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A passagem de Ho Chi Minh pelo Rio de Janeiro

Olá, amigos do blog Nocaute. Aqui é o seu correspondente Ariel Seleme, diretamente de Hanói. Vamos falar hoje sobre a passagem de Ho Chi Minh pelo Rio de Janeiro.

Eu estive aqui pesquisando, estive na Universidade de Hanói, no mausoléu, no Museu de Ho Chi Minh, em Hanói. Estive com diplomatas, historiadores. Eu acho que eu consegui, basicamente, tudo o que tem sobre Ho Chi Minh e sua passagem pelo Rio de Janeiro. Ho Chi Minh, o grande líder vietnamita. O grande herói vietnamita, da independência.

Bom, a trajetória de Ho Chi Minh até o Rio de Janeiro começa em junho de 1911, quando ele sai do porto de Saigon para Marseille, em um navio francês chamado Admiral Tréville. Ele tinha 20 anos.

Ele saiu em junho de 1911. Por que ele saiu? Ele foi expulso de uma escola onde estudava porque ele traduziu um documento que trabalhadores rurais vietnamitas escreveram para fazer reivindicações junto aos franceses. Ele traduziu esse documento do vietnamita para o francês e em função disso a escola o expulsou. Ele tentou alguns trabalhos, chegou a ser professor, mas já estava na lista negra da polícia francesa e por fim resolveu sair do Vietnã.

Embarcou com destino a Marseille, na França, em 1911. Chegou em Marseille no final de julho de 1911 e ficou lá até o início de 1912. Em Marseille ele trabalhou como sapateiro e jardineiro. No navio francês, ele era ajudante de cozinha. Muito elogiado pelo trabalho e muito querido pelos franceses.

De Marseille, com a mesma companhia de navegação, ele pega outro navio e segue para a África, onde ele conheceu as colônias francesas na África. Trabalhando como ajudante de cozinha, ele foi ao Senegal, Camarões, Congo. Voltou ao Senegal, do Senegal ele troca de navio e segue para Buenos Aires e Montevideo, isso em 1912.

Quando ele embarca em Montevideo com destino ao Rio de Janeiro, ele já embarcou doente e durante a viagem até o Rio piorou. O comandante do navio, com medo dele morrer a bordo, obrigou o Ho Chi Minh a descer no Rio para se tratar. E o navio seguiu.

Ho Chi Minh era muito querido, era um trabalhador valorizado por essa companhia de navegação. E ele ficou no Rio para se tratar e assim que estivesse curado pegaria um novo navio dessa mesma companhia de navegação para seguir viagem.

Chegou ao Rio em meados de 1912. Desceu no Rio e, em questão de semanas, ficou bom, foi curado. Se tratou e foi curado, não se sabe a doença que ele tinha.

E ficou aguardando a passagem desse novo navio para seguir viagem.

Em função de aguardar a passagem desse novo navio, ele ia constantemente ao porto do Rio de Janeiro, para saber notícias de quando chegaria o novo navio dessa companhia de navegação.

No Rio, nesse período que ele viveu de três meses, ele trabalhou como ajudante de cozinha em um restaurante que ficava no primeiro andar, no andar térreo de um hotel da Lapa. Ele era ajudante de cozinha e garçom. E morava em Santa Teresa, em uma pensão. Trabalhava na Lapa e morava em Santa Teresa e constantemente ia para o porto do Rio, para ter notícias do navio que o levaria em frente, para ele seguir viagem.

No Rio de Janeiro ele fala de três coisas, primeiro, a beleza natural do Rio que o encantou. Segundo, ele ficou impressionado com o Jardim Botânico e, por fim, ele também ficou muito impressionado, e era um local onde frequentava, a Zona do Mangue, a região boêmia da Zona do Mangue.

Ele tinha 21 anos e na época usava o nome Nguyen Tac Tan.

É interessante que aqui no Vietnã é comum, uma questão cultural talvez, que as pessoas usam nomes diferentes. Eu tenho vários amigos que tem um nome de origem, mas usam outros nomes, usam até nomes ocidentalizados.

