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Crise migratória: “Nós estamos aqui porque vocês estavam lá”

A verdade é que a atual crise migratória tem suas raízes em mais de seis décadas de políticas intervencionistas levadas a cabo pelos Estados Unidos em diversas partes do mundo.

A política de “tolerância zero” de Trump contra imigrantes já vem levando a consequências aterradoras: pessoas que vivem há décadas nos Estados Unidos se veem obrigadas a voltar para países que já nem reconhecem mais. Crianças acabam sozinhas em unidades de detenção. Outras tantas enfrentam um destino ainda pior: no final de 2017, o governo admitiu ter perdido quase 1.500 crianças que haviam sido forçosamente retiradas de suas famílias e colocadas em lares provisórios. Crianças de três, quatro, cinco anos se veem obrigadas a enfrentar um tribunal desacompanhadas, ou a escolherem um dos pais enquanto assistem ao outro ser sumariamente deportado.

Se o debate sobre o tratamento dado a esses imigrantes pelos aparatos policialescos dos Estados Unidos é sem dúvida de suma importância, esse não é um tema simplesmente de política interna, mas sim um reflexo da política externa dos Estados Unidos.

Enquanto Democratas e Republicanos se culpam mutuamente (aqui vale lembrar que Obama foi, até o momento, quem mais deportou imigrantes na história recente dos Estados Unidos), a verdade é que a atual crise migratória tem suas raízes em mais de seis décadas de políticas intervencionistas levadas a cabo por ambos os partidos, tanto na região quanto em outras partes do mundo.

Políticas que semeiam violência, que são expressas em intervenção militar, imposição do neoliberalismo econômico, e que minam a democracia e a estabilidade dos mais diversos países. Criando vácuos de poder que deixam cicatrizes profundas nessas sociedades. Só para citar alguns exemplos: o golpe de Estado orquestrado pela CIA na década de 50 contra Jacobo Arbenz na Guatemala. Resultou em décadas de instabilidade governamental que, eventualmente, evoluiu para uma guerra civil que deixaria um saldo de mais de 200.000 mortos. Em Honduras, o golpe de 2009 foi acompanhado de uma forte escalada de violência e de um aumento sem precedentes da atuação de cartéis, especialmente nas áreas fronteiriças. A taxa de homicídios hondurenha é hoje a maior do mundo. E, cinco anos após o golpe contra Zelaya, o número de crianças que cruzaram ilegalmente a fronteira dos Estados Unidos aumentou em mais de 1.200%.

Contras na Nicarágua, NAFTA e México, paramilitares na Colômbia, sanções contra a Venezuela… A lista é longa. O fator em comum? A obsessão dos governos dos Estados Unidos em não permitir a existência de governos que não sigam a agenda imposta por Washington – não importando as consequências. A longa história de intervenção estadunidense nos assuntos alheios agora vem bater à sua própria porta.

Mais Nocaute:

Após três meses do incêndio, moradores de prédio do Paiçandu continuam desabrigados

“Querido Lula”

 

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    José Eduardo Garcia de Souza says:

    A articulista confunde épocas e mistura eventos e resultados díspares entre si como tentativa de colocar as migrações para os EUA como consequência direta das suas intervenções em outros países E, como se não bastasse,usa para título deste “artigo” um slogan que foi criado durante os primeiros problemas raciais e culturais ocorridos no Reino Unido com o fenômeno da “migração reversa imperial”, iniciada em 1948 e que teve o seu ápice com a imigração em massa de caribenhos das colônias.
    Seria recomendável que lesse “Empire Windrush”, por exemplo, ou, caso não consiga enfrentar livros e pensamentos mais densos na sua sanha condenatória dos EUA pelo que quer que seja e com o que quer que seja, basta consulta a http://www.postcolonialweb.org e/ou “We Are Here Because You Were With Us: Remembering A. Sivanandan (1923–2018)”, em https://ceasefiremagazine.co.uk/us-remembering-a-sivanandan-1923-2018/.

  2. Avatar

    O comentário do senhor José Eduardo Garcia de Souza é inteiramente inapropriado, forçando-nos a ler no texto de Aline Piva coisas que absolutamente não estão nele. Piva de maneira alguma ‘confunde épocas e mistura eventos e resultados díspares entre si’ para, segundo Souza, ‘colocar as migrações para os EUA como consequência direta das suas intervenções em outros países’. Pelo contrário, Piva articula de maneira clara e consistente determinados fatos históricos e mostra de maneira insofismável os resultados desastrosos de tais fatos (desastrosos, frise-se, para todas as partes envolvidas). Portanto, a boa-fé jornalística de Piva é inatacável, desmentindo inteiramente a má-fé a ela atribuída por Souza (cito-o: ‘sua sanha condenatória dos EUA pelo que quer que seja e com o que quer que seja’). Absolutamente lamentável, assim, que o senhor Souza venha a público para fornecer a este uma leitura desviante do texto esclarecedor de Piva, supondo que tal público deixar-se-ia engabelar e mergulharia acéfalo nas águas turvas de seu comentário. Agradeço muitíssimo Aline Piva por mais uma intervenção jornalística precisa, verdadeiramente democrática e cosmopolita.

  3. Avatar

    Aline sua postagem explicita exatamente o que e democracia para este paizinho do norte, para nosso povo o melhor desde que possamos mandar e desmandar no mundo todo e faze-los obedecer em tudo o que queremos.
    Israel seu afilhadinho e cumplice age exatamente igual contra quem pensa diferente e se acham vitimas de qualquer coisa que seja contra a vontade deles.

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