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Óscar López Rivera: "Os EUA não permitem que governos progressistas cheguem ao poder."

Óscar López Rivera é uma das lideranças mais importantes do movimento pela independência de Porto Rico. Nascido em 1943 em Porto Rico, mudou-se com a família para os Estados Unidos em 1952. Começa a ganhar renome como ativista no final de década de 60, quando participa ativamente de ações para instituir o ensino bilingue em escolas públicas dos Estados Unidos. Junta-se às Forças Armadas de Liberação Nacional (FALN) na década de 70.
A FALN, fundada no final da década de 60, acreditava que somente a luta armada clandestina poderia libertar Porto Rico de seu status colonial. Após viver vários anos na clandestinidade, Rivera foi preso e condenado em 1981 a 55 anos de prisão por “conspiração sediciosa”. Em 1988, foi condenado a mais 15 anos de reclusão, acusado de tentar escapar da prisão. Em janeiro de 2017, em um de seus últimos atos, o ex-presidente Barack Obama concedeu a comutação da pena a Rivera.
Mesmo tempo passado boa parte dos seus 36 anos de prisão em confinamento solitário, em condições considerados por observadores internacionais como “cruéis e excepcionais”, Rivera nunca deixou de lado a solidariedade não só com seus companheiros de luta, mas também com os movimentos de resistência em todo o mundo.
Nessa entrevista exclusiva ao Nocaute, Óscar López Rivera faz um balanço da luta pela independência de Porto Rico e comenta a ingerência norte-americana na América Latina.

