Brasil

Distritão não resolve os problemas e vai piorar os que já existem, diz especialista

Foto: Luís Macedo/Câmara dos Deputados


Esta é uma semana decisiva para o Congresso brasileiro e para a base aliada de Michel Temer. Ou a reforma política é votada, ou corre-se o risco de as novas regras não valerem para 2018.
Mudanças no sistema eleitoral, como o distritão, por exemplo, cláusula de barreira, fundo partidário para financiamento da campanha estão em discussão. E até mesmo a adoção do Parlamentarismo enquanto sistema de governo, em substituição ao presidencialismo, às vezes aparece nos discursos como uma solução para a crise política no Brasil.
Para o cientista político Cláudio Couto, pesquisador da Fundação Getúlio Vargas (FGV-EAESP), nem tudo o que está sendo proposto é viável para a realidade brasileira. E não é porque um sistema deu certo para determinado país que ele vai dar certo no Brasil. “É um sistema que no Brasil, eu diria, ele não resolveria nenhum dos nossos problemas reais e agravaria tudo aquilo de ruim que a gente já tem”, afirma, ao falar sobre o distritão, sistema majoritário para o Legislativo.
Em entrevista exclusiva ao Nocaute, analisa também parlamentarismo, semipresidencialismo, impactos da votação em lista fechada e financiamento de campanha.
Assista:

É um sistema que no Brasil, eu diria, ele não resolveria nenhum dos nossos problemas reais e agravaria tudo aquilo de ruim que a gente já tem.
Estou pensando basicamente em uma questão, as eleições no Brasil são muito individualizadas quando se fala em eleições para o legislativo – deputados federais, deputados estaduais  e vereadores. Essa individualização ela se exacerbariam, por quê? Porque hoje ainda deputados podem contar com candidatos com a votação do seu próprio partido, seja de outros candidatos, seja a votação dada a legenda. Nesse caso não. Fica todo mundo tentando se virar por conta própria. Não tem mais como fazer da votação no partido um esteio para sua própria eleição, então, um salve-se quem puder. Se hoje já existe uma importância muito grande do dinheiro e da celebridade para conseguir chegar na frente dos adversários dentro do próprio partido inclusive esse problema se colocaria de maneira ainda mais exacerbada numa situação em que já não se trata apenas de chegar na frente dos meus companheiros de partido, dos meus adversários de partido, talvez seria o caso de dizer, mas chegar na frente de qualquer um e aí a importância do dinheiro aumenta.
Os japoneses tiveram esse sistema, ainda existe alguma coisa em nível local no Japão para eleições locais. Estive conversando com cientistas políticos japoneses durante essa semana sobre isso. Mas é um sistema que os próprios japoneses aboliram porque eles consideram que é um sistema que enseja corrupção e veja são japoneses falando em um país que tem uma tradição, em termos de problemas com corrupção, muito menos alentada do que a nossa e mesmo assim o sistema foi desfeito pelos japoneses pelos problemas de corrupção que ele gera.
Sobre o peso das minorias, tem muito desperdício de voto porque quem votar em um candidato não eleito perde voto. Minorias dispersas na sociedade também não tem chance de eleger ninguém. O distritão portanto não resolve nenhuma dos dois problemas e ainda piora os outros.
O parlamentarismo, no meu ponto de vista particular, é um sistema considerado, nele mesmo, melhor que o presidencialismo. Mais flexível, tende a gerar consequentemente uma possibilidade  maior de você resolver crises de governo sem grandes rupturas. Agora, isso olhando para o sistema nele próprio uma outra questão é pensar esse sistema no contexto brasileiro, considerando a nossa trajetória  histórica e todo o debate que se fez sobre isso no Brasil ao longo do  tempo. A gente já teve uma primeira experiência parlamentarista durante o governo João Goulart, quando para impedir a posse do João Goulart os militares forçaram, naquele momento, a adoção do parlamentarismo e houve um plebiscito em que essa opção foi derrotada fragorosamente nas urnas. Depois houve uma nova tentativa de implementar o parlamentarismo durante a constituinte em 87, 88, de novo ela não passou mas houve um novo plebiscito convocado para cinco anos  depois em que, de novo, a alternativa foi derrotada. Por conta disso, eu acho que seria muito complicado a gente adotar o parlamentarismo no Brasil sem considerar esse histórico de rejeições em plebiscitos como é que se poderia adotar um parlamentarismo sem a realização de um novo plebiscito ou, na melhor das hipóteses, eventualmente, uma adoção submetida a um referendo pouco tempo depois para que as pessoas pudessem testar o sistema.
Um sistema de lista fechada o eleitor não tem como interferir na ordem mas pelo menos ele jamais leva “gato por lebre”. A lista é fechada, mostrada para o eleitor que diz – “bem se eu votar nesse partido e esse partido eleger cinco, serão eleitos os cinco primeiros da lista, deixa eu ver quem são”. Se ali existir alguma laranja podre eu decido não votar naquela lista, corro para outra.
O semipresidencialismo, que é na verdade um sistema híbrido entre o presidencialismo e o parlamentarismo, é o sistema que existe, por exemplo, na frança. Acho que seria uma alternativa complicada no caso brasileiro, pelo fato de que a gente tenha em uma larga tradição histórica presidencialista a gente correria o risco de ter um presidente que mesmo com menos poderes do que teria um presidente em um semipresidencialismo como o francês, insistir em disputar com o primeiro ministro as prerrogativas do cargo, de quem é que manda, quem é que define o que tem que se fazer no país. Eu acho que se a gente não olha em chave histórica a gente deixa de avaliar a questão no efeito que ela pode ter para o Brasil, no efeito que teria sua adoção no Brasil e começa a pensar no sistema em abstrato que eu acho que é uma coisa muito complicada.
Acho improvável que esse congresso aprove o parlamentarismo. Não acho impossível mas não me parece que seja algo no horizonte. Inclusive, como todo debate sobre reforma política está muito mais focado em questões relacionadas ao sistema eleitoral para o próprio legislativo e a questão do financiamento de campanha, acho muito difícil que nesse momento haja espaço para entabular uma discussão a sério sobre mudança e sistema de Governo.
Acho que ficou difícil aprovar o fundo partidário naquele valor que havia se aventado inicialmente de três bilhões e meio o que é muito dinheiro,  acho que é importante ter algum fundo de financiamento de eleições, inclusive para equalizar a possibilidade de disputa, não só os partidos que já tem recursos disputarem e não só os que têm acesso a recursos privados mas, enfim, todos os partidos terem um mínimo de capacidade de disputa mas não nesse valor. Acho que a preocupação tem que ser muito mais reduzir a despesa de campanha e não querer aumentar a receita, sobretudo de recurso público, considerando aquilo que historicamente havia em termos de gastos de campanha no Brasil. Como sempre se gastou muito no Brasil em campanha, mantém-se o nível do gasto só que agora dá-se a conta para o contribuinte, eu acho que isso não faz sentido. Esse volume de gastos que a gente chegou ele tem que levar a uma redução da despesa de campanha. Campanhas mais baratas para o executivo, campanhas mais baratas para o legislativo. Para o executivo isso significa campanhas de tevê mais simples, mais espartanas digamos assim. Algo como estamos fazendo agora, uma câmera, alguém falando e nada mais – “ah mas vai ficar menos animado”; vai. Mas vai ficar muito mais barato e o candidato que se vire com o eleitor, de convencer o eleitor daquilo que ele acredita.

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