The Intercept Brasil – Nocaute https://controle.nocaute.blog.br Blog do escritor e jornalista Fernando Morais Mon, 21 Oct 2019 14:56:12 -0300 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=5.3 https://nocaute.blog.br/wp-content/uploads/2018/06/nocaute-icone.png The Intercept Brasil – Nocaute https://controle.nocaute.blog.br 32 32 NJN: Mais um Jornal Nacional sem as revelações do Intercept https://nocaute.blog.br/2019/10/21/mais-um-jornal-nacional-sem-as-revelacoes-do-intercept/ Mon, 21 Oct 2019 14:55:53 +0000 https://nocaute.blog.br/?p=55998 Nesta edição, o jornalista Chico Malfitani comenta a volta do sarampo no Brasil, o barraco que está acontecendo no laranjal do PSL, a posição do ex-presidente Lula a respeito da prisão domiciliar proposta pelo Ministério Público Federal e outros dois assuntos que não apareceram na pauta do telejornal, o novo vazamento do Intercept, divulgado pelo El País, e a primeira carta pública dos governadores do nordeste criticando o desgoverno Bolsonaro.

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Nesta edição, o jornalista Chico Malfitani comenta a volta do sarampo no Brasil, o barraco que está acontecendo no laranjal do PSL, a posição do ex-presidente Lula a respeito da prisão domiciliar proposta pelo Ministério Público Federal e outros dois assuntos que não apareceram na pauta do telejornal, o novo vazamento do Intercept, divulgado pelo El País, e a primeira carta pública dos governadores do nordeste criticando o desgoverno Bolsonaro.

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NJN: Globo e manipulação, tudo a ver https://nocaute.blog.br/2019/10/15/globo-e-manipulacao/ Tue, 15 Oct 2019 15:22:24 +0000 https://nocaute.blog.br/?p=55745 O Nocaute no Jornal Nacional, com Chico Malfitani, começa a semana mostrando que o JN escondeu uma manifestação na Avenida Paulista, não mostrou que o povo nas ruas venceu o governo neoliberal no Equador, que silenciou-se diante de mais um vazamento da Intercept, que manipulou a informação sobre a votação da 2ª instancia no STF e foi dar voz a Shell, aquela dos barris de óleo nas praias de Sergipe.

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O Nocaute no Jornal Nacional, com Chico Malfitani, começa a semana mostrando que o JN escondeu uma manifestação na Avenida Paulista, não mostrou que o povo nas ruas venceu o governo neoliberal no Equador, que silenciou-se diante de mais um vazamento da Intercept, que manipulou a informação sobre a votação da 2ª instancia no STF e foi dar voz a Shell, aquela dos barris de óleo nas praias de Sergipe.

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The Intercept: Lava Jato usou sítio de Atibaia para tirar o foco da crise Temer-Janot e proteger colegas https://nocaute.blog.br/2019/10/14/lava-jato-atibaia-crise-temer-janot/ Mon, 14 Oct 2019 14:31:39 +0000 https://nocaute.blog.br/?p=55674 Novos vazamentos obtidos pelo site The Intercept e divulgados na manhã desta segunda-feira (14), mostram um emaranhado de conversas do tipo: "Vamos criar distração", "Anunciaram batom na cueca com relação ao Temer, e não tem", "Quem sabe não seja a hora de soltar a denúncia do Lula?", além de uma grande preocupação com o que a imprensa noticiava na época. Os procuradores programaram a divulgação contra Lula no caso do sítio de Atibaia fazendo um cálculo corporativista e midiático.

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Novos vazamentos obtidos pelo site The Intercept e divulgados na manhã desta segunda-feira (14), mostram um emaranhado de conversas do tipo: “Vamos criar distração”, “Anunciaram batom na cueca com relação ao Temer, e não tem”, “Quem sabe não seja a hora de soltar a denúncia do Lula?”, além de uma grande preocupação com o que a imprensa noticiava na época. Os procuradores programaram a divulgação contra Lula no caso do sítio de Atibaia fazendo um cálculo corporativista e midiático.

Parte 21
Procuradores escolheram data para fazer acusação no caso do sítio em Atibaia de olho nas críticas a delação que mirava em Michel Temer.

Procuradores da Lava Jato no Paraná programaram a divulgação da denúncia contra Luiz Inácio Lula da Silva no caso do sítio em Atibaia fazendo um cálculo corporativista e midiático. Em maio de 2017, eles decidiram publicar a acusação numa tentativa de distrair a população e a imprensa das críticas que atingiam Procuradoria-Geral da República na época, mostram discussões travadas em chats no aplicativo Telegram entregues ao Intercept por uma fonte anônima.

