la sobre a possível orquestração externa das chamadas Jornadas de Junho.
 
Depreende-se do texto que Haddad sofre da mesma soberba que critica em Dilma, corretamente, embora a sua tenha mais a configuração de vaidade acadêmica.
 
Ambos parecem ter dificuldade de enxergar o próprio papel nos fatos de que participaram em posição-chave, imputando as derrotas que sofreram apenas a fatores externos e nunca a seus próprios erros.
 
A análise que Haddad faz da imprensa é um bom exemplo disso. O depoimento é precioso ao traduzir em experiência concreta, fatos palpáveis, tudo que os críticos apontam de partidarismo, manipulação e uso interesseiro dos meios de comunicação, pela elite que os controla.
 
Ficamos sabendo que um dos irmãos Marinho tentou convencer Lula a disputar a eleição em 2014, negando a vaga de reeleição a Dilma. Assim como o seu pai procurou direcionar a política brasileira desde 1925, quando assumiu a direção de O Globo.
 
Ficamos sabendo que a Record fez campanha contra Haddad na prefeitura porque construiu o Templo de Salomão de forma irregular, e teve despesa alta para regularizá-lo.
 
Soubemos que a Bandeirantes também partiu para o ataque quando Haddad vetou a Fórmula Indy no Anhembi, que atrapalhava o trânsito na cidade e não trazia recursos significativos para o turismo.
 
Vimos como a Folha, ciosa do seu progressismo, serviu à demolição do projeto de educação e de tolerância com a diversidade sexual lançado por Haddad no Ministério da Educação, contribuindo para reforçar o preconceito ao difundí-lo como um terrível “kit gay”. Apenas para não valorizar uma boa iniciativa petista.
 
Haddad também nos divertiu bastante ao incluir Estadão, Record, Bandeirantes e rádio Jovem Pan na “segunda divisão” da mídia paulista, que é a série em que, efetivamente, elas disputam o poder midiático – embora sejam muito boas de ataque.
 
Ocorre, entretanto, que assim como o PT é historicamente incompetente e negligente com a comunicação, Fernando Haddad também foi, nas suas passagens pelo poder federal e municipal.
 
Ao tempo do MEC, Haddad desconsiderou totalmente a rede de televisão universitária que eu e colegas de todo o país organizamos, e que poderia articular 150 canais para fortalecer a educação em todos os níveis, sobretudo a educação de cidadania.  Ele nunca nos deu o apoio que tanto solicitamos.
 
Na Prefeitura, Haddad foi ingênuo ao não fazer publicidade, em nome da economia de recursos, erro que João Dória não comete.
 
Também desconsiderou outra fabulosa ferramenta à sua mão, o Canal da Cidadania, previsto na regulamentação da TV digital, que custaria pouco implantar e daria à Prefeitura uma voz autônoma de comunicação com a cidade de São Paulo.
 
Só lembrou dele na campanha eleitoral de 2016, depois de anos de apelos angustiados que tantos lhe fizeram.
 
As mazelas da mídia brasileira estão cada vez mais expostas e vão exigir uma reforma séria, quando a democracia e a republicanismo voltarem ao país.
 
Mas é também indispensável que os erros e vacilações da esquerda, nesse campo da comunicação, sejam igualmente expostos e criticados, para que, em caso dela voltar ao poder, não nos ofereça mais do mesmo.

Notícias relacionadas

  1. Avatar
    Pablo Ferreira says:

    Fernando Haddad foi perfeito. Dilma não foi soberba, ela parecia saber exatamente onde o país iria parar. E o Haddad não deveria continuar dando dinheiro a uma imprensa que o perseguiu e o perseguiria até o fim do mandato.
    Já quanto ao decreto da TV Digital, isso não faria diferença com um governo federal trabalhando contra ele. As pessoas reconhecem as ações, não a propaganda. Tanto que Lula saiu da presidência com 87% de aprovação, um recorde mundial.

    • Avatar
      Nazélia Pereira da Cruz says:

      Iria falar exatamente isso Pablo.
      As ações que Dilma e Haddad fizeram vão permear o imaginário da população por décadas, não foram ações deletérias, mudaram a vida da pessoas. Essa é a melhor propaganda. Doria por exemplo já está caindo nas pesquisas de opinião e Dilma? A cada reforma retrograda no congresso o povo se lembra de Dilma

  2. Avatar
    Felipe José Lindoso says:

    Gabriel,
    Parabéns. Ótimas observações.
    Seria interessante você tratar mais e melhor da incompetência e do descaso do PT (e dos governos petistas) em relação à mídia. Não apenas em função dos canais públicos de TV, mas também em relação à mídia impressa. Essa história de repassar grana para os jornalões, e achar que compensaria isso com os tostões para a imprensa regional, foi também trágica.
    Cada vez que ando pela Paulista (e qualquer avenida de cidades grandes, médias e pequenas), a bílis me sobre ao ver os posters de propaganda – as capas dos jornais – estampadas pela rua inteira.
    O papo defendido pelo Franklin e pelo Ottoni (dentre outros), de que a mídia impressa está morrendo, esquece o papel ideológico que elas cumprem. Imagina se o Getúlio não tivesse uma Última Hora. Teria caído muito antes. Por aí.

  3. Avatar

    Caro Gabriel
    Me desculpe, sua crítica foi pobre. Parece algo como ressentimento…Aconteceram erros…claro e muitos. Não investir em comunicação foi um deles, mas isso não foi você que descobriu.
    Você conseguiu marcar sua posição, ótimo! Repito sua crítica, foi muito pobre!!!!

  4. Avatar
    João Leonel dos Anjos says:

    Primeiro é bom lembrar que a administração Haddad teve 04 “brutos”. Em termos líquidos talvez tenha sido menos da metade se considerarmos os boicotes do judiciário (vide IPTU), dos “inocentes” do passe livre e, principalmente, da mídia citada. Ainda asimm, todos os erros de Haddad somados e multiplicados por mil tem um peso ínfimo se comparados ás ações da grande mídia citada. O comentário coloca de uma forma que as atitudes da Globo, Record, Band e FSP são normais e , pasmem, corretas. A opção de Haddad em priorizar recursos para outras áreas em relação à publicidade mostra o comprometimento dele com o trato da coisa pública. Mas é por causa de uma mentalidade como a do comentarista que isso não dá certo, para estes é mais importante fazer pouco e falar muito do que fazer muito e falar pouco.
    Quanto à questão do Canal da Cidadania, dado o contexto presente, seria válido um esforço maior de investimento nessa área, ficando claro que num curto/médio prazo nem cócegas faria na concorrência, isto é, chamá-la de fabulosa é exagero ou ressentimento como já comentaram.

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *