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No Senado, oposição denuncia 'barbaridades' na privatização da Eletrobras

As comissões de Assuntos Econômicos (CAE) e de Infraestrutura (CI) do Senado se reuniram na terça-feira (26) conjuntamente para ouvir o ministro de Minas e Energia, Fernando Bezerra Coelho Filho sobre o projeto de privatização da Eletrobras, considerada pela oposição e por analistas de diversos setores como uma grave ameaça à soberania nacional. O governo calcula que pode privatizar a empresa por cerca de R$ 20 bilhões.
A senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) classificou como “barbaridades” os argumentos do ministro para defender a privatização. “Ele falou que a privatização é sinônimo de eficiência. Não é verdade. A privatização só tem piorado a situação dos segmentos privatizados”.
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“Não melhora os serviços. A privatização do sistema elétrico brasileiro significa abrir mão da possibilidade do Estado planejar o nosso desenvolvimento.” Ao lado de trabalhadores do setor elétrico, a senadora criticou a “entrega de um patrimônio que é do povo brasileiro de mão beijada, pelo preço irrisório de 20 bilhões, quando vale mais de 400 bilhões de reais”.

Ministro Bezerra Coelho (esq.) tenta justificar privatização e é questionado por Vanessa. Renan e Viana


Durante a reunião conjunta das comissões, o senador Jorge Viana (PT-AC) dirigiu-se ao ministro de Michel Temer para questionar a proposta do governo e o preço, que só interessa ao mercado. “Sabe quanto valia a Eletrobras em 2010, ministro? Quase R$ 500 bilhões. São números do mercado”, afirmou.
“O mercado dizia que era a pior empresa do mundo e, na hora em que o senhor deu um sinal de que poderia privatizar, o mercado aumentou as ações em 50% num dia.”
Ele lembrou que foram investidos na Eletrobras R$ 400 bilhões. “Vender por R$ 20 bilhões é um bom negócio para o pessoal do mercado, para o pessoal do Meirelles.” Segundo o senador, durante os governos de Luiz Inácio Lula da Silva a empresa deu lucro de R$ 2 bilhões por ano, em média.
Jorge Viana citou exemplos de países como Canadá, França e Estados Unidos, que mantêm controle estatal sobre o setor, por ser absolutamente estratégico. O ministro defendeu a possibilidade de empresas internacionais comprarem e negou prejuízo ao Brasil. “Jamais proporia algo contra o interesse nacional.” Segundo ele, a ideia do governo é criar “um legado para o futuro, que possa garantir o patrimônio da União e a geração de emprego”. Ele ainda prometeu “provar que o processo vai trazer ganho para os consumidores”.
Bezerra Coelho Filho argumentou que não é “correto ter uma empresa que tenha diretores e presidentes recebendo mais do que um senador e um deputado”, e foi rebatido por Renan Calheiros (PMDB-AL). “É um outro problema. Isso não pode justificar um programa de privatização dessa envergadura. Não pode justificar a privatização de um sistema desse”, disparou Renan.
Soberania
A privatização da Eletrobras causa preocupação por ser a companhia responsável pela geração de 30% da eletricidade do país e pela distribuição para regiões que não dão lucro. Pará, Amazonas, Acre, Roraima, Rondônia sofrerão mais do que estados de outras regiões.
“Programas essenciais, como o Luz para Todos, deixarão de ser cumpridos. A função da Eletrobras não é só levar energia a quem tem dinheiro para pagar, é levar energia a quem não tem dinheiro e vive nos rincões mais distantes”, resumiu Vanessa Grazziotin. Junto com Jorge Viana, a senadora foi autora do requerimento pedindo a realização da reunião de hoje no Senado.
Segundo a própria Eletrobras, sua capacidade instalada é de 47 mil megawatts (MW), com previsão de chegar a 49,49 mil MW com obras de usinas em andamento. A companhia possui em todo o país 47 usinas hidrelétricas, 114 termelétricas a gás natural, óleo e carvão, duas termonucleares, 69 usinas eólicas e uma usina solar, próprias ou em parcerias.
Já de acordo com o ministro, o que está levando o governo a privatizar a empresa “é levar a fazer investimentos, porque a Eletrobras faz investimentos que ninguém quer fazer e tem taxa de retorno às vezes negativa. A ineficiência é dividida na nossa tarifa”, argumentou. “Não estamos entregando a empresa, estamos valorizando.”
No entanto, a privatização encarecerá a tarifa e ameaça o sistema, porque vai priorizar a venda de energia no mercado livre. Ameaça também o parque industrial brasileiro. O governo argumenta que, como as empresas vão ter mais rentabilidade, vão poder investir. Mas a intenção embutida no modelo de privatização desobriga as empresas de investir onde o lucro é incerto ou em locais onde não há possibilidade de ganhos, daí a preocupação dos parlamentares do Norte brasileiro.
A ideia do modelo é ofertar a energia no mercado, levando o “capitalismo selvagem” ao fornecimento e criando uma série de empresas que viverão apenas de comercializar energia. Os mercadores de energia fariam a intermediação entre a produção da usina e o consumidor. A privatização da Eletrobras levaria o país a abrir mão de um setor estratégico, delegando sua gestão ao setor privado, e, pior, ao capital internacional. Até mesmo os serviços básicos são comprometidos.
“Energia é tudo, é saúde, educação, inclusive comunicação”, diz a senadora Vanessa. Segundo ela, o exemplo da Reserva Nacional do Cobre e Associados (Renca) “é ilustrativo” de que só a mobilização social pode pressionar o governo no caso da Eletrobras. “Eles voltaram atrás (no caso da Renca) por causa da mobilização. Se a gente fizer uma grande mobilização, consegue que eles parem com esse projeto”, acredita a senadora.
*Publicado originalmente na Rede Brasil Atual.

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