À época, a equipe do então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, estava sob bombardeio por causa de um áudio vazado da colaboração premiada dos executivos do conglomerado JBS que atingia em cheio o presidente Michel Temer. Havia suspeitas de que o material havia sido editado. Meses depois, problemas mais graves – como o jogo duplo do procurador Marcelo Miller, que recebeu R$ 700 mil para orientar a JBS – levaram o próprio Janot a pedir que o acordo fosse rescindido.

O então procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, à época o decano da Lava Jato em Curitiba, escreveu aos colegas que a acusação que atribui a Lula a propriedade de um sítio em Atibaia poderia “criar distração” sobre a possível edição da conversa gravada entre o ex-presidente Michel Temer e o empresário Joesley Batista, dono da JBS. Mais tarde, o diálogo seria um dos pilares da primeira denúncia que a PGR fez contra Temer, mas o que dominava o debate público até então eram suspeitas sobre a integridade da gravação.

A denúncia do sítio já estava pronta para ser apresentada em 17 de maio de 2017, dia em que o jornal O Globo publicou reportagem acusando Temer de dar aval a Joesley para a compra do silêncio do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, do MDB. Diante da notícia, que caiu como uma bomba em Brasília, o coordenador das investigações no Paraná, Deltan Dallagnol, decidiu adiar o oferecimento e a divulgação da acusação contra Lula, inicialmente programadas para o dia seguinte.

Quatro dias depois, num domingo, a força-tarefa debatia no Telegram o tratamento dado pela imprensa ao áudio de Temer e Joesley. Peritos entrevistados ou contratados por veículos de comunicação identificaram cortes na gravação e apontaram que poderia ter havido edição do arquivo.

A Lava Jato do Paraná, que não teve participação na delação da JBS, se preocupava: além de considerarem as falas de Temer inconclusivas do ponto de vista jurídico, os procuradores – que nunca lidaram bem com críticas da imprensa – se incomodavam com a repercussão das suspeitas de adulteração do material.

Convencidos da integridade da gravação, os procuradores esperavam que viesse a público o quanto antes um laudo da Polícia Federal sobre o áudio. Foi durante essa discussão que Santos Lima expôs seu plano no grupo Filhos do Januario 1, restrito aos integrantes da força-tarefa: “Quem sabe não seja hora de soltar a denúncia do Lula. Assim criamos alguma coisa até o laudo”. Após seu chefe, Deltan Dallagnol, se certificar de que o plano poderia ser posto em prática, ele comemorou, no mesmo grupo: “Vamos criar distração e mostrar serviço”.

A denúncia contra Lula foi apresentada à justiça e divulgada à imprensa no final da tarde do dia seguinte, dia 22.

‘ANUNCIARAM BATOM NA CUECA. E COM RELAÇÃO AO TEMER, NÃO TEM’

COMO QUASE TODO O BRASIL, a força-tarefa da Lava Jato no Paraná ficou sabendo do áudio em que Joesley Batista incriminava Michel Temer pela imprensa. Às 19h54 de 17 de maio, o procurador Athayde Costa enviou ao grupo de Telegram Filhos do Januario 1 o link da reportagem de O Globo. A informação abalou Brasília a tal ponto que forçou Temer a fazer um pronunciamento no dia seguinte para garantir, em seu português empolado, que não renunciaria à Presidência.

Enquanto os procuradores da Lava Jato discutiam o vazamento, a procuradora Jerusa Viecili avisou aos colegas que a denúncia do sítio estava pronta para ser apresentada. Dallagnol, porém, avaliou que a acusação seria “engolida pelos novos fatos”, ou seja, os desdobramentos das revelações contra Temer.

As primeiras conversas dos procuradores sobre a delação da JBS revelam um clima de excitação. “To em êxtase aqui. Precisamos pensar em como canalizar isso pras 10 medidas”, escreveu Dallagnol em 17 de maio, no mesmo grupo, referindo-se ao projeto de medidas contra a corrupção capitaneado por ele.

“Bem que poderia vir uma gravação do Gilmau junto né?!”, escreveu minutos mais tarde o procurador Roberson Pozzobon, em alusão ao ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, visto como um arqui-inimigo pela força-tarefa. O procurador Orlando Martello retrucou, pouco depois: “Defendo uma delação com temer ou Cunha para pegar Gilmar”.

Passada a euforia inicial, no entanto, alguns procuradores começaram a expressar ceticismo sobre o real impacto do áudio contra Temer.

