Brasil

Um juiz de exceção: ao invés de aderir, critica o namoro da mídia com o Judiciário


“O Ministério Público e a polícia usam a imprensa com o intuito claro de criar pano de fundo favorável à acusação em processos e para defender projetos de lei absurdamente imorais, aproveitando-se da sanha acusatória que toma conta do país.
“Com isso, qualquer um que discorde dos órgãos de acusação é taxado como inimigo, cúmplice de bandido e favorável à corrupção.”
Esse comentário não é de nenhum político da oposição, nem de jornalista lulopetralha-comuno-bolivariano, como pode supor um desses filhotes de Hitler que bolsonazem por aí.
É de um ministro da segunda corte judicial do país, o Superior Tribunal de Justiça.
Em palestra recente em Brasília, noticiada pelo Consultor Jurídico e outros sites da área do direito, o ministro Sebastião Reis disse que há um silêncio “assustador” de órgãos como a OAB, que deveriam protestar contra a atuação abusiva do MP, mas se calam.
Pior que isso, lamenta o juiz, muitas vezes eles aplaudem e incentivam esse tipo de procedimento.
Segundo o ministro Reis, a omissão das instituições levou o Brasil a uma situação absurda, em que as pessoas precisam ter coragem para defender o que acham justo.
Com o uso indevido da mídia, a presunção de inocência acabou. “Quem é exposto na imprensa, independente se de maneira justa ou injusta, do dia para noite está condenado”, diz Reis.
A precisa avaliação do ministro serve para nos lembrar que ainda existe gente progressista no sistema judicial brasileiro e que, embora seja uma ínfima minoria, ela tem a coragem de desafinar o coro dos contentes.
Mas isso, infelizmente, é de pouca serventia.
Porque a maioria dos juízes, quando não consente em silêncio, revela-se cada vez mais afinada com a regressão reacionária em curso.
Censura exposições de “arte degenerada”, como faziam os nazistas. Autoriza o charlatanismo da cura gay. Livra pais que espancam os filhos. Pratica todas as delícias do receituário medieval.
Pois é com essa visão do direito e da justiça que a imprensa se aliou. Essa é a sua turma agora. A gente que ela promove, para regenerar os costumes do país.  Ou que ela coage.
Para o ministro Sebastião Reis, há situações em que o juiz se vê obrigado a “ser parceiro da imprensa”, para ter apoio e não ser objeto de critica.
É quando o magistrado começa a decidir “de acordo com o que o povo quer ouvir, o que a imprensa quer ouvir (…), mesmo que não seja o que está imposto na lei, não reflita o que está no processo”.
Aqui sim, nessa avaliação honesta, temos um jato bem lavado, encerado e polido.
Bem diferente do outro, que voa acima do bem, do mal e da lei, sobre o estado de exceção que ele ajuda a instituir.
Não haverá filme de quinze milhões de reais para glorificar o ministro Reis, nem tapete vermelho para recebê-lo na estreia.
Mas já são dele o Oscar, a Palma de Ouro e o Kikito de cinema-verdade, neste país e nesta época tão devotados ao que é falso.
 

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