O caso interessante de Ho Chi Minh no Rio é que ele trabalhava como cozinheiro e frequentava muito o Porto para ter notícias no navio que o levaria, isso em 1912. Lá ele conhece um cozinheiro negro pernambucano. Cozinheiro de navio e líder no Porto, o cozinheiro se chamava José Leandro da Silva.

Em 1921, nove anos após sua estadia no Rio, Ho Chi Minh escreve um artigo chamado “Solidariedade Internacional”, onde conta a história desse José Leandro que ele conheceu no Rio de Janeiro.

José Leandro era um líder sindical, cozinheiro como Ho Chi Minh, e em 4 de fevereiro de 1921 lidera uma greve no Porto do Rio do Janeiro, uma greve que tinha duas reivindicações principais: uma jornada de trabalho de oito horas e salários iguais para negros e brancos. Os negros recebiam salários muito menores, o Brasil era recém-saído da escravidão, então eram essas as reivindicações.

Aconteceu um caso interessante com o Zé Leandro, que o Ho Chi Minh narra no seu artigo de Solidariedade Internacional que escreveu em 1921, onde o Zé Leandro, como líder sindical, resolveu entrar em um navio espanhol, que tinha acabado de atracar no porto do Rio, para avisar os marítimos que o Porto estava em greve e também pedir a adesão deles a greve.

Ao tentar embarcar nesse navio, um policial o impediu e Zé Leandro respondeu que era líder sindical e tinha o direito de entrar, mas mesmo assim o policial não deixou e sacou uma arma e atirou contra José Leandro que conseguiu se safar e mesmo assim deu um golpe no policial e o jogou no mar.

Logo em seguida Zé Leandro foi cercado por mais dez policiais, lutou muito, levou onze tiros – segundo o artigo do Ho Chi Minh – e foi levado de ambulância para o hospital. Conta Ho Chi Minh que na ambulância, José Leandro, mesmo baleado com onze tiros, cantou “A Internacional Comunista”.

Nessa luta que Zé Leandro teve com os policiais, eles atiraram contra o líder sindical e um dos tiros acertou um conferente de cargas do porto que morreu. Zé Leandro chegou ao hospital, conseguiu sobreviver, mas foi condenado a trinta anos de cadeia em função da morte do conferente de carga do porto.

Como o conferente de carga morreu baleado, houve um movimento de solidariedade ao José Leandro. O artigo chama-se “Solidariedade de Classe”. Vários advogados da sociedade carioca, trabalhadores etc. se manifestaram por José Leandro. Lembra-se o caso dos líderes anarquistas de Boston, que houve uma grande solidariedade para eles também.

Em função dessa solidariedade, dessa ação dos advogados, José Leandro foi absolvido porque como o conferente morreu baleado e José Leandro não tinha revolver, não tinha nenhuma arma, ele lutou contra os policiais somente com as mãos, ele não poderia ser condenado pela morte do conferente de carga e por fim José Leandro é solto. Obviamente ele teve um final de vida trágico mas esse é um outro assunto.

Esse é o artigo do Ho Chi Minh, que sai do Rio em setembro ou outubro de 1912, segue para Boston, Nova Iorque, depois vai a Paris, lá se une ou Partido Comunista Francês. Depois da primeira guerra mundial ele segue para a então União Soviética e de lá começa sua trajetória de retorno ao Vietnã e da luta de independência do país. Então meus amigos, essa é a passagem de Ho Chi Minh pelo Rio de Janeiro. Foi o que conseguimos levantar aqui em Hanói. Forte abraço e até a próxima.

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  1. Avatar

    Um francês me contou que conheceu Ho Chi Minh como fotógrafo, trabalhando na Champs-Élysées onde, frequentemente, era visto, nos pós-guerra da Indochina (francesa), se reunindo com ex-colonos e estudantes vietnamitas refugiados.

    Disse também que nos locais de reunião de grupos vietnamitas, na França, os refugiados recebiam convocação para retornarem ao Vietnam e se integrarem a forças sob comando dos Estado Unidos, mediante pagamento dos serviços militares e de pensão futura para si ou suas família(em caso de morte), para ajudarem na intervenção dos yankees contra a resistência.

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