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Os 200 anos do nascimento de Karl Marx: O espectro de uma ideia que mudou o mundo

Texto assinado pelo jornalista Manuel Carvalho e publicado no jornal português Público
Os últimos dias de Fevereiro de 1848 Paris entrou em estado de sítio. Soldados em parada ousaram vaiar o rei Luís Filipe, milhares de operários e estudantes tomaram as ruas de assalto, montaram barricadas, afrontaram as classes médias, determinaram a demissão do primeiro-ministro (Guizot), ousaram reclamar o poder e logo a seguir ditaram a abdicação do monarca e a criação da Segunda República. Não foi coincidência, mas por esses dias tumultuosos, a 24 de Fevereiro, Karl Marx publicava o Manifesto Comunista que parecia adivinhar e explicar a insurreição de Paris. “Um espectro assombra a Europa… o espectro do comunismo”, lia-se na primeira linha do Manifesto. A França habituada aos tumultos revolucionários acabaria por derrotar os sublevados e na verdade Marx já não era vivo quando, em Outubro de 1917, a sua deixou de ser sombra para se tornar realidade nas ruas de Petrogrado (São Petersburgo). Pela primeira vez, um projecto de comunismo estava em execução.
Entre o espectro da revolução e a revolução que tomou de assalto os palácios do czar e aplicou pela primeira vez a ditadura do proletariado para chegar a uma sociedade comunista, sem Estado, sem classes, sem oprimidos e opressores, passaram 70 anos. O programa a que Marx dedicou toda a vida cumpria-se. E a promessa que o seu grande e fiel amigo (e colaborador) Friedrich Engels fez na oração fúnebre que lhe dedicou no momento do seu discreto funeral (assistiram 11 pessoas), a 17 de Março de 1883, também. Marx, disse Engels, fora “o mais odiado e caluniado homem do seu tempo”, mas “o seu nome resistirá ao longo dos tempos e o seu trabalho também”. No dia em que se assinalam 200 anos do seu nascimento é impossível não lhe dar razão. Peter Singer, autor de uma “pequena introdução” ao universo do filósofo defende que “a influência de Marx pode ser comparada à das grandes figuras religiosas como Jesus ou Maomé” — porque “durante uma grande parte do século XX cerca de quatro em cada dez pessoas na Terra viveram sob governos que se consideravam marxistas e reclamavam seguir as suas ideias”.
Poucos pensadores foram capazes de deixar uma marca tão indelével na história como a desse homem razoavelmente corpulento, barbudo e de cabeleira farta. A Primeira e a Segunda Internacional, a criação dos primeiros partidos sociais-democratas, socialistas e comunistas, o bolchevismo e a Rússia soviética, o radicalismo violento, Rosa Luxemburgo e Che Guevara, Álvaro Cunhal, a China de Mao ou a Cuba de Fidel, a luta contra o nazismo, contra o colonialismo, ou contra o salazarismo, tudo teve a inspiração nas páginas que Marx produziu ao longo da sua vida. Para muitos, o seu desprezo pelas tradições, pela religião ou pela moral convencional tornaram-no num monstro odioso; para outros, a sua luta pela libertação dos trabalhadores e dos oprimidos foi um raio de luz que iluminou, e ilumina, as perspectivas da humanidade.
Registar os 200 anos de Marx é, por isso, motivo de celebração ou de lamento profundo. Jean-Claude Juncker, presidente da Comissão Europeia, estará hoje em Trier, a cidade onde o filósofo nasceu num quarto andar, e essa deslocação gerou um azedo coro de críticas um pouco por toda a Europa. A China ofereceu à cidade uma estátua de Marx com cinco metros e logo chegaram protestos contra a falta de respeito pela memória das vítimas do comunismo. Mais do que a rejeição da sua teoria da História ou até do seu programa de acção para derrubar o Estado burguês e instituir uma sociedade comunista, o que os opositores de Marx denunciam foi o uso posterior das suas ideias. Ora, seja o estalinismo ou o maoísmo, são “uma subversão das ideias de Marx”, nota o historiador Manuel Loff. Da mesma forma que não se pode associar os crimes da Inquisição à palavra de Cristo, é conveniente ter cuidado quando se cola a brutalidade dos regimes comunistas às teses de Marx, comenta Loff.
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