Nocaute https://nocaute.blog.br Blog do escritor e jornalista Fernando Morais Tue, 19 Jan 2021 17:21:37 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=5.7.7 https://nocaute.blog.br/wp-content/uploads/2018/06/nocaute-icone.png Nocaute https://nocaute.blog.br 32 32 Fernando Morais anuncia o encerramento das atividades do Nocaute. https://nocaute.blog.br/2020/08/01/fernando-morais-anuncia-o-encerramento-das-atividades-do-nocaute/ Sat, 01 Aug 2020 17:40:49 +0000 https://nocaute.blog.br/?p=69664 O Nocaute está encerrando suas atividades, o que acontecerá amanhã, sexta-feira, logo após a exibição do quarto e último episódio da minissérie Entrevistas com Putin, dirigida por Oliver Stone.

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Minhas queridas e meus queridos:

Infelizmente, sou portador de más notícias.

O Nocaute está encerrando suas atividades, o que acontecerá amanhã, sexta-feira, logo após a exibição do quarto e último episódio da minissérie Entrevistas com Putin, dirigida por Oliver Stone. 

O dinheiro era pouco e se acabou. Conseguimos sobreviver mais de três anos, sempre com a corda no pescoço. 

Temos repetido aqui o bordão de que “Tempos perigosos exigem jornalismo corajoso”. Mas fazer jornalismo e corajoso e independente tem um custo. 

As contribuições que recebemos regularmente de centenas de amigas e amigos do Brasil e do exterior foram a viga de sustentação do blog, mas as vacas emagreceram para todos. 

A perda dos poucos anúncios que recebíamos e a queda na arrecadação tornaram impossível organizar um orçamento mínimo. 

Nos últimos meses vivemos sem saber se haveria recursos para bancar os gastos do mês seguinte. 

As receitas tornaram-se cada dia mais insuficientes. O aluguel da salinha, os impostos, o custo extorsivo da Internet e a esquálida folha de pagamento – a equipe inteira cabe nos dedos de uma das mãos –  sugaram tudo.

Apesar de navegar contra o vento e a maré, demos furos jornalísticos nacionais e internacionais. Nosso canal no Youtube beira os 110 mil inscritos, com mais de 15 milhões de visualizações. Exibimos quase 2 milhões de horas em programação criada para você. 

Juntamos um dos mais brilhantes times de colunistas e colaboradores da imprensa.

Mês a mês nosso blog alcança mais de 400 mil pessoas. Não é pouco, especialmente num país que em os três principais jornais diários, somados, não chegam a 300 mil exemplares.

Nenhum de nós jogará a toalha ou abandonará as bandeiras que nos uniram durante quase quatro anos: a luta pela democracia, pelos direitos dos trabalhadores, pela soberania nacional, pela regulação da mídia eletrônica e por uma sociedade em que a riqueza seja de todos, não de uma minoria. 

Nossa eterna gratidão é a você. Sem cuja colaboração generosa não teríamos chegado tão longe. 

Mas voltaremos, não tenha dúvidas.

Em meu nome e no da equipe, receba o abraço inoxidável deste seu companheiro de sonhos e de esperanças.

Até a volta.

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Projeto Brasil Nação apoia “Carta Ao Povo de Deus” https://nocaute.blog.br/2020/08/01/projeto-brasil-nacao-apoia-carta-ao-povo-de-deus/ Sat, 01 Aug 2020 17:32:04 +0000 https://nocaute.blog.br/?p=69725 Assinada por mais de 150 de bispos brasileiros o texto aponta os descalabros produzidos pelo governo Bolsonaro, que impõe ao país milhares de mortes na pandemia, ataques à democracia, desagregação social, desastre ambiental, uma “economia que mata”.

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Assinada por mais de 150 de bispos brasileiros o texto aponta os descalabros produzidos pelo governo Bolsonaro, que impõe ao país milhares de mortes na pandemia, ataques à democracia, desagregação social, desastre ambiental, uma “economia que mata”.

De forma deliberada, Bolsonaro age para destruir o Brasil e subordiná-lo aos interesses estrangeiros, colocando a Nação como vassala dos Estados Unidos. Roendo as instituições, desprezando a população e aniquilando pequenas empresas, o governo se transforma em inimigo da vida, da saúde, da democracia, da soberania, da diplomacia, de direitos, da ética, da educação, da cultura, do desenvolvimento com justiça, igualdade e paz.

Como reforça o documento dos bispos, “o momento é de unidade no respeito à pluralidade!”. Seus signatários propõem “um amplo diálogo nacional que envolva humanistas, os comprometidos com a democracia, movimentos sociais, homens e mulheres de boa vontade”.

O Projeto Brasil Nação, movimento suprapartidário que reúne intelectuais, artistas, cidadãos de diferentes visões políticas, apoia essa ideia e se soma a esse chamamento. É preciso, como afirmam os religiosos, despertar “do sono que nos imobiliza e nos faz meros espectadores da realidade de milhares de mortes e da violência que nos assolam”.

São Paulo, 31 de julho de 2020

Projeto Brasil Nação

  • Luiz Carlos Bresser-Pereira
  • Celso Amorim
  • Margarida Genevois
  • Fábio Konder Comparato
  • Luciano Coutinho
  • Maria Victoria Benevides
  • Luiz Gonzaga Belluzzo
  • Paulo Sérgio Pinheiro
  • Eleonora de Lucena
  • Paulo Nogueira Batista Júnior
  • Maria Auxiliadora Arantes
  • Rodolfo Lucena
  • Luiz Felipe de Alencastro
  • Maria Aparecida Aquino
  • Fernando Morais
  • João Pedro Stedile
  • Silvio Almeida
  • Leda Paulani
  • José Luiz Del Roio
  • Antonio Elpídio da Silva
  • Rosane Borges
  • Edson Carneiro Índio
  • Tata Amaral
  • Edson França
  • Mario Vitor Santos
  • Gilberto Maringoni
  • Eduardo Fagnani
  • Benedito Tadeu Cesar
  • Ismail Xavier
  • Henri Arraes Gervaiseau
  • William Nozaki
  • Paulo Kliass
  • Cassia Damiani
  • Ângela Cristina dos Santos Ferreira
  • Altamiro Borges
  • Rodrigo Medeiros
  • Marijane Vieira Lisboa

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Após queda, curva de casos confirmados de coronavírus no Brasil volta a subir https://nocaute.blog.br/2020/08/01/apos-queda-curva-de-casos-confirmados-de-coronavirus-no-brasil-volta-a-subir/ Sat, 01 Aug 2020 16:55:00 +0000 https://nocaute.blog.br/?p=69769 Boletim da evolução da pandemia de Coronavírus no Brasil e nos 25 países mais afetados. Atualizado todos os dias às 20hs, junto com os dados do dia anterior, para efeito comparativo.

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Boletim da evolução da pandemia de Coronavírus no Brasil e nos 25 países mais afetados. Atualizado todos os dias às 20hs, junto com os dados do dia anterior, para efeito comparativo.

Covid-19 no Brasil e no mundo – 31 Julho 2020

O diretor-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), Tedros Adhanom Ghebreyesus, afirmou durante a quarta reunião do Comitê de Emergência nesta sexta-feira (31) que os efeitos do coronavírus continuarão “sendo sentidos nas próximas décadas. Essa pandemia é uma crise de saúde que só se vive uma vez por século e seus efeitos serão sentidos por décadas”. Ele ressaltou que “muitas questões científicas foram resolvidas, mas ainda há outras a serem respondidas”, e que “os primeiros resultados de estudos sorológicos mostram um quadro consistente: a maioria da população permanece suscetível a esse vírus, mesmo em áreas onde ocorreram surtos muito fortes”. “Muitos países que acreditavam ter passado pelo pior estão voltando a enfrentar surtos. Alguns que foram menos afetados nas primeiras semanas tiveram aumento de casos e mortes. E outros que tiveram surtos fortes conseguiram controlá-los.”

A curva de novos casos confirmados de coronavírus no Brasil reverteu a tendência de queda, e, desde a última semana, voltou a subir. Dados do LIS (Laboratório de Inteligência em Saúde) da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), em Ribeirão Preto, compilados a partir de estatísticas do Ministério da Saúde e baseados na média dos sete dias imediatamente anteriores, revelam que o número de casos confirmados de covid-19 está em trajetória ascendente — e “deve continuar assim”, diz Domingos Alves, coordenador do LIS. Três pontos principais têm chamado a atenção dos especialistas:

  1. Interiorização: Alguns estados onde as capitais registraram uma redução no número de casos passaram a verificar um aumento no número de casos em seu interior.
  2. Aumento de casos no Sul e Centro-Oeste: Nas últimas semanas, houve um aumento expressivo de novos casos de coronavírus no Sul e no Centro-Oeste, até então regiões que tinham conseguido controlar o contágio da doença.
  3. Aumento de casos em Minas Gerais: O estado vinha controlando o contágio da doença, mas, a partir de junho, tem registrado um aumento no número de casos e óbitos. Bastaram, por exemplo, apenas vinte dias para que Minas Gerais dobrasse a marca de mil mortes pelo novo coronavírus.

