Brasil

Valter Pomar: por que atacam Gleisi Hoffmann?

Em artigo publicado hoje, o historiador e professor Valter Pomar, dirigente nacional do PT, tenta entender por que razão a presidente do partido, deputada Gleisi Hoffmann, vem sendo objeto de intrigas na imprensa. O que o texto também deixa no ar é outra pergunta: que partido o PT quer ser depois da prisão de Lula e das eleições de 2018?

Não votei em Gleisi Hoffmann. Não integramos a mesma tendência. Por diversas vezes dissenti de posições adotadas por ela. Ademais, Gleisi não é minha futura candidata à presidência nacional do Partido. Portanto, estou totalmente à vontade para protestar contra o ataque de que ela foi vítima hoje, particularmente em matérias publicadas pelos jornais Valor e O Globo.

Gleisi Hoffmann é presidenta nacional do Partido dos Trabalhadores. Tem desempenhado um papel extremamente importante na oposição ao governo Bolsonaro e na luta pela liberdade de Lula. Por este motivo, é alvo constante dos ataques da extrema-direita e da grande mídia. Entretanto, os ataques divulgados nesta quarta-feira de cinzas têm outra origem.

As matérias (algumas das quais reproduzidas ao final deste texto) sustentam-se fartamente em declarações anônimas: “O GLOBO ouviu críticas a Gleisi de cinco parlamentares ou integrantes da direção do PT que integram a CNB. Nenhum deles, porém, aceitou falar publicamente sobre o tema, numa demonstração do receio de contrariar Lula”.

Se for verdade, a conclusão é que tem gente que acha razoável usar a grande imprensa para fazer luta interna, acha aceitável falar de público coisas que não fala internamente, mas tem medo de colocar sua assinatura nas críticas, não por causa dos danos causados ao Partido, mas por causa “do receio de contrariar Lula”.

Como jabuti não sobe em árvore, a publicação destas matérias revela que alguns “dirigentes” resolveram deflagrar uma campanha pública para desestabilizar a presidenta nacional do PT.

Como ainda não foi marcada a data para a eleição da nova direção, nem do congresso partidário, esta campanha terá como efeito prático enfraquecer a presidência do Partido, exatamente no momento em que o governo Bolsonaro quer aprovar a reforma da previdência.

Na prática, quem se beneficiaria disto?

Detalhe importante: matérias publicadas hoje dão conta, também, de que estaria em curso uma operação para mudar a tática do PT na luta contra a reforma da previdência. A tática hoje é derrotar a reforma. A tática proposta seria, segundo a imprensa, defender a “nossa” reforma, contra a reforma deles.

O efeito prático disto será confundir a classe trabalhadora.

Esta dupla operação confirma que há uma nova “estratégia” sendo construída, “estratégia” que só faria sentido para quem acha que o governo Bolsonaro estaria desmanchando, havendo espaço para uma saída de curto prazo, uma espécie de governo de “união nacional contra o sanatório geral”, desde que o PT estivesse disposto a “baixar o tom”.

Neste cenário, Haddad cumpriria um papel essencial, mas desde que se dissociasse de certos excessos programáticos e retóricos que alguns atribuem à Gleisi Hoffmann.

Entre estes excessos, na opinião dos tais “dirigentes”, estaria a posição firme de apoio da presidenta nacional do PT à Venezuela. Posição que eles sabem ser a do PT e a de Lula. E sabem que é a única posição possível para um partido que realmente defenda a democracia e a soberania nacional, não da boca para fora, não como uma abstração acadêmica. Mas esta posição de defesa da Venezuela é radical demais para quem deseja converter o PT num partido socialdemocrata, com mais aliados europeus e com menos aliados latino-americanos.

É neste contexto, de pretendida domesticação do PT, que ganharia “sentido” a proposta de fazer de Haddad o novo presidente nacional do PT. Mas como o próprio já deixou claro que esta não é a sua praia, o jeito seria eleger um “presidente-chefe-de-Estado” e um “secretário-geral-chefe-de-governo”. E assim estaria resolvido o dilema de alguns setores que não acham um nome ideal para substituir Gleisi, mas teriam vários nomes para ocupar a tal secretaria-geral.

Neste ponto da narrativa chegamos àquilo que os antigos chamavam de “pedra de toque”: para alguns “dirigentes”, toda esta movimentação tem um único objetivo, que é o de manter a direção nacional do PT controlada por um determinado grupo. O resto todo é “conta de chegar”, argumentos de ocasião e artimanhas que visam atingir o objetivo citado.

A conta de chegar parte de pressupostos falsos, conduz à políticas erradas e inclui atacar covardemente a presidenta nacional do PT, não por seus defeitos, mas por suas qualidades.

Todos nós, do Lula até o mais anônimo filiado, estamos sujeitos a errar e a receber críticas, inclusive duríssimas, inclusive de público. E sempre há o risco destas críticas, inadvertidamente, enfraquecerem ou confundirem a ação do Partido. Até por isto é importante que cada um coloque seu CPF no que fala e faz.

Quem se oculta no anominato de uma declaração “em off”, quem não assume publicamente a autoria do que fala e pensa, sabe que está agindo contra os interesses do Partido, está colocando os interesses do seu grupo acima dos interesses do Partido, está agindo não mais como tendência, mas como “partido dentro do Partido”.

Gleisi Hoffmann está certa ao demarcar com estes “supostos personagens que se movem nas sombras e se escondem no anonimato”. Cabe aos filiados julgar se “personagens” assim merecem estar na direção nacional de nosso Partido.”

Notícias relacionadas