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Arreaza: estamos preparados para qualquer cenário. Seja o diálogo, seja a guerra proposta por Trump.

Em entrevista exclusiva a Leslie Salgado, correspondente do Nocaute em Joanesburgo, na África do Sul, o ministro das Relações Exteriores da Venezuela, Jorge Arreaza, falou das relações de seu país com o governo Trump, das expectativas com a eleição de López Obrador no Mexico e da necessidade da multipolarização política do mundo.

Apesar dos 45 anos que não aparenta ter, o professor universitário Jorge Alberto Arreaza Monserrat já ocupou alguns dos cargos mais importantes da hierarquia do chavismo. Foi ministro da Ciência e Tecnologia (quando implantou os de satélites “Miranda” e “Bolívar”, para utilização na Educação e implementação da televisão digital terrestre na Venezuela) e, depois, vice-presidente da República. Há um ano ocupa o posto de ministrodo Poder Popular para Relações Exteriores.

Em viagem oficial à África do Sul, Arreaza concedeu esta entrevista exclusiva à correspondente do Nocaute em Joanesburgo, Leslie Salgado, em que o ministro fala de Trump, guerra, diálogo, eleições no México e integração com a América Latina e com a África.

Nocaute: Primeiro gostaria que o senhor comentasse a notícia de que os EUA consideraram invadir a Venezuela.

Jorge Areazza: Veja, no ano passado, em 8 de agosto, Donald Trump surpreendeu em seu campo de golf com uma declaração aos jornalistas que o perguntaram sobre sua política com a Coreia do Norte. Ele introduziu o assunto Venezuela e disse que, aliás, não descartava uma opção militar. Que se a Venezuela estava tão próxima, e se tinham tantas tropas, e as pessoas passavam por um crise tão profunda, como eles dizem, o ditador Maduro podia ser deposto facilmente com uma operação militar. Revelaram os detalhes recentemente pela própria imprensa estadunidense. A Venezuela não era simplesmente uma hipótese. O homem efetivamente pressionou o comando militar para que explicasse a ele porque não poderia invadir a Venezuela.

Para nós não é uma surpresa. Temos uma longa luta contra o imperialismo, desde a geração de Bolívar, há 200 anos, e retomada pelo comandante Hugo Chávez, nossa revolução é anti-imperialista desde 2004. Os EUA tiveram envolvidos no golpe de Estado de 2002, no locaute dos petroleiros em 2003, todo o financiamento à oposição venezuelana e à violência vieram do governo dos EUA. E estamos preparados para qualquer cenário: desde esse, que não é desejável, nenhum país deve passar pela tragédia de uma guerra e muito menos por uma invasão imperialista, até o de diálogo. Abrimos alguns canais de diálogo com o governo Trump, com alguns senadores como o Bob Corker, que visitou a Venezuela. Que tenham a vontade de que os governos sentem e dialoguem como os povos civilizados que somos.

Nocaute: Mencionava na homenagem a Bolívar o tema da independência econômica. Por que é importante essa independência econômica não só para a Venezuela, mas para qualquer país?

Jorge Arreaza: Recordamos no 5 de julho, o dia da independência da Venezuela, que o libertador Simón Bolívar disse, há 200 anos, que ele se ruborizava de dizer que só tínhamos a independência. Mas que ao mesmo tempo era a independência política que abria as portas efetivamente. Não se trata somente de tomar decisões soberanamente, mas ter as ferramentas, o poder para tomá-las. Para isso precisa de independência econômica, tecnológica, de conhecimento. Só assim seremos realmente independentes. Acreditamos que na Revolução Bolivariana temos que ser muito mais eficientes na conquista da independência econômica, que, com a política, nos leve a verdadeira liberação.

Nocaute: Mas isso é difícil num mundo que está interconectado, com mecanismos de comércios internacionais que apontam para o sentido contrário.

Jorge Arreaza: Correto. O sistema capitalista é anti-independências, quer dominar, aquela proposta de globalização, de aldeia global, que terá um prefeito global, uma polícia global, um exército global, isso está descartada. Tampouco estamos falando de autarquia. Falamos de independência. Temos que ser capazes de produzir em nosso país o elementar, o básico para garantir as necessidades do nosso povo, comida, roupa, casa, educação, cultura. Como estamos num mundo interdependente, apostamos na integração da nossa América, da América com a África. Como dizia Bolívar, tem que haver vários centros no mundo que consigam o equilíbrio mundial. Esse mundo multipolar do qual falava Chávez se trata disso: ter um polo nos EUA, na Europa, Eurásia, Ásia, no Sul, entre a América e a África. Trata-se de equilibrar e não impor nada a ninguém.

Nocaute: Falando desses polos, queria que falasse sobre a recente vitória de Obrador no México.

Jorge Arreaza: México é um país que está travando grandes batalhas, onde lamentavelmente a classe política está muito ligada ao crime organizado, ao narcotráfico, e onde há violações de direitos humanos quase diários, que não saem tanto na imprensa porque não é na Venezuela ou em Cuba. México é central para a integração latino-americana. Obrador fez uma proposta que respeitamos, progressista, com direitos sociais, desejamos todo sucesso ao povo mexicano e tomara que sejam abertos novos caminhos com Obrador.

Nocaute: Gostaria de saber sobre os resultados mais importantes dessa viagem pela África.

Jorge Arreaza: O comandante Hugo Chávez nos ensinou que a África não é um continente distante, do qual temos referências pela origem da humanidade e da nossa população, mas que a África é a nossa mãe. Da união com a África encontraremos muitas das soluções para os problemas dos nossos povos e para o desenvolvimento econômico. Entre a América Latina e a África temos quase 80% dos recursos naturais que o mundo necessita para existir, sobreviver. Podemos construir, com a nossa integração, grandes transformações, controlando os recursos naturais com soberania para mudar o sistema, que é nosso maior objetivo. Estivemos em fevereiro em Nigéria, Angola, ambos os Congos, Guiné Equatorial, Etiópia, Egito, Moçambique, vamos a Gana e estamos na África do Sul, onde ficamos por mais tempo, dada a sua importância. Tem sido muito exitoso. Temos realidades parecidas, problemas parecidos mas também a solução para esses problemas e a transformação dessa realidade em nossas mãos se atuarmos juntos. Se nos fragmentarmos, nos dividirmos, se permitirmos que o Norte nos distancie, vamos fracassar. Por isso a insistência. E Maduro pretende participar de um encontro da União Africana para buscar vias para que a América Latina, e Venezuela em primeiro lugar com a Alba, mas América Latina também se somar a essa zona de livre comércio que os africanos estão construindo entre eles mesmos com seus próprios recursos. Seria muito importante ter uma grande zona de comércio justo entre África, América Latina e o Caribe.

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