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FHC: “Vá para o inferno. Não preciso ser coagido moralmente por ninguém.”

Em entrevista ao jornalista ao Pedro Venceslau, do jornal O Estado de S. Paulo, Fernando Henrique Cardoso afirmou que não precisa ser “coagido moralmente por ninguém para declarar seu voto”. Disse que não vota em Bolsonaro, “candidato que representa tudo que ele não gosta”. O tucano também afirmou que ainda não foi procurado por petistas, mas tem uma “porta para diálogo” com Fernando Haddad. Ele ainda elogiou o apresentador Luciano Huck e admitiu que o PSDB passa por um de seus piores momentos.

Como sr. vê o futuro do PSDB e avalia essa onda conservadora?

O PSDB, se quiser ter futuro, precisa se repensar. Depois de um terremoto, precisa reconstruir a casa. A onda conservadora é mundial.

O PSDB tem mais identidade com quem neste segundo turno?

Pelo que eu vi das pesquisas, é quase meio a meio do ponto de vista do eleitorado. Em seis Estados, o PSDB ainda disputa eleição para governador. Os candidatos ficam olhando o eleitorado. Do meu ponto de vista pessoal, o Bolsonaro representa tudo que não gosto. Só ouvi a voz do Bolsonaro agora. Nunca tinha ouvido. Não creio que seja por influência do que ele diz ou pensa que votam nele. O voto é anti-PT. O eleitorado parece estar contra o PT. No olhar de uma boa parte dele, o PT é responsável pelo que aconteceu no Brasil, na economia, cumplicidade com a corrupção e etc. É possível que a maioria dos líderes do PSDB seja pró-Bolsonaro, mas não é o meu caso.

O sr. tem mais identidade com o Haddad?

Não posso dizer isso. Como pessoa é uma coisa, como partido é outra. A proposta que o PT representa não mudou nada. Quando fala em economia, é a nova matriz econômica. Incentivar o consumo? Tudo bem, mas como se faz isso sem investimento? Como se faz sem enfrentar a questão fiscal? O PT no poder sempre teve uma deterioração da visão do (Antonio) Gramsci da hegemonia. Aqui não é cultural, é hegemonia do comando efetivo. Quando você vê o que foi dito a respeito do meu governo, nada é bom. Tudo que fizeram é bom. Quem inventou o nós e eles foi o PT. Eu nunca entrei nessa onda. Agora o PT cobra… diz que tem de (apoiar). Por que tem de automaticamente apoiar? É discutível. (O PT) Não faz autocrítica nenhuma. As coisas que eles dizem a respeito do meu governo não correspondem às coisas que acho que fiz. Por que tenho que, para evitar o mal maior, apoiar o PT? Acho que temos de evitar o mal maior defendendo democracia, direitos humanos, liberdade, contra o racismo o tempo todo.

Nas encruzilhadas históricas, PSDB e PT se uniram. No caso de 2018 é diferente?

Não faço parte da direção do PSDB, que decidiu pela neutralidade. Cada um pode fazer o que quiser. Política não é boa intenção. Uma coisa é a minha apreciação como pessoa sobre outra pessoa. Isso não é política. Se vamos estar juntos, tem que discutir completamente. Nunca houve isso.

O PT não está colaborando para essa aproximação?

De forma alguma. O PT tem uma visão hegemônica e prepotente. Isso não é democracia. Democracia implica em abrir o jogo e aceitar a diversidade.

Já houve algum diálogo do PT com o senhor?

Não. Tenho relações pessoais e cordiais com o candidato Haddad, mas o que está em jogo é o que será feito com o Brasil. Minha preocupação não é comigo ou o PSDB, mas com o Brasil. Qual é a linha? Estão pensando que estamos nos anos 60 e 70 ou terá uma linha contemporânea? Aí não dá…

Se o PT fizesse autocrítica, seria possível apoiar Haddad?

Seria bom, mas o PT está propondo coisas inviáveis.

O sr. vai declarar seu voto?

Quero ouvir primeiro. Não sei o que vão fazer com o Brasil. O Bolsonaro pelas razões políticas está excluído. O outro eu quero ver o que vai dizer.

Há porta aberta para Haddad?

Eu não diria aberta, mas há uma porta. O outro não tem porta. Um tem um muro, o outro uma porta. Figura por figura, eu me dou com Haddad. Nunca vi o Bolsonaro.

Haddad é diferente do PT?

Não adianta ser diferente. Haddad é a expressão do Lula. Ele usou uma máscara do Lula. Agora tirou e colocou uma bandeira verde e amarela.

Marconi Perillo foi preso. Antes foi o Beto Richa. O PSDB caiu na vala comum?

Você nunca ouviu de mim acusação contra o PT. O papel de acusar é da polícia; de julgar é da Justiça. É importante que as investigações prossigam. Você nunca ouviu uma palavra minha de defesa só porque é do PSDB. Quero que tenha direito de defesa.