Pesquisa conduzida por cientistas do Instituto de Medicina Tropical da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), da Universidade de Oxford e do Imperial College de Londres publicada hoje na revista científica Nature Human Behaviour mostra que, de fevereiro a maio, cada pessoa com coronavírus no Brasil infectou, em média, outras 3 pessoas. De acordo com o estudo, o Brasil teve a taxa de transmissão mais alta na comparação com Itália, França, Reino Unido e Espanha, onde as médias foram de 2,5 e 2,6 por pessoa.

Visão diária dos principais indicadores da pandemia pelo mundo

Os três países com as maiores taxas de letalidade (relação entre casos confirmados e mortes) são Reino Unido com 15,2% (para cada 1.000 infectados, 152 vão a óbito), Itália (14,2%) e França (13,4%).

Nas últimas 24 horas, os três países com o maior número de novos casos são Estados Unidos (66.454 novos casos), Índia (56.799) e Brasil (52.383); os quatro países com as maiores taxas de crescimento percentual de casos em relação ao dia anterior são África do Sul (4,7%), Argentina, Colômbia e Índia (os três com 3,6%).

Nas últimas 24 horas, os três países com o maior número de mortes são Estados Unidos (1.266 mortes no dia), Brasil (1.212) e Índia (789); os três países com as maiores taxas de crescimento percentual de mortes em relação ao dia anterior são África do Sul (6,8%), Argentina (4,7%) e Colômbia (3,7%).

No acumulado da semana (últimos 7 dias), os três países com as maiores taxas de crescimento de casos confirmados são Índia (27,2%), Colômbia (26,3%) e Argentina (25,2%); os três países com as maiores taxas de crescimento de mortes são Colômbia (27,6%), Argentina (27,3%) e África do Sul (26,2%).

Os dados foram publicados pela Johns Hopkins University e Worldmeter.

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Apresentação do último capítulo, com um anexo, da série: A covid-19, o Estado e a pobreza https://nocaute.blog.br/2020/08/01/apresentacao-do-ultimo-capitulo-com-um-anexo-da-serie-a-covid-19-o-estado-e-a-pobreza/ Sat, 01 Aug 2020 16:30:08 +0000 https://nocaute.blog.br/?p=69801 O isolamento para reduzir a mortandade provocada pelo novo coronavírus levou à paralisação das economias e à necessidade de os governos intervirem para, em primeiro lugar, salvar os mais pobres. Como, nesse mundo tão desigual em que vivemos? A resposta foi anunciada para sete artigos em três capítulos. Nocaute hoje completa o trabalho, com o sétimo artigo, a segunda parte do terceiro capítulo. E acrescenta à série um documento especial: o chamado “livro branco” do governo chinês sôbre a crise do novo coronavírus no país.

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O isolamento para reduzir a mortandade provocada pelo novo coronavírus levou à paralisação das economias e à necessidade de os governos intervirem para, em primeiro lugar, salvar os mais pobres. Como, nesse mundo tão desigual em que vivemos? A resposta foi anunciada para sete artigos em três capítulos. Nocaute hoje completa o trabalho, com o sétimo artigo, a segunda parte do terceiro capítulo. E acrescenta à série um documento especial: o chamado “livro branco” do governo chinês sôbre a crise do novo coronavírus no país.

Capítulo 3 – Duas histórias sobre a pandemia
Parte 2 – Considerações sobre o livro branco do governo chinês que trata da epidemia do novo coronavírus

A ideia geral desta série sobre a pandemia do novo  coronavírus era descrever a proteção aos mais pobres por diferentes tipos de estados. O primeiro capítulo, em três partes, com uma reportagem na Rocinha, Rio de Janeiro, tratou da ajuda emergencial aos pobres do estado brasileiro, um país capitalista em desenvolvimento. Os artigos 4 e 5, do capítulo 2  analisaram os serviços de proteção aos pobres no país capitalista mais rico do mundo, os EUA. O capítulo 3 trata da China, um país socialista dirigido por um partido, o Partido Comunista da China. E tem duas partes: a primeira, o sexto dos sete artigos prometidos, descreveu, do ponto de vista dos dois mais altos dirigentes da política externa americana, o presidente Donald Trump e seu secretário de Estado Mike Pompeo, o que seria a responsabilidade da China, o país onde a atual pandemia nasceu, por não ter cortado pela raiz a propagação do novo coronavírus. Este último artigo da série é um comentário sobre o chamado “livro branco” do governo chinês sobre a crise do novo coronavírus no país. É um documento extenso: tem  mais de 70 páginas. O autor desta série o leu, na versão da agência chinesa Xinhua, em inglês. Traduziu para o português com a ajuda do Google Translator e fez a revisão final do texto assim produzido. E, com o editor do Nocaute, Fernando Morais, considerou útil para os brasileiros preocupados com o futuro do País, a sua divulgação. O documento chinês é então apresentado como um anexo no encerramento da série.

Números da pandemia da Covid 19: proporção de mortos por habitante, até agora, final de julho de 2020: China, 1 para cada 300 mil habitantes; Brasil, 100 vezes mais, 1 para cada 3 mil habitantes: e Estados Unidos, 150 vezes mais, 1 para cada 2 mil habitantes. Para entender como isso aconteceu é preciso ver

A história contada pelos chineses

A pandemia da Covid 19, a doença causada por um vírus de tipo novo, começou na China, não há dúvida. O presidente americano Donald Trump e seu escudeiro, o secretário de Estado Mike Pompeo, como vimos nesta série, disseram que os Estados Unidos foram atacados pelo vírus, porque a China, que deveria ter impedido a sua propagação imediatamente, não o fez. Acusado publicamente, o governo chinês respondeu com um documento que chamou de “livro branco”, termo usado geralmente por instituições nacionais para aprofundar a análise de um problema e esclarecer sua posição. 

Parte da acusação vem de uma boa história, mal contada pelo semanário inglês, The Economist, na sua página de obituários, na edição de 13 de fevereiro deste ano. Ela resume a vida do doutor Li Wenliang, oftalmologista do Hospital Central de Wuhan, que teria sido, diz a revista “um dos primeiros a advertir sobre um novo coronavírus” e morreu no dia 7 de fevereiro, internado naquele mesmo hospital, aos 33 anos.

A revista, a melhor de seu tipo pode-se dizer, é de orientação liberal e anticomunista e, talvez por esse motivo, deixou de ver aspectos essenciais da história, como procuraremos demonstrar. O médico estava no hospital, quando se formou ali, em isolamento, o primeiro grupo de doentes internados com os mesmos sintomas de pneumonia grave e o mesmo antecedente, de terem passado pelo mercado de frutos do mar da cidade. Habituado a repassar pela Weibo, uma rede social chinesa, as novidades do dia para um grupo de amigos egressos da mesma universidade de Wuhan, Wenliang postou, no final do dia 30 de dezembro, ligando a quarentena no hospital ao surto de SARS  (Severe Acute Respiratory Syndrome, síndrome respiratória aguda grave) ocorrido na China entre 2002-2003, o seguinte texto: “Sete casos de SARS no Mercado Atacadista de Frutos do Mar de Wuhan”. 

Na mesma noite do dia 30 de dezembro, uma segunda feira, em função da repercussão do seu post que, como se diz, viralizou na internet, o médico foi chamado para dar explicações aos dirigentes do hospital. Foi criticado, mas não foi punido, multado ou afastado de sua posição. E, na mesma semana, no dia 3 de janeiro, uma sexta-feira, foi chamado para um depoimento na polícia. 

Neste, diz a Economist, ele foi liberado depois de acabar fazendo duas afirmações: que concordava com a avaliação de que espalhar rumores que prejudicassem a ordem pública era uma atividade ilegal; e que, se repetisse o feito, seria punido com base na lei. Essa história, graças ao grande alcance internacional da Economist, transformou Wenliang num herói para os críticos da China, tanto os ideológicos anticomunistas tradicionais, como os de ocasião.  

O necrológio de Wenliang na Economist é um exemplo dos problemas dessa narrativa. Ele apresenta o médico, de modo convincente, como uma pessoa ingênua e de boa fé. E também um pouco descuidado e precipitado. Ele acabou morrendo no mesmo hospital no dia 10 de fevereiro  depois de ter tratado um caso de infecção nos olhos grave, numa idosa de 82 anos, sem máscara, por não ter percebido os sinais da pneumonia que ela apresentava e que acabou transmitindo a ele, justamente a nova doença. Wenliang se apressou na divulgação de seu post no dia 30: uma hora depois de tê-lo publicado, o corrigiu. A revista diz, a propósito dessa correção: “embora se tratasse de um coronavírus”, como o da SARS, o vírus “ainda não havia sido identificado”. 

