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Venezuela começa a dizer adeus à OEA. Demorou, mas antes tarde do que nunca.


 
 
Por Aline Piva
 
Venezuela acaba de tomar uma decisão histórica: começar o processo de retirada da Organização dos Estados Americanos. É a primeira vez que um Estado-membro inicia esse processo – nem Cuba, suspensa em 62, o fez formalmente, ainda que tenha reiterado diversas vezes não ter nenhuma intenção de voltar a esse espaço.
A decisão vem após meses de instrumentalização do organismo internacional como plataforma de ataques à Venezuela. Os ataques esse que estão sendo capitaneados por seu Secretário-Geral, Luis Almagro, que usa o foro para criar fatos políticos contra a Revolução Bolivariana e trazer aos holofotes da mídia internacional versões no mínimo questionáveis da realidade do país.
Se a saída de um Estado-membro é algo inédito, a ruptura com qualquer tipo de institucionalidade no seio da própria OEA também não tem precedentes: mesmo na invasão da República Dominicana havia uma preocupação com uma certa manutenção “sanitária” da legitimidade do organismo. Agora não. Assistimos não só Almagro, mas também outros Estados-membros afrontarem abertamente os preceitos estabelecidos na Carta da Organização. Susana Malcorra, por exemplo, a chanceler Argentina, esteve ontem aqui em Washington defendendo, nas suas próprias palavras, o “direito de intervenção” dos países da região nos assuntos internos da Venezuela.
O entendimento de que há uma crise de legitimidade no âmbito das organizações internacionais não vem de hoje, e cada vez mais se fortalece a leitura de que os meios de concertação internacional são meramente espaços para avançar determinadas agendas e interesses políticos. Na América Latina, isso foi evidenciado com a construção e consolidação de projetos alternativos de integração regional, como a CELAC e a Unasul.
O processo para a saída definitiva do órgão é longo: são 24 meses até sua finalização, período em que a Venezuela ainda será reconhecida como membro pleno – o que pode dar espaço para mais manobras intervencionistas.
Ainda que a OEA – bem como a maioria dos foros multilaterais – seja um espaço com pouca ação prática, o peso simbólico de suas deliberações é bastante importante. Vale lembrar, por exemplo, que é justamente nos corredores da organização que se fortalece e se consolida uma das mais importantes matrizes de opinião contra a Venezuela: a de que o país estaria violando o Estado de Direito e os preceitos democráticos.
É de se esperar, obviamente, que os suspeitos de sempre manifestem seu rechaço à histórica atitude da Venezuela – New York Times, por exemplo, já publicou um artigo dizendo que o país está deixando uma “organização pró-democracia”. Ironicamente, essa tal organização “pró-democracia” ficou convenientemente calada frente ao golpe no Brasil. E fecha os olhos a violações explícitas de direitos humanos, como os ataques à imigrantes aqui nos Estados Unidos ou o assassinato de líderes sociais na Colômbia.
A saída da Venezuela recoloca na pauta um debate fundamental: multilateralismo para quem? Nessas horas, convém lembrar que Cuba está há mais de 50 anos fora da OEA, e vai muito bem, obrigada. Parafraseando as palavras do embaixador venezuelano nessa organização, Samuel Moncada, agora, mais do que nunca, “o futuro da Venezuela não será decidido em Washington”.

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