O sr. conversou com Luciano Huck, que desistiu de concorrer. Se o PSDB tivesse lançado outro nome, talvez um outsider, a história seria diferente?

É difícil avaliar o que aconteceria com um candidato outsider. Sou amigo do Luciano Huck. É pessoa interessante, mas não sei o quanto tem habilidade para manejar os problemas do Estado. Espero que não desista. Nas circunstâncias atuais, dificilmente um candidato do PSDB, fosse quem fosse, estaria isento de sofrer as consequências do terremoto. Estamos assistindo a um terremoto. Não creio que seja o caso de culpar A, B ou C. Na situação que vivemos, você vai precisar de liderança forte, o que não significa autoritária. O governador de São Paulo tinha experiência e é uma pessoa correta, mas não teve apoio. Tentei juntar o centro antes. Ninguém quis. Não adianta ter ideia. Ideia é bom na universidade. Tem que ter capacidade de convencer. Agora, estão me cobrando: tem que fazer isso, aquilo. Tem carta, intelectual da Europa, dos EUA, amigos meus me pedem isso… Eles não conhecem o processo histórico. Nessas horas, a palavra de alguém some no ar. Cobram de mim para tomar posições. Mas eu digo: Por quê? Qual é a consequência?

Para a história, talvez?

Eu já fiz a minha história. Todo mundo sabe o que eu penso. Não preciso provar que sou democrático. Eu sou! O PSDB sabe o que eu penso. Todo mundo sabe. Alguém pode imaginar que eu vou sair por aí apoiando o Bolsonaro? Nunca.

Mas isso não significa que o sr. apoia Haddad?

Quando automaticamente o PT apoiou alguém? Só na vice-versa. Com que autoridade moral o PT diz: ou me apoia ou é de direita? Cresçam e apareçam. A história já está dada, a minha. Não vou no embalo. Não me venham pedir posição abstratamente moral. Política não é uma questão de boa vontade, é uma questão de poder. E poder depende de instrumentos e compromissos efetivos. Agora é o momento de coação moral… Ah, vá para o inferno. Não preciso ser coagido moralmente por ninguém. Não estou vendendo a alma ao diabo.

A esquerda diz que o Bolsonaro representa o fascismo.

O autoritarismo, concordo, o fascismo, não, porque é um movimento específico de apoio popular e com ideias específicas de Estado corporativo, tinha uma filosofia por trás. Não sei se ele (Bolsonaro) tem alguma filosofia por trás. Ele tem uma vontade de mandar. Não sei o que ele é. O que propôs como parlamentar foi corporativismo. Agora vai ser liberal? Pode ser. As pessoas mudam. Mas não mostrou nada.

O PSDB amargou o pior desempenho eleitoral de sua história. O que houve com o partido?

Houve um terremoto. Nele, há escombros de muitos partidos. O que ganhou na Câmara em maior número é o PSL. As pessoas não sabem o que significa PSL. Elegeram 52 deputados, 11% da Câmara. É a fragmentação, um problema estrutural. Como levar adiante isso? Querendo ou não, vai ser preciso agrupar forças. Mas ao redor do quê? Qual a proposta para o Brasil? Os candidatos não falam.

O senador Tasso Jereissati criticou a decisão do PSDB de contestar o resultado da eleição de 2014 e de entrar no governo Temer. O que o sr. acha?

Em geral, concordo. Mas o caso da entrada no governo Temer é uma questão mais complicada. Fomos a favor do impeachment. Fui dos mais reticentes – e a todos os impeachments, mesmo do Collor. É traumático. É um processo que abala. Mas não acho que o PSDB tenha sido incoerente nisso. Quanto ao resto, ele tem razão.

João Doria e Alckmin tiveram um momento tenso. Alckmin disse não ser traidor, em referência a Doria. Como o sr. avalia?

Tenho certeza que Geraldo não é traidor. Não é do estilo dele. A eleição não está resolvida. O Doria ainda tem de disputar para saber qual será o grau de projeção dele. Não estou de acordo em apoiar o Bolsonaro. Não corresponde à minha história e ao meu sentimento. Não são os militares voltando ao poder, mas o povo abrindo espaço para a possibilidade de uma presença militar mais ativa. Os militares entenderam a função deles na Constituição. Neste momento é muito importante defender o que está na Constituição. Não estamos mais na guerra fria. As pessoas olham para o que está acontecendo no Brasil como se fosse 1964 e 1968. Havia guerra fria e capitalismo contra comunismo. Não é essa a situação que vivemos. Temos de resistir a qualquer tentativa de ferir os direitos fundamentais assegurados na Constituição. O PSDB não deve abrir mão da defesa da democracia.

E sobre a guinada liberal no PSDB que Doria defende?