Como a Economist ou o doutor Wenliang poderiam saber que o vírus era do tipo coronavírus já no final do ano passado? As autoridades médicas do Hospital Central e da cidade de Wuhan colocaram sob quarentena um grupo de doentes com pneumonia grave, do início dessa nossa história, depois de examiná-los e com alguns exames laboratoriais entre meados e 27 de dezembro quando fizeram um primeiro comunicado de alerta sobre a doença. Mas notificaram que se tratava de “uma pneumonia viral de origem desconhecida”. 

Uma pneumonia grave pode ter origem bacteriana. Mas a bactéria é, comparativamente, bem maior, mais fácil de identificar: um vírus, não; se mede em nanômetros, milionésimos de metro, e não em microscópios comuns, mas eletrônicos. Um vírus e sua ação não se identificam por conjecturas, mas em observações por pessoal especializado e processos técnicos e científicos sofisticados. É claro, também, que acima dessas instâncias, para se prevenir dos malefícios do vírus, é preciso ter a direção administrativa e política correta, se se trata, como no caso, de um fato com claras repercussões nacionais e mesmo internacionais. E é verdade também que esta direção não pode se guiar, nas questões técnicas e científicas, por sua própria ignorância – como foram os casos, no Brasil e nos EUA dos governo democráticos dos presidentes Jair Bolsonaro e Donald Trump. 

Na luta contra o coronavírus, o exemplo dado pela China, dirigida pelo governo de um partido comunista presidido por Xi Jinping é extraordinário, em diversos aspectos. Destacaremos dois pontos do livro branco chinês, começando por esse problema inicial: qual era o vírus?

1. A identificação do novo coronavírus

No dia 27 de dezembro – três dias antes do post do doutor Wenliang, portanto – o Hospital Provincial de Medicina Chinesa e Ocidental de Wuhan relatou casos do que chamou “pneumonia viral de causa desconhecida” ao Centro de Prevenção e Controle de Doenças da região. O governo da cidade de Wuhan reuniu especialistas locais para analisar esses casos através do exame das condições e história dos pacientes, de investigações epidemiológicas e de resultados preliminares de testes laboratoriais. A conclusão foi a de que eram casos de uma “pneumonia viral de causa desconhecida”. Ou seja, era uma doença causada por vírus, mas não se sabia qual.

Três dias depois, a 30 de dezembro, quando o doutor Wenliang fez o seu post na Weibo, a Comissão de Saúde da Cidade de Wuhan emitiu um “Aviso Urgente” sobre o tratamento de pacientes com a “pneumonia de causa desconhecida”. Após tomar conhecimento desses fatos, a Comissão Nacional de Saúde da China, no último dia do ano, diz o documento chinês “nas primeiras horas do dia 31”, “tomou providências para enviar um grupo de trabalho e uma equipe de especialistas a Wuhan para orientar sua resposta à situação e conduzir investigações no local”.

O site do hospital onde os doentes estavam internados divulgou logo a seguir uma Circular de Informações instando a população a ficar longe de locais públicos fechados com pouca ventilação e de locais onde grandes multidões se reunissem e também sugeriu o uso de máscaras na circulação de pessoas.  

O caso, a seguir, tornou-se preocupação nacional. A Comissão Nacional de Saúde da China formulou diretrizes sobre “detecção precoce, diagnóstico precoce e quarentena precoce para prevenção e controle da pneumonia viral de causa desconhecida”. E, pouco depois, o Centro Chinês de Controle e Prevenção de Doenças e a Academia Chinesa de Ciências Médicas receberam o primeiro lote de amostras de materiais para exame, tirados de quatro pessoas do grupo de doentes de Wuhan e iniciaram o processo de identificação do patógeno.

No dia 3 de janeiro, quatro instituições de Wuhan iniciaram testes laboratoriais paralelos das amostras e dois dias depois o resultado desses exames foi divulgado e descartou patógenos respiratórios conhecidos: influenza, influenza aviária, adenovírus, coronavírus da SARS, e coronavírus da MERS, Síndrome Respiratória do Oriente Médio como causa da doença. A conclusão final saiu mais dois dias depois, a 8 de janeiro, quando uma equipe especial designada pela Comissão Nacional de Saúde da China afirmou que o provável causador da doença que surgia era, como o da SARS, um coronavírus, mas de novo tipo. E, no dia seguinte, essa informação foi divulgada. Ao receber a informação, a Organização Mundial de Saúde, a colocou em seu site e a aplaudiu: a identificação de um novo coronavírus em um período tão curto de tempo era, disse a OMS, “uma conquista notável”. E, no dia 12 de janeiro, o Centro de Controle e Prevenção de Doenças da China, a Academia de Ciências Médicas da China e o Instituto de Virologia de Wuhan, na condição de agências designadas do Centro Nacional de Saúde da China, enviaram à OMS a sequência de genes do genoma completo do novo coronavírus. Finalmente, entre os dias 18 e 19 de janeiro, uma equipe nacional de especialistas em medicina e controle de doenças reunida em Wuhan pela Comissão Nacional de Saúde da China, após exames, debates e deliberação, concluiu, no meio da noite do dia 19, que a transmissão do vírus entre humanos era a causa de sua rápida disseminação.

2. O fechamento de Wuhan e de Hubei

Wuhan é uma grande cidade, tem cerca de 10 milhões de habitantes. É a capital de Hubei, uma das 22 províncias da China, que tem perto de 60 milhões de habitantes. Fechar a cidade e a província, para entrada e saída apenas de pessoas autorizadas, para evitar o espalhamento do vírus pelo país de pessoa para pessoa, como anunciado pelo presidente Xi Jinping a 22 de janeiro, foi a decisão mais drástica das inúmeras que o governo chinês tomou. E desempenhou papel crítico na vitória do povo chinês contra o vírus.

Foi necessário garantir o suprimento de bens e serviços essenciais para os milhões de moradores da cidade e da província e, especialmente na capital, onde a determinação oficial era “não sair de casa”. Alimentos e outras necessidades domésticas tiveram que ser organizados. Wuhan tem 2,4 milhões de domicílios: foi preciso montar um esquema de levar alimentos – grãos, vegetais, carne, ovos e leite até as suas moradias, diz o livro branco chinês. O governo central chinês, os governos locais, 500 empresas, todas as associações comunitárias, todas as 4,6 milhões de organizações de base do Partido Comunista da China, todos os seus militantes foram chamados a participar, diz o livro branco. “De 27 de janeiro a 19 de março, 928.800 toneladas de materiais de prevenção e controle de epidemias e necessidades diárias foram transportadas de todo o país para Hubei via ferrovia, rodovia, hidrovia, aviação civil e serviços postais expressos. Também foram embarcados produtos a granel, como carvão térmico e combustível, totalizando 1,49 milhão de toneladas”,  diz o documento chinês.  “A partir do fechamento, para Wuhan e Hubei também foram despachadas 346 equipes médicas compostas por 42.600  médicos e 965 trabalhadores de saúde pública de todo o país e das forças armadas”.  Diz ainda o documento num trecho que deveria ser lido pelo presidente Jair Bolsonaro, para tratar de sua mania de levar oficiais das Forças Armadas para Brasília: “O Exército de Libertação do Povo (PLA) enviou mais de 4.000 médicos para Hubei para trabalhar no controle de epidemias. (…) A Força Aérea do PLA despachou aeronaves para transportar suprimentos médicos de emergência. As equipes médicas foram formadas dentro de duas horas após o recebimento do pedido e chegaram aos seus destinos dentro de 24 horas, carregando um estoque de sete dias de materiais de proteção. Na chegada, eles começaram a tratar os pacientes imediatamente”.

Nem tudo deu certo, o documento oficial admite isso, num trecho no qual destaca o papel do Partido  Comunista da China. O partido e suas organizações de base serviram como núcleos de combate à epidemia, diz o trecho do documento: “Com a epidemia colocando as vidas e segurança humanas em perigo os membros do partido atuaram como a vanguarda: mais de 39 milhões de membros do partido combateram o vírus na linha de frente e cerca de 400 defenderam a vida de outros com o sacrifício de suas próprias vidas, E, em seguida, vem a admissão de erros: “As lideranças da Cidade de Wuhan e da Província de Hubei foram trocadas, com alguns dirigentes punidos por irresponsabilidade e não cumprimento do dever”. O documento não entra em detalhes mas, por exemplo, sabe-se que o prefeito de Wuhan e o secretário geral do partido na cidade foram trocados. Um amigo ao qual o autor deste texto mostrou o documento chinês e falou dos afastamentos desses dois líderes de Wuhan foi fez o seguinte comentário: “Não seria o caso de a oposição brasileira pedir o afastamento do presidente Jair Bolsonaro por seu comportamento grotesco na condução de seu governo no combate a esta epidemia que, a essa altura já matou mais de 90 mil brasileiros?” 