Aline – Bom, em primeiro lugar gostaria de te agradecer por estar aqui falando conosco, com as pessoas do Brasil e todos. De verdade, Óscar, é uma grande honra.
O que queria te perguntar é que nos últimos anos, nós temos visto que Porto Rico vem enfrentando, sofreu, uma série de problemas econômicos e sociais gravíssimos. Muitos acreditam que grande parte do problema se deve a seu status de colônia. Que opinião você tem dessa situação atual. Por acaso não é uma mostra da necessidade que o povo borícua, o povo porto-riquenho, alcance sua independência?
Óscar – Bom, nós levamos muitos, muitos anos lutando pela independência de Porto Rico. Lamentavelmente, enfrentamos a nação, o império mais forte da história do mundo. Se nos faz difícil. Especialmente quando esse país, que é os Estados Unidos, têm uma força dentro de Porto Rico porque são os porto-riquenhos que ajudam a administrar a colônia. Então os Estados Unidos ditam e os que administram a colônia fazem. No caso específico de agora, desse momento, os Estados Unidos decidiram impor aos porto-riquenhos uma junta de controle fiscal. Essa junta tem somente um objetivo: que Porto Rico pague uma dívida que é odiosa, que muitos consideramos como um ato criminoso, tirar do povo porto-riquenho 72 bilhões de dólares, quando não temos nem um bilhão de dólares para pagar essa dívida. Como é possível que nós, como porto-riquenhos, paguemos essa dívida? Bem, o que vão fazer é cortar, cortar programas. Por exemplo, cortar da Universidade de Porto Rico 500 milhões de dólares. Fechar escolas públicas – por exemplo, agora em agosto, são 169 escolas públicas que vão ser fechadas. Sem a universidade e sem as escolas públicas, o futuro de Porto Rico está altamente ameaçado, porque são as escolas, são as universidades as que nos ajudam a desenvolver os recursos humanos, e esse recurso humano é o principal no mundo. Se não temos recursos humanos bem preparados, estamos fracassando, estamos verdadeiramente, em condições muito ruins.
Outra coisa: se se tira capital de Porto Rico, Porto Rico empobrece mais e mais. A pobreza porto-riquenha hoje é muito maior do que era 20 anos atrás. Porto Rico está completamente privatizado. Antes, era parte do setor público, por exemplo, a companhia de telefone, era pública, era do governo, era do povo de Porto Rico. Sem embargo, hoje em dia é completamente privatizada. O aeroporto de Porto Rico está privatizado… Todo o sistema de estradas em Porto Rico está privatizado. Se uma pessoa se move de um povoado a outro, está pagando – tem que pagar – um imposto desse sistema de transporte. Somente por transportar-se, movendo-se de uma parte a outra em seu próprio carro, se tem que pagar isso. O custo de vida em Porto Rico é muito mais alto que o custo de vida nos Estados Unidos. O capital estrangeiro que se gera em Porto Rico automaticamente sai de Porto Rico, é transferido. Esse capital não fica em Porto Rico. Então é um roubo constante, constante. Mas agora é ainda pior, porque estão tirando dinheiro para pagar uma dívida, e esse dinheiro se poderia estar utilizando para ajudar a universidade, para ajudar na saúde, para ajudar a gerar empregos, mas isso não está acontecendo.
Aline – E isso tem um impacto social grandíssimo, não? Estávamos falando um pouquinho da diáspora, aqui nos Estados Unidos, não?
Óscar – Bem, o pior que aconteceu é que o despovoamento de Porto Rico cresceu grandemente. Há mais porto-riquenhos vivendo na diáspora porto-riquenha que em Porto Rico. Mas ao mesmo tempo, nos últimos 15 ou 20 anos, o pior que aconteceu é que a pessoa que emigra, que está sendo forçada a emigrar porque em Porto Rico não há trabalho para ele ou para ela, é a fuga de cérebros humanos que sofremos. Se nos vão os doutores, se nos vão os engenheiros, se nos vão os enfermeiros, se nos vão todos os trabalhadores sociais, se nos vão os arquitetos, se nos vai toda a classe profissional. Então vem trabalhar… Uma das coisas mais cruéis em Porto Rico, por exemplo, é a questão dos professores e professoras. Quase todos os dias podemos ver professores que têm que migrar aos Estados Unidos, porque em Porto Rico as escolas foram fechadas. Se não há trabalho para eles, bem, têm que vir para cá trabalhar. E é uma perda, uma grande perda a que está sofrendo. Também em Porto Rico está o que se chama de gentrificação. A gentrificação é a construção de edifícios, condomínios caríssimos, que são especialmente construídos para estrangeiros. O governo – ou os que administram a colônia, porque não há governo, vamos estar claros nisso –, os que administram a colônia dão incentivos a esses estrangeiros – não têm que pagar impostos por comprar em Porto Rico. Compram, compram, mas não estão pagando nenhum imposto por toda sua vida. Sem embargo, aos porto-riquenhos, se uma pessoa compra uma casa como porto-riquenho, tem que pagar imposto. Essa é uma diferença grande, e algo que verdadeiramente nos afeta adversamente. Porto Rico não pode caber, não pode ter nenhum tipo de relações econômicas com países externos. Tudo tem que ser comprado nos Estados Unidos. Nós podemos importar, comida, por exemplo, o que nós consumimos, nós importamos 87% do que consumimos. Se vem da Costa Rica, esse barco vai aos Estados Unidos primeiro e depois a Porto Rico. A Lei de Cabotagem nos custa a Porto Rico anualmente algo como 6 bilhões de dólares. E esse dinheiro sai do bolso dos porto-riquenhos. Isso é uma crueldade e é uma realidade que afeta adversamente a nossa economia.
Aline – Exatamente. Nós estamos vendo agora, na América Latina em geral, vemos que está passando por uma série de mudanças onde parece que novamente as forças conservadoras recobram força, e também vemos um aumento do intervencionismo estadunidense. Como você vê a conjuntural atual na região?
Óscar – Bom, os Estados Unidos têm tomado – isso é política estadunidense: não permitir que governos progressistas entrem ao poder em nossos países. Por exemplo, quando Lula concorreu à presidência do Brasil, os Estados Unidos estavam completamente opostos à sua candidatura, por anos, por anos. O mesmo fizeram em Argentina, o mesmo fizeram na Bolívia, por exemplo, contra Evo Morales, se fez muito trabalho nos Estados Unidos para prevenir sua eleição. O mesmo aconteceu com Correa no Equador, o mesmo aconteceu quando Chávez entrou no poder… E mais: os Estados Unidos foram o único governo, o único governo que imediatamente reconheceu à junta militar que tentou apoderar-se do governo da Venezuela. O único país! E hoje, continuam, continuam com um processo acelerado de intromissão, de ingerência, de tratar de ditar a nossos países o que tem que fazer, o que está acontecendo. Mas isso é bem calculado, isso não é acidental. Isso é uma posição bem, bem, uma política, bem, bem, bem, bem elaborada, e podemos ver já como impôs um governo no Brasil, um governo de Macri na Argentina, e está buscando o mesmo, aonde quer que possa fazer, vai fazê-lo. Porque não quer permitir que outra Venezuela, que outro Lula esteja no poder, que os Kirchner, como fizeram um trabalho um pouquinho bom na Argentina cheguem ao poder, que Morales na Bolívia ou outro Correa no Equador cheguem ao poder. Não querem. Não vão permitir que governos progressistas… Querem oligarquias e querem esses governos servis que geralmente representam os interesses – defendem os interesses não de seus países, não os interesses, digamos, da Venezuela, mas sim os interesses da oligarquia e dos Estados Unidos.
Aline – Óscar López Rivera, muitíssimo obrigada.
Óscar – Bem, obrigado você!

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  1. Avatar
    PEDRO PAULO SALAZAR SANCHES says:

    vejam se não é isto que está acontecendo em toda AMERICA LATINA, OS AMERICANOS UTILIZAM OS JUDICIÁRIOS MINIST. PÚBLICO CORRUPTOS E PARTIDOS POLÍTICOS DE DIREITA DE ALUGUEL COMO POR EXEMPLO: PSDB, DEM, PPS, ALGUNS INTEGRANTES DO PMDB, SD, PRB, E UTILIZAM DAS SUAS MÍDIAS MONOPOLIZADAS E BILIONÁRIAS COMO A REDE GLOBOGOLPE, PARA DAREM O GOLPE E ROUBAREM AS RIQUEZAS DE NOSSOS PAÍSES, BRASIL OU NÓS A POPULAÇÃO VAMOS PRA DENTRO DE BRASILIA PARA ACABAR COM ESTES ROUBO OU ESTAMOS FADADOS A ESCRAVIDÃO.

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