Essa é uma questão do século 18. Estamos no século 21. Hoje você não tem mais a possibilidade de imaginar mercado sem regulamentação. Fake news? Tem que regulamentar. Você não pode pensar que o Estado vai substituir a iniciativa privada. Ninguém propõe controle social dos meios de produção. No passado, era isso que definia esquerda e direita. Liberal quer dizer o quê? É um falso problema.

O sr. disse, quando era senador, que a extinção do PSDB podia ser parte da solução para mudar o sistema partidário.

O sistema partidário e eleitoral que montamos a partir da Constituição de 1988 se exauriu. A prova é a fragmentação partidária. Nós temos mais de 20 partidos no Congresso, mas não há 20 posições ideológicas. Os partidos viraram quase corporações. São grupos de parlamentares que se organizam e obtêm o Fundo Partidário e tempo de TV. Estamos assistindo à explosão desse sistema. Portanto, acredito que sim, será preciso repensar essa estrutura.

Pode-se deduzir que do PSDB poderá nascer um novo partido?

Eu não diria o PSDB, mas é preciso mudar as regras partidárias. Você não faz partido porque gosta. Quais serão as ideia-força capazes de reagrupar partidos? Não é questão puramente legal, mas de existirem ideias e líderes que debatam essas ideias. Os partidos perderam o sentido originário.

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  1. Avatar
    Cristiane N. Vieira says:

    “Democracia implica em abrir o jogo e aceitar a diversidade”. Uma forma cínica de dizer: “quero governar, com ou sem voto.” Quando e onde ele ou seu partido abriram o jogo ou aceitaram a diversidade? Comprou uma reeleição para não largar o osso! E depois, pelo voto, não voltaram ao poder federal por quê? Deram um golpe e foram destruídos por ele. Agora, entre defender o que sobrou do país ou levar às últimas inconsequências a tentativa de atingir o PT, quer que o partido se ajoelhe para ele, um inútil que é o responsável direto pela situação de ameaça real à democracia? Vá te catar!
    Vá para o inferno? Desculpe, ele já está todo reservado, da portaria às suítes de luxo, para você. Não queira imaginar as notas de rodapé dos livros de História para não perder de vez as estribeiras que lhe sobraram. Do muito pouco que lhe sobrará até o seu último suspiro – que o planeta agradecerá por se livrar de mais um predador.
    Sobre coação moral, já dizia Mark Twain que há juízes incorruptíveis porque nada nem ninguém os convence a fazer justiça: FHC é desses, ninguém consegue convencê-lo a ser decente. Chamar de coação moral a exigência de posicionamento em uma situação que extrapola a política tradicional – o nazismo era luta política legítima? – é o exato tamanho de sua mesquinharia. Ah, pelo visto, o problema em apoiar o Haddad ainda é a onipresença do Lula. Bem, FHC pelo jeito não se livrará dessa doentia inveja nem nos últimos andares do inferno que o espera, sua consciência do próprio fracasso. FHC, descanse de expor suas ruínas e vá tomar chá na Avenue Foch (é este o nome do seu exílio?). E NOS DEIXE EM PAZ!

    Sampa/SP, 14/10/2018 – 13:25

  2. Avatar
    Cesar Antonio Belli says:

    Respeitar é importante é vejo radicalismo em todos lados, eu anularei meu voto por opção , e apoiarem ou crítico porque paguei e pago impostos , e a sociedade já escolheu ele.

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    O melífluo, ensaboado e dissimulado FHC de sempre.
    O homem que foi para o PMDB dizendo a Plínio de Arruda Sampaio, mais ou menos o seguinte, segundo as próprias palavras de Plínio de Arruda Sampaio, em seminário sobre os partidos no Brasil.
    Ambos voltavam do exílio e Plínio decidiu redigir os estatutos do PT, a pedido de Lula.
    Plínio esculpiu nos estatutos os meios e modos de construção de um partido pela base, com a base.
    E convidou FHC para o PT.
    A resposta de FHC: “Ô Plínio, lá nós seremos “a direita” do PT. Vou para o MDB onde serei “a esquerda”.”.
    Continua mais do que o mesmo, ficou pior.
    Aceita e já abre as portas para o PSL se o PSL “garantir a democracia”.

  4. Avatar
    Poeta Sidarta Martins says:

    Falsidade
    Hipocrisia
    Conluio

    Ele poderia, para o bem do Brasil:

    1) Ficar calado;

    2) Assumir uma posição clara em relação ao Partido reTrô, denunciando o mal que causaram à Nação;

    3) Reconhecer o mal que o PSDB tem causado apoiando a malandragem.

  5. Avatar

    Damos sequência à tradição lusitana dos cognomes

    D. Sancho I “O Povoador” – 1185-1211

    D. Afonso II “O Gordo” – 1211-1223

    D. Duarte “O Eloquente” – 1433-1438

    Fernando Henrique “O Omisso”

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