É uma boa idéia. 

Lutando contra a Covid-19: a China em ação, documento do Escritório de Informação do Conselho de Estado da República Popular da China,  junho de 2020

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Duas histórias da pandemia https://nocaute.blog.br/2020/08/01/duas-historias-da-pandemia/ Sat, 01 Aug 2020 16:29:57 +0000 https://nocaute.blog.br/?p=69800 Uma, a de Trump e Mike Pompeo. Outra, a do Governo da China. Primeiro, a história americana.

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Uma, a de Trump e Mike Pompeo. Outra, a do Governo da China. Primeiro, a história americana.

CAPÍTULO 3
Parte 1

No dia 30 de abril, a universidade americana Johns Hopkins, que organizou um banco de dados para acompanhar no dia a dia a pandemia da Covid 19, anunciou que os Estados Unidos tinham, confirmados, 1.039.909 casos de infectados pelo  coronavírus e 60.066 mortes causadas pela doença. No mesmo dia, o presidente americano Donald Trump, numa cerimônia supostamente em homenagem aos idosos, num salão da Casa Branca, tratou da Covid de um modo curioso: disse que o vírus foi o pior ataque que o país já tinha sofrido em sua história e culpou a China por não ter controlado a doença. “Isto é pior do que Pearl Harbour. Isto é pior que o World Trade Center”, disse, referindo-se ao ataque dos japoneses contra a base  americana no Havaí, em 1941, na qual morreram 2.400 soldados americanos e que definiu a entrada do país na Segunda Guerra Mundial e ao ataque dos terroristas islâmicos de Osama bin Laden contra as torres gêmeas do World Trade Center em Nova Iorque, de 11 de setembro de 2001, que causou cerca de 5 mil mortes. “E (isso, a epidemia) nunca deveria ter acontecido. Isso deveria ter sido parado na China. Deveria ter sido parado na fonte. E não foi.” Logo em seguida, no dia 3 de maio, foi a vez do secretário de Estado americano, Mike Pompeo, ampliar a versão de Trump sobre a origem da Covid 19. Ele disse ter “enormes evidências” de que o vírus era produto de um laboratório de Wuhan, a cidade chinesa na qual a epidemia começou. “A China tem uma história de infectar o mundo. E tem também um histórico de laboratórios de baixo padrão”, afirmou Pompeo.

Trump e Pompeo tentaram se justificar por não apresentarem provas de acusação tão grave. “Eu não posso lhe dizer”, disse Trump, respondendo a um dos idosos, na cerimônia. “Não é permitido que eu lhes conte isso”, disse, sugerindo não poder revelar altos segredos de Estado. Tanto ele como Pompeo de início sugeriram que o vírus era fabricado, teria sido produto de engenharia genética. Dois de seus principais comandados, no entanto, afirmaram, em seguida, o contrário: o chefe do Estado Maior das Forças Armadas, general Mark Miller, declarou que “o peso maior das evidências aponta para uma transmissão natural do vírus”; e o médico Anthony Faucci, assessor especial de Trump para o combate à doença e diretor do Instituto Nacional de Pesquisa de Alergias e Doenças Infecciosas do país disse também que o conjunto das evidências apontava para um vírus que se desenvolveu na natureza e pulou da transmissão entre animais para a transmissão por humanos.

O governo americano procurou, através de informações de seus órgãos de segurança, mobilizar a opinião pública contra os chineses. O The New York Times noticiou que o Homeland Security Department, o órgão especial criado nos EUA após os atentados contra o WTC, para manter vigilância na defesa do país, planejava acusar a China de “hackear informações”, de roubo de fórmulas de vacinas, de testes de detecção e de métodos de tratamento da doença. O jornal disse ainda que a ação contra os hackers incluía também como alvos “non traditional sectors”, espiões não tradicionais, o que seria uma referência a estudantes e pesquisadores chineses nos EUA agindo contra o país. Isso colocaria sob suspeita centenas de milhares de chineses disse o NYT, criticando a decisão. (Como se sabe, os estudantes chineses nos EUA são centenas de milhares; eram 360 mil no ano letivo de 2017-2018.)

Nesse contexto, uma notícia falsa foi criada e teve grande repercussão nos EUA e mesmo na China. Dois pesquisadores chineses de um Laboratório Nacional de Virologia, em Winnipeg, no Canadá, foram apontados como suspeitos de terem levado o vírus para a China. Uma imagem de duas pessoas, um homem e uma mulher, aparentemente sendo escoltados por policiais na saída de um serviço de saúde do Canadá foi apresentada como sendo de dois cientistas chineses que seriam espiões e teriam levado o vírus para o Laboratório de Wuhan. 

Como isso aconteceu? Como se verá, blogueiros e jornalistas apressados, interessados em provar a história criada pelos altos mandatários americanos, por investigação própria ou ajudados pelos serviços de investigação do governo, foram atrás de dois cientistas chineses ligados à virologia e acabaram encontrando, em Winnipeg, no Canadá, um casal: a doutora Xiangguo Qiu e seu marido Keding Cheng. A doutora Qiu foi para o Canadá para graduação em virologia em 1996. Formou-se e ficou por lá em cursos de especialização.  Atraiu dezenas de estudantes chineses para o Canadá. Trabalha na vanguarda da pesquisa com vírus. Teve participação importante na descoberta do tratamento para o Ebola, vírus que matou 11000 pessoas na África Ocidental, entre os anos de 2014-2016. Seu marido trabalha no hospital de Winnipeg como biólogo e tem artigos publicados nas revistas especializadas sobre vírus como o HIV e os das Severe Acute Respiratory Síndromes (SARS). síndromes respiratórias agudas graves, como a da Covid 19 

Por que a doutora era um alvo ideal? Porque ela, em 2018 e 2019  em duas semanas em cada um desses anos, deu aulas no Laboratório Nacional de Virologia, de Wuhan, a entidade de virologia de nível mais alto da China. E mais ainda, para alegria dos adeptos das teorias conspiratórias: do Laboratório de Virologia do Canadá em Winnipeg, onde a doutora Qiu trabalhava tinham sido enviadas amostras de vírus para a China em março deste ano. 

As acusações foram desmentidas pelo serviço de imprensa da Universidade de Winnipeg e por investigação da polícia federal do Canadá. Foi demonstrado que os vírus enviados para a China eram do ebola e do Henipavirus – estes, isolados de micro morcegos de frutas, que causam doenças em animais domésticos e portanto são ameaças potenciais aos humanos. Foi demonstrado também que, no envio desses vírus para a China tinham sido cumpridas todas as normas de segurança do governo canadense.

Mas a notícia falsa, como se diz, viralizou: uma versão em chinês foi divulgada pelo Tik Tok, aplicativo de largo uso na China, e teve 350 mil visualizações.

Um site especializado em desmontar fake news, da Fact Check Org, analisou o caso que tinha circulado nas mídias sociais com a conclusão de que “um time de espiões chineses” tinha enviou o mortífero coronavírus para Wuhan de um laboratório de pesquisa no Canadá. O site entrevistou por e-mail Eric Morrissette, porta voz da Agência de  Saúde Pública do Canadá que disse que a história era “desinformação” e que não tinha “base factual”. O site cita várias histórias da CBC News, a emissora pública de notícias do Canadá que trataram de aspectos do caso envolvendo a doutora Qiu, de suas viagens à China, mas diz que em nenhum momento essas notícias citam o envio de patógenos para Wuhan. 

Diz o site ainda: em julho do ano passado, a CBC noticiou que “um pesquisador com ligações com a China tinha sido acompanhado para sair do National Microbiology Lab, em Winnipeg, a partir de uma investigação pela polícia federal do país (Royal Canadian Mounted Police, RCMP). O site ouviu a oficial Caroline Duval, dessa polícia. Ela resumiu o caso dizendo: “Não há qualquer investigação da RCMP  ligada ao surto de coronavírus ocorrido na China”. 

A China tem dito que apoia os esforços da Organização Mundial de Saúde de investigar a origem da pandemia. Há muitos sinais também de que o vírus não teve origem na China, disse a porta voz do ministério das Relações Exteriores da China, Hua Chunying. “Muitos cientistas ainda não chegaram a uma conclusão. Porque o secretário Pompeo está tirando a conclusão de que o vírus surgiu no laboratório de Wuhan? Onde está sua prova? Mostre-nos a prova?” Ele diz uma coisa agora e diz outra depois. “E a razão do porque ele se contradiz é porque ele está sempre inventando uma mentira para acobertar outra”.