‘AÍ MATA A REPERCUSSÃO’

À MEDIDA QUE OS DIAS PASSAVAM, crescia a preocupação dos procuradores com questões que a força-tarefa considerava perigosas à imagem da Lava Jato. Uma delas era a situação delicada do ex-procurador Marcello Miller, que veio à tona no dia seguinte à reportagem de O Globo.

A imprensa apontava que Miller, braço-direito de Janot na Lava Jato até o início de 2017, havia sido contratado pelo escritório de advocacia Trench Rossi Watanabe, que trabalhava no acordo de leniência – a delação premiada de pessoas jurídicas – da JBS em outra operação, a Greenfield. À época, a PGR limitou-se a afirmar que Miller não participou das negociações da delação.

A força-tarefa também se preocupava com as condições do acordo com a JBS, que previa, inicialmente, total imunidade aos delatores: eles não seriam denunciados criminalmente, ficariam livres da prisão e de tornozeleira eletrônica e poderiam se manter no comando das empresas. Dallagnol reportou aos colegas que apoiadores da Lava Jato consideraram “absurdo os batistas nos EUA rindo da nossa cara”, referindo-se aos irmãos Joesley e Wesley Batista, que deixaram o Brasil no mesmo dia em que fecharam a delação.

O procurador Athayde Costa considerava que o Ministério Público estava “perdendo a guerra da comunicação” no caso da JBS. Concordando, Dallagnol angustiava-se com o silêncio de Janot, que não havia se manifestado publicamente desde a revelação de O Globo. Um trecho do diálogo entre os dois no Telegram mostra que Dallagnol tentou orientar o procurador-geral da República sobre como abafar a crise.

Janot não respondeu naquele sábado, mas fez uma declaração, pela primeira vez desde a eclosão do escândalo, horas após as mensagens de Dallagnol. O Procurador-geral enviou ao STF uma manifestação afirmando que o áudio contra Temer “não contém qualquer mácula que comprometa a essência do diálogo”.

A angústia em Curitiba, contudo, não foi aplacada. Assim, no domingo à noite, Santos Lima apareceu com a ideia salvadora.

A resposta de Dallagnol mostra que os procuradores queriam garantir que não haveria, na Lava Jato de Brasília, uma operação – prisões ou buscas e apreensões contra investigados, por exemplo – que disputasse a atenção da imprensa com a acusação contra o ex-presidente.

No minuto seguinte, ele enviou uma mensagem a outro grupo de Telegram, o Conexão Bsb – CWB, e consultou os colegas da PGR sobre a agenda da semana seguinte.

Com o sinal verde de Brasília, Dallagnol retornou ao grupo da força-tarefa no Paraná e deu a notícia.

AS REVIRAVOLTAS SOBRE A DELAÇÃO DA JBS, no entanto, estavam apenas começando. No início de setembro de 2017, após os delatores entregarem novos materiais em complementação ao acordo já homologado, Janot anunciou que a PGR iria rever as delações de Joesley, do diretor de relações institucionais da JBS, Ricardo Saud, e do advogado da empresa, Francisco de Assis e Silva.

O motivo: em meio à nova remessa de arquivos entregues à PGR, a JBS incluiu a gravação de uma conversa em que Joesley e Saud falam sobre a atuação alinhada da holding com Marcello Miller durante a negociação da delação.

A situação de todos os envolvidos deteriorou-se rapidamente. Em dez dias, Joesley e Saud foram presos e viram seus acordos de delação serem cancelados por Janot. A rescisão dos contratos ocorreu em 14 de setembro, mesma data em que a PGR fez a segunda denúncia contra Temer com base na colaboração da JBS. Meses depois, em fevereiro de 2018, o executivo Wesley Batista e o advogado Francisco de Assis e Silva também perderiam os benefícios da delação.

Miller, por sua vez, acabaria denunciado em junho de 2018 por ter aceitado R$ 700 mil da JBS para orientar os delatores durante as negociações. O processo contra ele, que corre na Justiça Federal de Brasília, foi trancado pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região em 17 de setembro. A Quarta Turma do tribunal acatou um pedido da defesa de Miller, que apontou “inépcia” na denúncia do Ministério Público.

A perícia da PF sobre o áudio, revelada mais de um mês depois que Lula foi denunciado no caso do sítio, identificou cortes, mas descartou adulteração na gravação. O conteúdo dela foi usado na denúncia que a PGR faria contra Temer e seu ex-assessor, Rodrigo Rocha Loures, em 26 de junho de 2017.

