Lamento, mas sou portador de más notícias. Acabei de ser informado de que morreu hoje, agora à tarde, um amigo querido e grande brasileiro chamado Audálio Dantas.
Eu conheci o Audálio muito antes de conhecê-lo. Quando eu era pré-adolescente comecei a ler reportagens lá em Minas Gerais ainda, do O Cruzeiro, e o Audálio foi da turma épica do O Cruzeiro, uma revista de grandes reportagens. Depois trabalhou em vários veículos, mas foi também da equipe célebre da revista Realidade.
Eu me aproximei mais do Audálio em 1975, no episódio do assassinato do Vlado. Seguramente, se há uma pessoa que pode ser identificada com o que aconteceu depois, com a transformação do assassinato do Vlado em um símbolo da brutalidade da ditadura, essa pessoa foi Audálio Dantas.
Ele transformou o sindicato, que desde o golpe de 64 estava na mão de pelegos. A oposição ganhou com muita dificuldade com ele na cabeça, ele presidente. E assim que o Vlado foi morto, ele transformou a sede do Sindicato dos Jornalistas, aqui na Rego Freitas, num centro nacional de protesto contra a ditadura.
Ele e Dom Paulo, juntos de mãos dadas, peitaram a ditadura militar.
Serenamente, como era o estilo do Audálio, mas valentemente.
Foi o Audálio, aliás, quem avisou a minha família os motivos pelos quais eu estava sendo procurado pelo Doi-Codi. No enterro do Vlado, no cemitério judaico de São Paulo, estava cheio de policiais. O Doi-Codi liberou alguns ou todos os presos, acompanhados por policiais, para assistir ao enterro do Vlado e um dos presos se aproximou de um político que estava lá.
Havia poucos políticos porque tinham muito medo de se associar àquela ousadia contra a ditadura militar – porque ali ficou claro que o Vlado não era um suicida, mas tinha sido morto pelos militares. Não sei se foi o Rodolfo Konder ou o Paulo Markun, se aproximou de um dos políticos e disse: “Avisa a família do Fernando Morais que lá no Doi-Codi querem saber o que ele foi fazer em Cuba. Estão desconfiando que ele foi buscar dinheiro ou armas”.
Eu fui para fazer uma reportagem, como todo mundo sabe.
E esse político foi ao Sindicato, não me conhecia, e informou o Audálio e foi o Audálio que foi à casa do Wagner, meu irmão mais velho, já falecido, para dizer para ele o seguinte: “Olha, se ele tiver contato com o Fernando”, ele sabia que eu estava foragido, “explica para ele que ele tem que sumir de São Paulo, porque a acusação que estão fazendo a ele nos interrogatórios no Doi-Codi é uma acusação grave. Portanto, melhor ele desaparecer.”
Ficamos muito amigos, nos reencontramos em reportagens, em atividades políticas. Essa foto que vocês estão vendo agora é uma foto batida em Havana em julho de 1980, com o Comandante Fidel Castro. Eu assinalei aí, à direita do Fidel, à esquerda de quem vê, o Audálio, sorridente ao lado do Comandante. Com quem ele voltaria a estar várias vezes.
Fomos parceiros na Comissão da Verdade de São Paulo. E quando fizemos a campanha, já depois do golpe, em defesa do pré-sal, contra a desnacionalização da Petrobras.
A primeira pessoa a se oferecer para dar um depoimento condenando o Temer por essa barbaridade foi o Audálio Dantas. É uma pena, uma tristeza muito grande. Eu, sinceramente, gostava muito dele pessoalmente. Aprendi muito com ele. Grande jornalista, grande repórter, grande redator. Sabia fazer tudo em um jornal, revista.
É uma pena perde-lo, o Audálio já fosse uma pessoa mais velha, ele tinha perto de 90 anos, embora ele não parecesse. Eu me lembro que dois anos atrás, eu fui a uma feira de livros em Diamantina e alguém tinha me falado o Audálio vai estar lá, mas parece que ele não está muito bem de saúde.
E eu fui preocupado. Cheguei lá me encontrei com o Audálio. A primeira coisa que ele fez foi me levar a um botequim para encher a cara de cachaça com ele. Então, ele estava melhor do que nunca.
Eu não tenho informações ainda sobre onde vai ser o velório e enterro, mas a gente informa ou pelo facebook ou aqui mesmo pelo Nocaute.
É uma dó, uma pena, uma tristeza que eu perca um amigo como ele e que o Brasil perca um camarada da coragem dele e do compromisso dele com a democracia.
Vai lá meu velho.
Mais Nocaute:
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Karina says:
Uma grande perda!
Lenin says:
Prezado Fernando e amigos,
Sem dúvida uma lástima.
Deem uma olha em http://www.maurosantayana.com/2018/05/do-blog-com-equipe-poucos-dias-depois.html (um poema do Mauro Santayana).
Um abraço