Outra opinião que merece destaque na análise das posições de Trump e seu escudeiro Pompeo é de um especialista em política internacional inglês, Tom Fowdy. Ele escreveu  em março quando a Covid já explodia em Nova Iorque e começava a atingir atingir os EUA pelo outro lado, a partir da Califórnia. O país estava despreparado, ele diz. O vice-presidente Mike Pence admitiu publicamente que o governo não tinha testes suficientes para acompanhar o surgimento de novos casos.Trump, por sua vez, tinha uma postura negligente e repetidamente tentava minimizar o impacto da pandemia, para ver se minimizava o dano econômico. Na medida em que os problemas foram aparecendo ele passou a culpar os suspeitos de sempre colocando a culpa em Pequim. A China não têm  responsabilidade sobre a situação nos Estados Unidos, diz ele. A acusação é oportunismo de Trump; visa  desviar a culpa do fracassos de sua própria administração. A China é um bode expiatório. Seus ingentes esforços para conter o espalhamento do vírus foram muito bem sucedidos e é ilógico culpar os chineses. Trump, na sua obsessão de preservar a economia pensando na sua reeleição, tentou ver a epidemia como uma oportunidade e não uma ameaça.

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A covid-19, o Estado e a pobreza https://nocaute.blog.br/2020/08/01/a-covid-19-o-estado-e-a-pobreza-5/ Sat, 01 Aug 2020 16:29:46 +0000 https://nocaute.blog.br/?p=69797 O capitalismo se apoia na desigualdade; e, nos últimos anos, ela desembestou no país mais rico do mundo.

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O capitalismo se apoia na desigualdade; e, nos últimos anos, ela desembestou no país mais rico do mundo.

CAPÍTULO 2 – A ajuda à pobreza nos EUA, o país dos muito ricos

Parte 2 – Programas contra a pobreza não faltam; o sistema é que é o problema

Ser pobre é relativo: todos os anos, o governo americano publica suas “US poverty guidelines”, uma espécie de guia para definição do que é ser pobre no país. É uma tabela, com valores em dólares, do limite máximo de renda que a família ou o cidadão isolado precisa ter para ser enquadrado na categoria de pobre. O valor é definido pelo tamanho da família: para este ano, para a família de um só indivíduo, o valor é US$12.760 de renda anual; e essa quantia vai crescendo até US$ 44.130 anuais para a família de oito pessoas (é previsto um acréscimo de US$ 4.480 por pessoa a mais do que oito). A tabela vale para todos os estados americanos e tem ajustes especiais para os casos de Alasca e do Havaí.

Se é pobre, a família ou o cidadão podem ser enquadrados em algumas dezenas de programas de combate à pobreza. Vários dos ministérios do governo americano têm iniciativas desse tipo. O Departamento do Tesouro, que trata das finanças do país, tem quatropor exemplo, o da Clínica para os contribuintes de baixa renda, o qual, por suposto, ajuda os pobres a preencher os formulários da Receita Federal lá deles, todo ano, para não pagarem impostos. O Departamento de Agricultura tem dez. Para as escolas, por exemplo, tem o do lunch, o do breakfest e o das férias (the Summer Food Service Program). Tem ainda um programa para as reservas indígenas; outro para os agricultores idosos; e dois especiais para crianças e suas mães. O setor do governo com o maior número de programas é o DHHS, Departamento de Saúde e Serviços Humanos. Nele está o Medicare, que procura ajudar, com subsídios e assistência técnica, aos pobres que não conseguem pagar seguro-saúde privado, o que é a regra no país. Está também o Medicaid, que ajuda a população de menor renda a pagar visitas médicas, tratamentos emergenciais, medicamentos de uso continuado. No DHHS estão ainda: um programa especial para os veteranos das guerras do país; e outro para ajudar donos de empresa com até 49 funcionários a organizar as contribuições para seguro-saúde de seus assalariados.

Como se vê, programa de combate à pobreza é o que não falta nos EUA. O problema, porém, é outro: é a renda e a riqueza acumulada. O gráfico reproduzido abaixo é de um artigo da Wikipedia, uma organização sem fins lucrativos cuja qualidade de informação é comparável à da Enciclopédia Britânica. Ele dá a distribuição de renda nos EUA a partir de cálculos feitos no terceiro trimestre do ano passado. No eixo vertical está a renda anual das famílias, em dólares. No eixo horizontal está a posição da família numa escala de distribuição de renda em blocos crescentes de 1%, sendo o de 0% a 1% inicial o dos mais pobres de todos e o último, do 99% ao 100%, o dos mais ricos de todos.

O que o gráfico diz, quando examinado com atenção? De zero até cerca de 6% tem uma turma no vermelho, gente que não acumulou renda; ao contrário, ficou devendo no ano que passou. Nesse fundo de poço, na ponta vermelha à esquerda no gráfico, está o 1% do bloco dos mais pobres. Um número anuncia o valor da renda dessa turma: -US$ 80.620 dólares. Ou seja, um saldo negativo de US$ 80.620 no ano. E no extremo oposto, do grupo entre 99%-100%, onde estão os mais ricos, a renda é de US$ 10, 400 milhões por ano. Veja-se também onde ficam os US$ 44.130 que mede o limite para o cidadão ser enquadrado como pobre neste ano, de que já falamos. Ele está aproximadamente na casa dos 35% da população. Ou seja, um terço das famílias do país está na faixa oficial da pobreza.

A renda anual decorre em boa parte da riqueza acumulada [essa explicação é estranha: renda é um fluxo, enquanto riqueza é um estoque – o mais razoável é que o estoque decorra do fluxo]. Pelas contas já citadas, do terceiro trimestre do ano passado, a riqueza americana – bens, veículos, objetos pessoais, negócios, poupança, investimentos – somava 107 trilhões de dólares. Desse total, os 10% mais ricos tinham 70% e os 50% mais pobres apenas 1,6% [é claro: quem tem renda muito baixa não pode acumular riqueza]. Os mais ricos têm também as retiradas mensais, a título de trabalho, mais altas. Um funcionário médio de uma grande empresa precisa trabalhar mais de um mês para receber o que ganha em uma hora o seu executivo principal.

O problema da ajuda aos pobres não é, como pensam muitos, que o auxílio os torna indolentes e lhes roubam o ânimo que eles precisam ter para trabalhar e ficar bem de vida. Robert Reich, um economista que foi secretário do Trabalho no governo americano e fez parte da assessoria inicial do presidente Barrack Obama (2013-2016) divulgou recentemente um documentário intitulado Inequality for All, no qual afirma que 95% dos ganhos resultantes do tipo de ajuste econômico feito para tirar o capitalismo da sua última grande recessão, a de 2007-2009, foram para o 1% mais rico da população. Mais recentemente, diz ainda o artigo da Wikipedia, a Oxfam, uma organização fundada em 1942 e que hoje congrega uma centena de entidades empenhadas no combate à pobreza, publicou um estudo no qual mostra que as oito pessoas mais ricas do mundo, das quais seis eram americanas, tinham uma riqueza acumulada equivalente à do restante da população humana.

O próprio Fundo Monetário Internacional fez uma advertência nesse sentido em trabalho divulgado logo que o Federal Reserve, o Banco Central americano, desenhou o programa chamado de “quantitative easing” de ajuda aos “too big to fail”, aos grandes bancos que não podiam quebrar porque quebrariam o próprio sistema. Em síntese, o Fed disse que um dos seus resultados previsíveis seria a concentração de renda. A concentração está aí, como mostra Reich. Não é que a ajuda aos pobres não tem sentido. Ela serve a milhões de pessoas, mesmo num país muito rico, como os EUA. E, não se pode esquecer, a pobreza é relativa. Uma criança de 10 anos que não pode comprar um celular para jogar com seus amiguinhos é pobre. E muitos não podem. Hoje, 8 de julho, nas Casas Bahia, em oferta, um celular novo, dependendo do tipo, custa entre R$ 950 e R$ 2.800, que podem ser pagos em 10 ou 12 vezes, ou seja, entre perto de 100 e 250 reais por mês.

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Oliver Stone a Putin: “Você hackeou as eleições nos EUA?”. https://nocaute.blog.br/2020/07/31/oliver-stone-a-putin-voce-hackeou-as-eleicoes-nos-eua/ Fri, 31 Jul 2020 16:50:33 +0000 https://nocaute.blog.br/?p=69724 No último capítulo da série “Entrevistas com Putin”, Oliver Stone mergulha na acusação de que Moscou interferiu nas eleições presidenciais dos EUA. O Kremlin esteve envolvido no ciberataque ao Comitê de Campanha Parlamentar Democrata? Putin ajudou o então candidato republicano Donald Trump chegar ao poder? É possível abrir uma nova página nas relações russo-americanas? Não perca. Hoje, às 21:45, no Nocaute e na TVT.

