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Das próximas eleições pode nascer uma França insubmissa?


 
Christophe Ventura*
 
De Paris, França, bom dia. Continuamos com as notícias do novo mundo que surge do Velho Mundo, do Velho Continente.
Hoje começamos com a história retirada de um livro, um livro especial porque é um livro político, que se chama “L´Avenir en Commun”, “O Futuro em Comum”, que é o livro-programa da campanha ”La France Insoumise” [“A França Insubmissa”], liderada por Jean-Luc Mélenchon. E que vive uma história pouco comum aqui na França, porque este livro está entre os mais vendidos, não só entre livros políticos, mas entre todas as categorias de livros aqui na França – um fato muito raro aqui na França. E este livro tem muitas propostas e alguns eixos muito importantes. Por exemplo, a ideia da participação popular dentro do Estado, dentro da administração do país, e a refundação das instituições do país para que, através de um processo constituinte, do qual se fala muito na América Latina mas que aqui é muito pouco conhecido.
E este livro, “L´Avenir en Commun”, propõe a refundação total para fortalecer a soberania, ou, digamos, reconquistar, gerar uma refundação da soberania popular e nacional da França.
Outro eixo muito importante deste livro é o da justiça social. Justiça Social não somente como um tema moral, mas digamos, um tema de eficácia econômica. Que através da justiça se alcance, se possa conseguir a prosperidade de cada um e de todos.
Este é o tema central que tem esse livro, que é o tema Justiça.
Também para se construir um novo modelo econômico, um modelo sustentável, um modelo eco-socialista. E aqui há muitas propostas para converter nosso modelo produtivista num modelo, digamos, que respeite o que pode oferecer, afinal, a natureza e respeitar o ambiente. Por exemplo, através de uma reflexão sobre o potencial do mar como novo perímetro da atividade humana.
E também, outro eixo é a cooperação internacional para que a França possa exercer um papel, digamos, de distribuição mais multipolar, mais pluripolar do poder, da força, para poder trabalhar na construção de vínculos muito mais fortes com os países do Sul e para construir relações internacionais nas quais a França não tenha digamos, um compromisso com a “família Ocidental”.
O programa “L´Avenir en Commun” rejeita essa visão de uma “Família Ocidental”, para partir para essa construção de um mundo mais multipolar, onde a influencia seja compartilhada entre os atores.
Há, por exemplo, nesse livro, propostas para que a França trabalhe com a ALBA, os organismos de integração regional latino-americanos como a ALBA, a Unasul, a Celac, etc e com os Brics. Essa é a filosofia geral.
Eu falo tudo isso para dizer que esse livro nos mostra que algo está acontecendo. Algo acontece, porque não se trata de um livro que interessa somente aos especialistas e aos militantes de todo dia, que têm tempo, que dedicam seu tempo à militância. Obviamente que o livro interessa a essas pessoas, mas está viajando até à sociedade, à sociedade comum, com as pessoas comuns lendo esse livro, e agora já é um best-seller. Isto é, está nos melhores lugares em venda de livros na França. Esta é uma indicação.
E tudo isso demonstra como se está esclarecendo, afinal, o panorama político.
Há, no entanto, uma centralidade da direita, não há dúvida. François Fillon, o candidato da direita tradicional, e Marine Le Pen, candidata da Frente Nacional, assumem as duas primeiras posições em todas as pesquisas sobre o voto na eleição presidencial do ano de 2017, que será em abril e maio. Fillon tem por volta de 29% enquanto Marine Le Pen tem mais ou menos 25%. Depois vem Emmanuel Macron, o antigo ministro da Economia do senhor Hollande, que é o candidato digamos, do centro. Uma parte social-democrata e uma parte centro-direita francês. Uma espécie de candidato do “vazio” como dizemos aqui, porque tenta aglutinar essa corrente de centro que está um pouco nos partidos socialistas, um pouco nos partidos de centro, etc. Que tem um espaço importante, bastante importante, de 15 ou 17%.
E depois vem Mélenchon, que também está com 14, 15%, e que é o mais importante.
Falta aqui o histórico segundo partido francês, que é o Partido Socialista. O partido histórico da esquerda, o partido hegemônico da esquerda da França. O Partido Social Democrata, que pela primeira vez na história política desse país está atrás de todos esses, que pela primeira vez dentro da esquerda o Partido Socialista está minoritário.
Há cada vez mais um refluxo de intenções de votos para este partido, qualquer que seja o candidato que pudesse sair das primarias desse partido. Que não são as primárias da esquerda, como se pode ler na mídia, mas que é uma espécie de congresso do Partido Socialista.
Portanto, esse é um elemento muito importante que precisamos entender, que um pouco como na Grécia, ocorreu aqui na França que o Partido Socialista pela primeira vez está atrás de Mélenchon, que é a proposta da esquerda, e também do centro-direita.
É um fato determinante e que nos mostra que as coisas estão mudando muito na França, que o cenário político está mudando cada dia mais, e no momento não sabemos para o que. Pode-se dizer que vão ganhar as forças populares, as forças de esquerda, já que estão trabalhando muito bem, que algo está acontecendo na sociedade, como eu disse, mas não se pode dizer o que vai acontecer, a direita está muito forte.
Mas no cenário tradicional, digamos, os equilíbrios, os saldos políticos tradicionais estão fracassando um pouco mais, cada dia mais. E isso afeta particularmente a Social Democracia francesa, que agora não tem perspectivas, forças impulsoras na sociedade francesa.
Este é o marco que temos, o que é muito interessante porque os próximos meses serão muito ativos, muito intensos, tensos, com mobilizações populares, com muita gente que está se preparando para lutar contra a agenda retrógrada e reacionária também, da direita francesa, através da proposta Fillon e Le Pen.
Então, há muitas coisas para acontecer e continuamos no futuro com Nocaute.
 
* Christophe Ventura é jornalista, redator-chefe do site “Mémoire des luttes” (www.medelu.org) e autor do livro “L’éveil d’un continent – Géopolitique de l’Amérique latine et de la Caraïbe” (Editions Armand Colin, Paris).
 
 

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    Cesar em BELLO GALICO já descrevia a Galia como dividida em 3 partes (est omnia divisa em partes tres) e se vê na historia recente que a descrição não reflete apenas a parte física. Quem viu um Petain ser submisso e executor das ordens nazistas nem pode ter confiança na índole deles. Foi marcante o espirito colaboracionista exibido em número e grau. Seu heroi, De Gaulle diferente de Napoleão, foi comandar a resistencia …na Inglaterra. Eu não apostaria em espirito e dignidade de assombrar ninguém.

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