Reportagem da Folha de S. Paulo mostra que em 1978, Henrique Araújo, então procurador-geral da República, negou pedidos de 3 países que buscavam julgar Gustav Wagner, foragido no Brasil. Wagner, era conhecido como “besta humana” e um dos nazistas mais temidos no campo de concentração de Sobibor. Henrique Araújo, também foi responsável por pareceres que indicavam a censura de livros, jornais e peças de teatro. O censurado mais famoso é Chico Buarque. A peça “Calabar, o Elogio da Traição”, foi vetada em 1974.
Em reportagem, nesta quarta-feira, na Folha de S. Paulo a repórter Paula Sperb revela que em 1978, Henrique Fonseca de Araújo, pai do atual chanceler, Ernesto Araújo, foi nomeado procurador-geral da República durante o regime militar. O então procurador-geral dificultou a extradição de um nazista responsabilizado por 250 mil mortes entre 1942 e 1943.
Escolhido para o cargo pelo presidente Ernesto Geisel, ele deu pareceres negativos à extradição de Gustav Franz Wagner.
Segundo o depoimento de uma sobrevivente, Esther Raab, Wagner era conhecido como “besta humana”. Ele era um dos nazistas mais temidos de Sobibor.
Após a Segunda Guerra (1939-1945), Wagner fugiu. Foi descoberto no Brasil em 1978 pelo célebre caçador de nazistas Simon Wiesenthal, que contou com a ajuda do jornalista Mario Chimanovitch.
O caso de Wagner no Brasil ganhou as páginas dos jornais internacionais e virou assunto nas embaixadas.
Segundo informa reportagem da Folha de S. Paulo, diversos países pediram ao Brasil a extradição do nazista. O pai de Ernesto Araújo analisou quatro pedidos: da Polônia, onde estava o campo de Sobibor; da Áustria, país natal de Wagner; da Alemanha, berço do nazismo; e de Israel, Estado do povo judeu, as principais vítimas do Holocausto.
No parecer de outubro de 1978, Henrique Araújo disse que Israel “não tinha competência” para pedir a extradição de Wagner porque “não era um Estado” na época dos crimes —Israel foi criado em 1948.
Ele também recomendou indeferir a extradição para Áustria e Polônia porque a lei brasileira entendia que os crimes de Wagner estavam prescritos.
Quanto ao pedido da Alemanha, local para onde o nazista havia declarado preferir ser extraditado, Araújo afirmou que, “em tese”, a prescrição dos crimes havia sido interrompida devido a uma condenação de Wagner em 1967 na Alemanha.
Em junho de 1979, o STF indeferiu por maioria os pedidos de extradição, entendendo que os crimes de Wagner haviam prescrito.
Entre os votos contrários à extradição, estava o do ministro Carlos Thompson Flores, avô do atual presidente do Tribunal Regional da 4ª Região (TRF-4), Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz.
Ainda segundo a reportagem da Folha, um sobrevivente do campo de Sobibor que morava no Brasil, Stanislaw Szmajzner reconheceu Wagner no jornal e foi até São Paulo, onde o nazista estava preso, prestar depoimento no Dops.
“O encontro entre os dois foi registrado pela Folha. Em 1º de junho de 1978, o jornal estampava a fotografia daquele momento na primeira página, acompanhada da reprodução do diálogo entre eles.”
Szmajzner perguntou se Wagner se lembrava dele, o que foi confirmado. “Eu salvei sua vida. Eu separei você para trabalhar na oficina de joias. Você era ourives, apesar da pouca idade. Eu salvei você porque separei você”, disse o nazista.
“Você não salvou a minha vida coisa nenhuma. Você me separou porque estava faltando ourives na oficina. Meus pais não eram ourives, e você mandou meus pais para a câmara de gás”, respondeu o sobrevivente.
Depois de provocado a admitir seus atos, Wagner ainda ameaçou Szmajzner: “Você ainda vai me pagar por tudo isso. Eu mandei em Sobibor, sim, você sabe disso, e mandei muito. Mas o que é que você está pensando, que tudo acabou, que estou acabado? Eu tenho pena de você. Minha vida acabou, está bem, e a sua? A sua vida não acabou, você vai viver muito tempo e, por isso, vai dar tempo de você pagar o que está me fazendo”.
Gustav Wagner morreu em Atibaia, em 1980, com uma facada no coração. O laudo médico não confirmou se a morte foi decorrência de suicídio ou homicídio.
Censura durante a Ditadura Militar
O pai do atual chanceler também foi responsável por pareceres que indicavam censura de livros, jornais e peças de teatro. O censurado mais famoso foi Chico Buarque.
A montagem de uma peça de sua autoria, “Calabar, o Elogio da Traição”, foi vetada em 1974. No parecer, o então subprocurador-geral da República chamou a censura de necessidade de “autorização”. Chico tentou recorrer, mas não teve sucesso.
Em 1977, quando já era procurador-geral, Henrique Araújo se envolveu em outro caso de censura, e sugeriu a apreensão de um livro do escritor gaúcho Josué Guimarães.
A “apreensão após impressão”, mas “antes de seu lançamento”, evitaria que o ato fosse chamado de “censura prévia”. Segundo Araújo, a obra apresentava um homem como “impotente”, “traído pela esposa” e, “o que é muito mais grave, descrevendo minuciosamente (…) as relações sexuais praticadas, uma das quais consistente em ato de sodomia”.
Mas não só as artes eram alvo de fiscalização. Em 1978, o cardeal dom Paulo Evaristo Arns queria o fim da censura prévia ao jornal católico O São Paulo. No seu parecer, Araújo justificava que a censura não era uma questão do Judiciário, mas do Poder Executivo.
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