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No último capítulo da série “Entrevistas com Putin”, Oliver Stone mergulha na acusação de que Moscou interferiu nas eleições presidenciais dos EUA. O Kremlin esteve envolvido no ciberataque ao Comitê de Campanha Parlamentar Democrata? Putin ajudou o então candidato republicano Donald Trump chegar ao poder? É possível abrir uma nova página nas relações russo-americanas? Não perca. Hoje, às 21:45, no Nocaute e na TVT.

Em mais de uma dúzia de entrevistas, o cineasta americano Oliver Stone, vencedor de três Oscar, teve acesso sem precedentes ao presidente russo para realizar esta minissérie “Entrevistas com Putin” – que o Nocaute vem exibindo semanalmente, em parceria com a TVT, em exclusividade nacional. A partir de agosto a série será exibida também nos seguintes canais educativos e comunitários: TV Antares (PI), TV Caruaru (PE), TV Cidade Livre Brasília (DF), TV Delta (PI), TV Educativa da Bahia (BA), TV Kirimurê  – TV Comunitária de Salvador (BA), TV Picos (PI), TV UFPE – Universidade Federal de Pernambuco (PE), TVCOM Maceió (AL), TVCOMDF Brasília (DF) e TVCRIO Rio de Janeiro (RJ).

A minissérie é considerada o mais minucioso e detalhado retrato do presidente russo já realizado por um entrevistador ocidental. Sem qualquer censura e sem nenhuma pergunta sem resposta, esta notável série em quatro capítulos traz uma visão íntima da vida pessoal e profissional de Putin. Stone leva o presidente russo a falar de sua infância sob o comunismo, o judô como saída para escapar da delinquência, a ascensão ao poder, a carreira no Serviço Secreto Soviético, o KGB, e suas relações com quatro presidentes dos EUA. 

Nenhum assunto, nenhum tabu ficou fora dos quatro capítulos desta minissérie. Stone pergunta a Putin sobre o a Perestroika, sobre Gorbatchov e Iéltsin, sobre o hackeamento das eleições americanas para favorecer Trump e sobre as articulações secretas para que Edward Snowden fugisse da CIA e entrasse clandestinamente na Rússia, onde vive hoje.

Em surpreendente iniciativa, Putin leva Stone para uma sala de guerra, de onde o presidente comanda, diante das câmeras do cineasta e em tempo real, operações militares na guerra contra o Estado Islâmico em pleno território sírio. Um filme de ficção não seria tão inverossímil. 

Vladimir Putin faz revelações sobre o papel dos Estados Unidos na criação da Al Qaeda e do mito Osama Bin Laden, conta que sugeriu a Clinton que a Rússia fosse admitida na OTAN, identifica a mão da Casa Branca nas guerras da Ucrânia e da Criméia e dá detalhes da privatização selvagem ocorrida na Rússia pós União Soviética. E confidencia os conselhos que Fidel lhe passou para cuidar melhor de sua segurança pessoal. 

Em meio a temas ásperos e dramáticos, a série mostra momentos anedóticos, como Putin dizer que “quase chorou de saudade” ao ficar três meses sem ver Oliver Stone, ou quando o presidente russo diz que “não ficaria nu no banheiro de um submarino com um oficial gay.” Segundo a crítica norte-americana, “The Putin Interviews” só é comparável, do ponto de vista político e jornalístico, às “The Nixon Interviews”, realizadas em 1977 por David Frost com o ex-presidente Richard Nixon

Vencedor de dois Oscar como melhor diretor (por Platoon  e Nascido em 4 de Julho) e um como melhor roteirista (Expresso da Meia-Noite), Oliver Stone recebeu cinco vezes o Globo de  Ouro, três como diretor (Platoon, Nascido em 4 de Julho e JFK) e duas como roteirista (Nascido em 4 de Julho e Expresso da Meia-Noite).  

Desde que estreou em 1971 com o curta “Last Year in Vietnam”, e até dirigir “The Putin Interviews”, Oliver Stone realizou e/ou dirigiu, em ordem cronológica decrescente, “Snowden”, “Mi Amigo Hugo”, “The Untold History of the United States” (série), “Savages”, “Wall Street: Money Never Sleeps”, “South of the Border”, “W.”, “World Trade Center”, “Looking for Fidel”, “Alexander”, “Any Given Sunday”, “U Turn”, “Nixon”, “Natural Born Killers”, “Heaven & Earth”, “JFK”, “The Doors”, “Born on the Fourth of July”, “Talk Radio”, “Wall Street”, “Platoon”, “Salvador”, “The Hand”, “Madman of Martinique” (curta) e “Seizure”. 

Nascido em Nova York em 1946, Oliver Stone é também autor do livro “A História não Contada dos Estados Unidos”, em coautoria com Peter Kuznick, convertido no documentário de 10 episódios referido acima.

Nocaute e equipe agradecem do fundo do coração ao diretor Oliver Stone e aos produtores Maximilien Arvelaiz, David Tang, Rob Wilson e Fernando Sulichin pela generosa cessão dos direitos de exibição no Brasil da série “The Putin Interviews©”.

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Brasil tem 1.129 mortes e 57.837 casos de Covid-19 em 24 horas https://nocaute.blog.br/2020/07/30/brasil-tem-1-129-mortes-e-57-837-casos-de-covid-19-em-24-horas/ Thu, 30 Jul 2020 23:15:48 +0000 https://nocaute.blog.br/?p=69690 Boletim da evolução da pandemia de Coronavírus no Brasil e nos 25 países mais afetados. Atualizado todos os dias às 20hs, junto com os dados do dia anterior, para efeito comparativo.

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Boletim da evolução da pandemia de Coronavírus no Brasil e nos 25 países mais afetados. Atualizado todos os dias às 20hs, junto com os dados do dia anterior, para efeito comparativo.

Covid-19 no Brasil e no mundo – 30 Julho 2020

Visão diária dos principais indicadores da pandemia pelo mundo

Os três países com as maiores taxas de letalidade (relação entre casos confirmados e mortes) são Reino Unido com 15,2% (para cada 1.000 infectados, 152 vão a óbito), Itália (14,2%) e França (13,6%).

Nas últimas 24 horas, os três países com o maior número de novos casos são Estados Unidos (74.380 novos casos), Brasil (57.837) e Índia (50.359); os três países com as maiores taxas de crescimento percentual de casos em relação ao dia anterior são Argentina e Índia (ambos com 3,3%) e Colômbia (3,2%).

Nas últimas 24 horas, os três países com o maior número de mortes são Estados Unidos (1.584 mortes no dia), Brasil (1.129) e Índia (763); os três países com as maiores taxas de crescimento percentual de mortes em relação ao dia anterior são Colômbia (4,2%), Argentina (3,5%) e Índia (2,2%).

No acumulado da semana (últimos 7 dias), os três países com as maiores taxas de crescimento de casos confirmados são Índia (27,7%), Colômbia (26,4%) e Argentina (26,1%); os três países com as maiores taxas de crescimento de mortes são Colômbia (28,2%), Argentina (26,5%) e África do Sul (23%).

Os dados foram publicados pela Johns Hopkins University e Worldmeter.

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krianca_tira016 https://nocaute.blog.br/2020/07/30/krianca_tira016/ Thu, 30 Jul 2020 19:43:07 +0000 https://nocaute.blog.br/?p=69660 O post krianca_tira016 apareceu primeiro em Nocaute.

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Mais de mil padres apoiam a corajosa Carta ao Povo de Deus, subscrita por 152 bispos brasileiros https://nocaute.blog.br/2020/07/30/mais-de-mil-padres-apoiam-a-corajosa-carta-ao-povo-de-deus-subscrita-por-152-bispos-brasileiros/ Thu, 30 Jul 2020 18:42:28 +0000 https://nocaute.blog.br/?p=69651 Em ‘Carta ao Povo de Deus’, divulgada no último domingo (26), 152 bispos da Igreja Católica criticam a “incapacidade e inabilidade de Bolsonaro em enfrentar a crise”. No início da tarde desta quinta (30), 1.057 padres e diáconos lançaram um documento de apoio à Carta divulgada pelos bispos. “Enquanto os lucros de poucos crescem, os da maioria situam-se cada vez mais longe do bem-estar daquela minoria”, diz o documento. Clique aqui para ler a íntegra.

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Em ‘Carta ao Povo de Deus’, divulgada no último domingo (26), 152 bispos da Igreja Católica criticam a “incapacidade e inabilidade de Bolsonaro em enfrentar a crise”. No início da tarde desta quinta (30), 1.057 padres e diáconos lançaram um documento de apoio à Carta divulgada pelos bispos. “Enquanto os lucros de poucos crescem, os da maioria situam-se cada vez mais longe do bem-estar daquela minoria”, diz o documento.

