Brasil

As lições da greve dos entregadores de aplicativos

Quando o ódio, a violência e a morte nos rondam, incensados pelo governo genocida de Bolsonaro, tolerado e apoiado pelos que se dizem democratas e civilizados, ouvir e ver entregadores como o Galo e outros pensando alto, expressando seus sonhos e lutando nas ruas de nosso imenso Brasil é a certeza que há, sim, esperança.

Uma semana dura de engolir a que passou. As imagens dizem tudo. Jair Bolsonaro às gargalhadas na Embaixada dos Estados Unidos comemorando o 4 de julho, acompanhado dos generais Braga Neto, Azeredo e Ramos, abraçado ao seu ministro das Relações Exteriores, símbolos do caráter militar e entreguista do governo, um escárnio para o país e o nosso povo. Outra foto registra, no mesmo dia, a triste e dolorosa manifestação de parentes das vitimas da Covid 19. 

Também simbólica, um retrato atual do nosso Brasil de hoje, é a foto de tratores destruindo uma horta comunitária do MST no Paraná, destinada à doação de alimentos para famílias vítimas da pandemia. No mesmo dia em que suas plantações foram reduzidas a pó,  a horta comunitária doara 1.500 quilos de alimentos. Desde o início da pandemia, os acampamentos e assentamentos do MST somente no Paraná já distribuíram 246 toneladas de alimentos, 6.400 marmitas e 600 máscaras; em todo país, o MST está ativo na solidariedade. 

Quem ordenou a destruição foi a Usina Sabarálcool, devedora de créditos trabalhistas e, acionada na Justiça, já deveria ter perdido essas terras para ressarcir os credores, todos trabalhadores, conforme determinação do Ministério Publico ao Incra, segundo relata o jornalista Ricardo Kotscho. Ele lembra decisão do Tribunal de Justiça suspendendo despejos e ações de reintegração de posse na pandemia. 

 A política genocida do governo, amparada pela pressão empresarial, aos poucos desmonta o isolamento horizontal com trágicas consequências: os pobres e os mais jovens são os mais atingidos. Sem uma vacina e  – o mais grave – sem investir em seu desenvolvimento na ilusão de que quando a vacina se tornar uma realidade o Brasil será atendido ou priorizado pelo aliado estadunidense, Bolsonaro e os militares conduzem nosso povo para uma tragédia sob os olhares complacentes e iludidos das elites ditas liberais e cultas, que num comportamento histórico optam pela conciliação com o governo em nome da bolsa, literalmente da bufunfa, de seus interesses de classe. Numa sinalização clara de que falam mais alto as ditas reformas (ou seja a conta para o povo pagar) e o acordo para evitar uma vitória da esquerda com o fim de mais um fracassado governo de direita no Brasil, como os de Jânio, Collor e FHC, agora ressuscitado pela nosso partido da mídia.

A voz dos entregadores de aplicativos

Mas há uma luz de esperança. No Brasil, há memória, legado, a realidade se impõe e o povo se dá conta e reage, seja nas ruas, seja nas urnas. Desta vez quem tomou as ruas foram os entregadores de plataformas de aplicativos, justamente os trabalhadores mais explorados, que enfrentam o trânsito das grandes cidades em suas motos e bicicletas sem proteção, sem contrato de trabalho, sem garantias. Eles pararam em defesa de seus direitos mínimos, de melhores condições de trabalho, se reconhecendo como trabalhadores e não como colaboradores ou empreendedores individuais, neologismos inventados pelos neoliberais para justificar a precarização e exploração da mão de obra. 

Cunharam um bordão que diz tudo: você entrega o seu trabalho? Então somos todos entregadores… Nada mais forte e simbólico. Um movimento horizontal, sem hierarquia, sem líderes. Líderes existem, mas não são expostos para evitar a retaliação dos “empregadores” que não assinam carteira, mas, mesmo assim, botam na rua quem não segue o figurino. 

Escolados pela experiência de 2013, os entregadores de apps deixam claro que são anti- fascistas, anti-racistas e anti-machistas. Defendem a democracia. Querem crescer devagar e na diferença, dialogar com todos, principalmente com os que votaram em Bolsonaro. Querem entender o seu ponto de vista e conquistá-los para a causa democrática. Era possível ver, entre os manifestantes, alguns com adesivos pró-Bolsonaro.

Operários do novo normal
por: Denis Gonsales

A luta imediata, diz Paulo Lima, o Galo, um dos líderes do movimento, é pela melhoria da remuneração, pelo fim dos bloqueios, pela indenização em caso de acidentes e por covid 19. Lutam por unir os trabalhadores (os que entregam a força de trabalho, como dizem), querem avanços na CLT e não apenas seu resgate, estão conscientes de que o que conta são as ruas.  As redes e os apps de mensagens instantâneas, como o WhatsApp, são ferramentas para mobilizar para as ruas. Uma bela lição para todos nós.

Quando o ódio, a violência e a morte nos rondam incensados pelo governo genocida de Bolsonaro, tolerado e apoiado pelos que se dizem democratas e civilizados, ouvir e ver entregadores como o Galo e outros pensando alto, expressando seus sonhos e lutando nas ruas de nosso imenso Brasil é a certeza que há, sim, esperança. 

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