Brasil

Mais um amigo que vai embora. Hoje foi o Jorge Moreno, 63 anos.

Quando o celular tocava e o nome dele aparecia na tela, antes de dizer alô eu entoava uma paródia do verso de Chico Buarque: “Moreno, dos olhos d’água…”. Hoje de manhã cedinho saí do chuveiro para atender a uma chamada insistente do telefone e recebi do José Dirceu, de Brasília, a péssima notícia: “O Moreno morreu”.
Nós nos conhecemos quarenta anos atrás, quando eu cobria política para o Jornal da Tarde e ele para o Jornal do Brasil ou para O Globo, não me lembro. Aproximou-nos a amizade comum com o doutor Ulysses Guimarães, então deputado federal e presidente nacional do PMDB. Nosso período de convívio mais intenso deu-se nas eleições presidenciais de 1989. Moreno era o assessor de imprensa do velho cacique e eu responsável pelo Programa de Cultura da frustrada campanha do doutor Ulysses a Presidente da República.
Foi nessa época que Moreno me convidou para ir à sua cidade natal, Cuiabá, para comer um inesquecível ensopado de pacu feito por sua mãe. Além do prato delicioso, impressionou-me a simplicidade franciscana da casa em que viviam seus familiares.
Pouco mais de um ano atrás Moreno me ajudou a fazer investigações para tentar reconstituir, a pedido de Aleida Guevara, a passagem do pai dela, o Che, por Cuiabá, nos anos sessenta, quando ele se dirigia à Bolívia.
Moreno morreu nesta quarta-feira (14/6), no Rio de Janeiro 63 anos. Repórter e colunista do jornal O Globo, onde trabalhou por 35 anos, Moreno foi vítima de um edema agudo de pulmão, decorrente de complicações cardiovasculares.
Moreno viveu em Brasília desde os anos 1970 e morava no Rio de Janeiro havia 10 anos. Quando era repórter do Jornal de Brasília, deu seu primeiro furo jornalístico. Foi o primeiro a noticiar a escolha do general João Baptista Figueiredo como sucessor do general Ernesto Geisel na Presidência da República.
“O primeiro que eu achei que eu deveria entrevistar era o Figueiredo. Quando eu cheguei nele, ele disse: ‘Eu sou o escolhido para ser o presidente da república. Eu serei o próximo presidente'”, contou Moreno em uma entrevista.
Por causa do furo, o jornal fez uma edição extra, a segunda de que Moreno participou. A primeira havia sido na morte do ex-presidente Juscelino Kubitschek. “Quando o corpo do Juscelino estava chegando no Campo da Esperança, em Brasília, a edição extra do Jornal de Brasília estava chegando também no cemitério. O povo comprava o Jornal de Brasília porque na capa era a foto do Juscelino para servir de bandeira, para abanar. Então, ali, eu pegava o jornal e falava ‘poxa, aqui tem coisa minha’, e o povo lendo. Foi a primeira grande, talvez a maior emoção da minha vida profissional”.
Já no Globo, publicou informações que levaram ao impeachment do ex-presidente Fernando Collor em 1992. Já havia dado furos pequenos, segundo o próprio Moreno, até que revelou que um Fiat Elba, de propriedade de Collor, tinha sido comprado por um dos pseudônimos de Paulo César Farias, José Carlos Bonfim. “Ele saía exibindo aquele Fiat Elba. Aí de repente se descobre que tinha sido comprado por um cheque administrativo de um fantasma do PC”, afirmou.
Foi vencedor do Prêmio Esso de Informação Econômica de 1999, com a notícia da queda do então presidente do Banco Central, Gustavo Franco. Recentemente Moreno revelou ter sido alvo de 12 processos por parte ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ) após criticar a atuação do ex-deputado no Legislativo.
Há três meses apresentava o programa “Moreno na Rádio”, de entrevistas na emissora CBN. Era também âncora do programa “Preto no Branco”, do Canal Brasil. Em março, lançou o livro “Ascensão e queda de Dilma Rousseff”. É autor de “A história de Mora – a saga de Ulysses Guimarães”, de 2013.
Ao saber da morte de Moreno, o ex-ministro José Dirceu enviou estas linhas ao Nocaute:
“Com tristeza recebi a notícia da morte do jornalista Jorge Moreno. Sempre respeitoso e sincero comigo, irônico e implacável mas correto. Durante o intervalo entre minha cassação e condenação na AP 470 sempre me recebeu em seu apto, na sua laje no Rio, como gostava de dizer, daquele jeito que só ele sabia fazer, simples mas majestoso. Sempre me tratando de Ministro mas direto e duro na crítica, nunca me prejulgou, tinha seu modo especial de ser solidário sem julgar, ou deixou de me convidar, cercado de amigos e amigas que o amavam e não escondiam a admiração pelo jornalista e especialmente pelo amigo”.

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