“CAMINHAMOS NA ESTRADA DE JESUS”

CARTA DE PADRES EM APOIO E ADESÃO

AOS BISPOS SIGNATÁRIOS DA CARTA AO POVO DE DEUS

Enquanto os lucros de poucos crescem exponencialmente, os da maioria situam-se cada vez mais longe do bem-estar daquela minoria feliz. Tal desequilíbrio provém de ideologias que defendem a autonomia absoluta dos mercados e a especulação financeira. Às vezes, sentimos a tentação de ser cristãos, mantendo uma prudente distância das chagas do Senhor. Mas Jesus quer que toquemos a miséria humana, que toquemos a carne sofredora dos outros” (EG 56 e 270).

Nós, “Padres da Caminhada”, “Padres contra o Fascismo”, diáconos permanentes e tantos outros padres irmãos, empenhados em diversas partes do Brasil a serviço do Evangelho e do Reino de Deus, manifestamos nosso agradecimento e apoio aos bispos pela Carta ao Povo de Deus. Afirmamos que ela representa nossos pensamentos e sentimentos. Consideramos um documento profético de uma parcela significativa dos Bispos da Igreja Católica no Brasil, “em profunda comunhão com o Papa Francisco e seu magistério e em comunhão plena com a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil”, oferecendo ao Povo de Deus luzes para o discernimento dos sinais nestes tempos tão difíceis da história do nosso País.

O documento é uma leitura lúcida e corajosa da realidade atual à luz da fé. É a confirmação da missão e do desafio permanente para a Igreja: tornar o Reino de Deus presente no mundo, anunciando esperança e denunciando tudo o que está destruindo a esperança de uma vida melhor para o povo. É como uma grande tempestade que se abate sobre o nosso País. Os bispos alertam para o perigo de que “a causa dessa tempestade é a combinação de uma crise de saúde sem precedentes, com um avassalador colapso da economia e com a tensão que se abate sobre os fundamentos da República”, principalmente impulsionado pelo Presidente.

Sentimo-nos também interpelados por essa realidade a darmos nossa palavra de presbíteros comprometidos no seguimento de Nosso Senhor Jesus Cristo. O Evangelho ilumina nossa caminhada e vamos aprofundando nosso compromisso na Igreja, sinal e instrumento do Reino, a serviço da vida e da esperança. Cada vez mais vemos a vida do povo sendo ameaçada e seus sofrimentos, principalmente dos pobres, vulneráveis e minorias. Tal realidade faz com que nossos corações ardam, nossos braços lutem e nossa voz grite pelas mudanças necessárias. Como recordam os Bispos, nós não somos motivados por “interesses político-partidários, econômicos, ideológicos ou de qualquer outra natureza. Nosso único interesse é o Reino de Deus”.

Os bispos muito bem expressaram em sua carta, recordando o Santo Padre, o Papa Francisco, que “a proposta do Evangelho não consiste só numa relação pessoal com Deus. A nossa reposta de amor não deveria ser entendida como uma mera soma de pequenos gestos pessoais a favor de alguns indivíduos necessitados […], uma série de ações destinadas apenas a tranquilizar a própria consciência. A proposta é o Reino de Deus […] (Lc 4,43 e Mt 6,33) (EG. 180)”.

Sabemos que os que nos governam têm o dever de agir em favor de toda a população, de maneira especial, os mais pobres. Não tem sido esse o projeto do atual Governo, que “não coloca no centro a pessoa humana e o bem de todos, mas a defesa intransigente dos interesses de uma “economia que mata” (Alegria do Evangelho, 53), centrada no mercado e no lucro a qualquer preço”. Por isso, também estamos profundamente indignados com ações do Presidente da República em desfavor e com desdém para com a vida de seres humanos e também com a da “nossa irmã, a Mãe Terra”, e tantas ações que vão contra a vida do povo e a soberania do Brasil.

É urgente a reconstrução das relações sociais, pois “este cenário de perigosos impasses, que colocam nosso País à prova, exige de suas instituições, líderes e organizações civis muito mais diálogo do que discursos ideológicos fechados. […] Essa realidade não comporta indiferença.”. A CNBB tem se pronunciado de forma contundente em momentos recentes; em posicionamento do dia 30 de abril, manifestou perplexidade e indignação com descaso no combate ao novo coronavírus e por eventos atentatórios à ordem constitucional. Em outro momento, os 67 bispos da Amazônia publicaram outro documento, expressando imensa preocupação e exigindo maior atenção e cuidado do poder público em relação à Amazônia e aos povos originários. Na carta aberta ao Congresso Nacional do dia 13 de julho de 2020 a CNBB denunciou os 16 vetos do Presidente da República ao Plano Emergencial para Enfrentamento à Covid-19 nos Territórios Indígenas, comunidades quilombolas e demais povos e comunidades tradicionais (PL nº PL 1142/2020, agora Lei nº 14.021) dizendo: “Esses vetos são eticamente injustificáveis e desumanos pois negam direitos e garantias fundamentais à vida dos povos tradicionais”. Outras Comissões da CNBB assumiram decididamente o lado dos povos tradicionais do Brasil “duplamente vulneráveis: ao contágio do coronavírus e à constante ameaça de expulsão de seus territórios”.

Nesse tempo de “tempestade perfeita”, a voz do Espírito ressoa em posicionamentos corajosos da Igreja, que renova a cada dia seu compromisso “na construção de uma sociedade estruturalmente justa, fraterna e solidária”, como indicam os bispos em sua carta.

Reafirmamos nosso compromisso na defesa e no cuidado com a vida. Ao convite dos bispos queremos dar nosso sim! “Somos convocados a apresentar propostas e pactos objetivos, com vistas à superação dos grandes desafios, em favor da vida, principalmente dos segmentos mais vulneráveis e excluídos, nesta sociedade estruturalmente desigual, injusta e violenta.” Queremos nos empenhar para cuidar deste País enfermo!

Nós nos solidarizamos com todas as famílias que perderam alguém por essa doença que ceifa vidas e aterroriza a todos. Próximos de atingir 100 mil mortos nesta pandemia, é inadmissível que não haja neste governo um Ministro da Saúde, que possa conduzir as políticas de combate ao novo coronavírus.

Conclamamos todos os cristãos e cristãs, as igrejas e comunidades, e todas as pessoas de boa vontade para que renovem, junto com os bispos, a opção pelo Evangelho e pela promoção da vida, espalhando as sementes do Reino de Deus.

Nós, “Padres da Caminhada”, “Padres contra o Fascismo”, diáconos permanentes e tantos outros padres irmãos, reafirmamos com alegria, ânimo e esperança a fidelidade à missão a nós confiada e apoiamos os bispos signatários da Carta ao Povo de Deus e em sintonia com a CNBB em sua missão de testemunhar e fortalecer a colegialidade.

29 de julho de 2020

Festa de Santa Marta

Leia abaixo a íntegra do documento publicado pelos bispos.

“Carta ao Povo de Deus”

“Somos bispos da Igreja Católica, de várias regiões do Brasil, em profunda comunhão com o Papa Francisco e seu magistério e em comunhão plena com a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, que no exercício de sua missão evangelizadora, sempre se coloca na defesa dos pequeninos, da justiça e da paz. Escrevemos esta Carta ao Povo de Deus, interpelados pela gravidade do momento em que vivemos, sensíveis ao Evangelho e à Doutrina Social da Igreja, como um serviço a todos os que desejam ver superada esta fase de tantas incertezas e tanto sofrimento do povo.

Evangelizar é a missão própria da Igreja, herdada de Jesus. Ela tem consciência de que “evangelizar é tornar o Reino de Deus presente no mundo” (Alegria do Evangelho, 176). Temos clareza de que “a proposta do Evangelho não consiste só numa relação pessoal com Deus. A nossa reposta de amor não deveria ser entendida como uma mera soma de pequenos gestos pessoais a favor de alguns indivíduos necessitados […], uma série de ações destinadas apenas a tranquilizar a própria consciência. A proposta é o Reino de Deus […] (Lc 4,43 e Mt 6,33)” (Alegria do Evangelho, 180). Nasce daí a compreensão de que o Reino de Deus é dom, compromisso e meta.

É neste horizonte que nos posicionamos frente à realidade atual do Brasil. Não temos interesses político-partidários, econômicos, ideológicos ou de qualquer outra natureza. Nosso único interesse é o Reino de Deus, presente em nossa história, na medida em que avançamos na construção de uma sociedade estruturalmente justa, fraterna e solidária, como uma civilização do amor.

O Brasil atravessa um dos períodos mais difíceis de sua história, comparado a uma “tempestade perfeita” que, dolorosamente, precisa ser atravessada. A causa dessa tempestade é a combinação de uma crise de saúde sem precedentes, com um avassalador colapso da economia e com a tensão que se abate sobre os fundamentos da República, provocada em grande medida pelo Presidente da República e outros setores da sociedade, resultando numa profunda crise política e de governança.

Este cenário de perigosos impasses, que colocam nosso País à prova, exige de suas instituições, líderes e organizações civis muito mais diálogo do que discursos ideológicos fechados. Somos convocados a apresentar propostas e pactos objetivos, com vistas à superação dos grandes desafios, em favor da vida, principalmente dos segmentos mais vulneráveis e excluídos, nesta sociedade estruturalmente desigual, injusta e violenta. Essa realidade não comporta indiferença.

É dever de quem se coloca na defesa da vida posicionar-se, claramente, em relação a esse cenário. As escolhas políticas que nos trouxeram até aqui e a narrativa que propõe a complacência frente aos desmandos do Governo Federal, não justificam a inércia e a omissão no combate às mazelas que se abateram sobre o povo brasileiro. Mazelas que se abatem também sobre a Casa Comum, ameaçada constantemente pela ação inescrupulosa de madeireiros, garimpeiros, mineradores, latifundiários e outros defensores de um desenvolvimento que despreza os direitos humanos e os da mãe terra. “Não podemos pretender ser saudáveis num mundo que está doente. As feridas causadas à nossa mãe terra sangram também a nós” (Papa Francisco, Carta ao Presidente da Colômbia por ocasião do Dia Mundial do Meio Ambiente, 05/06/2020).

Todos, pessoas e instituições, seremos julgados pelas ações ou omissões neste momento tão grave e desafiador. Assistimos, sistematicamente, a discursos anticientíficos, que tentam naturalizar ou normalizar o flagelo dos milhares de mortes pela COVID-19, tratando-o como fruto do acaso ou do castigo divino, o caos socioeconômico que se avizinha, com o desemprego e a carestia que são projetados para os próximos meses, e os conchavos políticos que visam à manutenção do poder a qualquer preço. Esse discurso não se baseia nos princípios éticos e morais, tampouco suporta ser confrontado com a Tradição e a Doutrina Social da Igreja, no seguimento Àquele que veio “para que todos tenham vida e a tenham em abundância” (Jo 10,10).

Analisando o cenário político, sem paixões, percebemos claramente a incapacidade e inabilidade do Governo Federal em enfrentar essas crises. As reformas trabalhista e previdenciária, tidas como para melhorarem a vida dos mais pobres, mostraram-se como armadilhas que precarizaram ainda mais a vida do povo. É verdade que o Brasil necessita de medidas e reformas sérias, mas não como as que foram feitas, cujos resultados pioraram a vida dos pobres, desprotegeram vulneráveis, liberaram o uso de agrotóxicos antes proibidos, afrouxaram o controle de desmatamentos e, por isso, não favoreceram o bem comum e a paz social. É insustentável uma economia que insiste no neoliberalismo, que privilegia o monopólio de pequenos grupos poderosos em detrimento da grande maioria da população.

O sistema do atual governo não coloca no centro a pessoa humana e o bem de todos, mas a defesa intransigente dos interesses de uma “economia que mata” (Alegria do Evangelho, 53), centrada no mercado e no lucro a qualquer preço. Convivemos, assim, com a incapacidade e a incompetência do Governo Federal, para coordenar suas ações, agravadas pelo fato de ele se colocar contra a ciência, contra estados e municípios, contra poderes da República; por se aproximar do totalitarismo e utilizar de expedientes condenáveis, como o apoio e o estímulo a atos contra a democracia, a flexibilização das leis de trânsito e do uso de armas de fogo pela população, e das leis do trânsito e o recurso à prática de suspeitas ações de comunicação, como as notícias falsas, que mobilizam uma massa de seguidores radicais.

O desprezo pela educação, cultura, saúde e pela diplomacia também nos estarrece. Esse desprezo é visível nas demonstrações de raiva pela educação pública; no apelo a ideias obscurantistas; na escolha da educação como inimiga; nos sucessivos e grosseiros erros na escolha dos ministros da educação e do meio ambiente e do secretário da cultura; no desconhecimento e depreciação de processos pedagógicos e de importantes pensadores do Brasil; na repugnância pela consciência crítica e pela liberdade de pensamento e de imprensa; na desqualificação das relações diplomáticas com vários países; na indiferença pelo fato de o Brasil ocupar um dos primeiros lugares em número de infectados e mortos pela pandemia sem, sequer, ter um ministro titular no Ministério da Saúde; na desnecessária tensão com os outros entes da República na coordenação do enfrentamento da pandemia; na falta de sensibilidade para com os familiares dos mortos pelo novo coronavírus e pelos profissionais da saúde, que estão adoecendo nos esforços para salvar vidas.

No plano econômico, o ministro da economia desdenha dos pequenos empresários, responsáveis pela maioria dos empregos no País, privilegiando apenas grandes grupos econômicos, concentradores de renda e os grupos financeiros que nada produzem. A recessão que nos assombra pode fazer o número de desempregados ultrapassar 20 milhões de brasileiros. Há uma brutal descontinuidade da destinação de recursos para as políticas públicas no campo da alimentação, educação, moradia e geração de renda.

Fechando os olhos aos apelos de entidades nacionais e internacionais, o Governo Federal demonstra omissão, apatia e rechaço pelos mais pobres e vulneráveis da sociedade, quais sejam: as comunidades indígenas, quilombolas, ribeirinhas, as populações das periferias urbanas, dos cortiços e o povo que vive nas ruas, aos milhares, em todo o Brasil. Estes são os mais atingidos pela pandemia do novo coronavírus e, lamentavelmente, não vislumbram medida efetiva que os levem a ter esperança de superar as crises sanitária e econômica que lhes são impostas de forma cruel. O Presidente da República, há poucos dias, no Plano Emergencial para Enfrentamento à COVID-19, aprovado no legislativo federal, sob o argumento de não haver previsão orçamentária, dentre outros pontos, vetou o acesso a água potável, material de higiene, oferta de leitos hospitalares e de terapia intensiva, ventiladores e máquinas de oxigenação sanguínea, nos territórios indígenas, quilombolas e de comunidades tradicionais (Cf. Presidência da CNBB, Carta Aberta ao Congresso Nacional, 13/07/2020).

Até a religião é utilizada para manipular sentimentos e crenças, provocar divisões, difundir o ódio, criar tensões entre igrejas e seus líderes. Ressalte-se o quanto é perniciosa toda associação entre religião e poder no Estado laico, especialmente a associação entre grupos religiosos fundamentalistas e a manutenção do poder autoritário. Como não ficarmos indignados diante do uso do nome de Deus e de sua Santa Palavra, misturados a falas e posturas preconceituosas, que incitam ao ódio, ao invés de pregar o amor, para legitimar práticas que não condizem com o Reino de Deus e sua justiça?

O momento é de unidade no respeito à pluralidade! Por isso, propomos um amplo diálogo nacional que envolva humanistas, os comprometidos com a democracia, movimentos sociais, homens e mulheres de boa vontade, para que seja restabelecido o respeito à Constituição Federal e ao Estado Democrático de Direito, com ética na política, com transparência das informações e dos gastos públicos, com uma economia que vise ao bem comum, com justiça socioambiental, com “terra, teto e trabalho”, com alegria e proteção da família, com educação e saúde integrais e de qualidade para todos. Estamos comprometidos com o recente “Pacto pela vida e pelo Brasil”, da CNBB e entidades da sociedade civil brasileira, e em sintonia com o Papa Francisco, que convoca a humanidade para pensar um novo “Pacto Educativo Global” e a nova “Economia de Francisco e Clara”, bem como, unimo-nos aos movimentos eclesiais e populares que buscam novas e urgentes alternativas para o Brasil.

Neste tempo da pandemia que nos obriga ao distanciamento social e nos ensina um “novo normal”, estamos redescobrindo nossas casas e famílias como nossa Igreja doméstica, um espaço do encontro com Deus e com os irmãos e irmãs. É sobretudo nesse ambiente que deve brilhar a luz do Evangelho que nos faz compreender que este tempo não é para a indiferença, para egoísmos, para divisões nem para o esquecimento (cf. Papa Francisco, Mensagem Urbi et Orbi, 12/4/20).

Despertemo-nos, portanto, do sono que nos imobiliza e nos faz meros espectadores da realidade de milhares de mortes e da violência que nos assolam. Com o apóstolo São Paulo, alertamos que “a noite vai avançada e o dia se aproxima; rejeitemos as obras das trevas e vistamos a armadura da luz” (Rm 13,12).

 O Senhor vos abençoe e vos guarde. Ele vos mostre a sua face e se compadeça de vós.
O Senhor volte para vós o seu olhar e vos dê a sua paz! 
(Nm 6,24-26).

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