Lula foi condenado a 12 anos e 11 meses de prisão no processo do sítio de Atibaia pela juíza Gabriela Hardt, em fevereiro de 2019. Ela admitiu ter partido de uma sentença do antecessor, Sergio Moro. O petista espera o julgamento de seu recurso na segunda instância, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

Já os delatores da JBS aguardam, até hoje, que o STF decida se vai homologar a rescisão de suas colaborações, como pediu Rodrigo Janot. No último dia 9, pouco antes de encerrar seu mandato à frente da PGR, Raquel Dodge enviou um pedido ao STF para que priorize o julgamento do caso.

QUESTIONADO PELO INTERCEPT SOBRE O CASO, o Ministério Público Federal do Paraná disse que “quando nenhuma questão legal (como a existência de prazo ou risco de prescrição) ou razão de interesse público determina o momento de apresentação de uma denúncia ou manifestação, a força-tarefa ouve a equipe de comunicação quanto ao melhor momento para sua divulgação”.

Um dos mentores da estratégia, o ex-procurador Carlos Fernando dos Santos Lima foi consultado separadamente porque não integra mais os quadros do MPF, já que aposentou-se em março deste ano. No entanto, ele não respondeu aos contatos do Intercept. O espaço está aberto para os comentários dele, que serão acrescentados se forem enviados.

A Procuradoria-geral da República também foi procurada para comentar o tema, mas informou que não irá se manifestar.

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The Intercept: Dallagnol usou dados ilegais vindos do exterior https://nocaute.blog.br/2019/09/27/dallagnol-usou-dados-ilegais-vindos-do-exterior/ Fri, 27 Sep 2019 14:09:30 +0000 https://nocaute.blog.br/?p=54909 Novos vazamentos obtidos pelo site The Intercept e publicados na manhã desta sexta-feira (27) pelo portal UOL, revelam que as trapalhadas do promotor Deltan Dallagnol foram além das nossas fronteiras. Ele trouxe da Suiça, em um pendrive, dados ilegais sobre a Odebrecht, inclusive ao Drousys, sistema de proprina, quase um ano antes de terem autorização.

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Novos vazamentos obtidos pelo site The Intercept e publicados na manhã desta sexta-feira (27) pelo portal UOL, revelam que as trapalhadas do promotor Deltan Dallagnol foram além das nossas fronteiras. Ele trouxe da Suiça, em um pendrive, dados ilegais sobre a Odebrecht, inclusive ao Drousys, sistema de proprina, quase um ano antes de terem autorização.

Dallagnol, na obsessão de prender acusados, ignorou os alertas sobre o uso de dados obtidos ilegalmente de Mônaco sobre Renato Duque e cinco dias depois prendeu o ex-diretor de serviços da Petrobras.

A Lava Jato, como sempre, alega que essa cooperação internacional é legal e nega ter usado judicialmente documentos fora dos canais diplomáticos oficiais.

Deu no UOL.

A força-tarefa da Lava Jato em Curitiba utilizou sistematicamente contatos informais com autoridades da Suíça e Mônaco para obter provas ilícitas com o objetivo de prender alvos considerados prioritários –encarcerados preventivamente, muitos deles vieram a se tornar delatores. Menções a esse tipo de prática ilegal foram encontradas com frequência em conversas entre 2015 e 2017, conforme revelam mensagens do aplicativo Telegram enviadas por fonte anônima ao site The Intercept Brasil e analisadas em parceria com o UOL.

Mesmo alertados sobre a violação das regras, os procuradores da força-tarefa tiveram acesso a provas ilegais sobre vários dos mais importantes delatores da operação —como os então diretores da Petrobras Paulo Roberto Costa e Renato Duque; o então presidente da Transpetro, Sérgio Machado, além de executivos da Odebrecht, entre eles, o ex-presidente da empresa Marcelo Odebrecht.

Especialistas ouvidos pelo UOL dizem que informações obtidas por fora do canal oficial estabelecido em acordos de cooperação internacional de investigação constituem provas ilegais, podendo levar à anulação de processos. Mas a Lava Jato sustenta que “a troca de informações de inteligência e a cooperação direta entre autoridades estrangeiras é absolutamente legal e constitui boa prática internacional”. A força-tarefa afirma ainda que “nenhum documento foi utilizado judicialmente pela força-tarefa da Lava Jato sem ter sido transmitido pelos canais diplomáticos oficiais”.

Entre as práticas ilegais identificadas, está o acesso clandestino da Lava Jato, a partir de procuradores suíços, ao sistema Drousys, usado pelo setor de Operações Estruturadas da Odebrecht para controlar pagamentos de propina a autoridades e políticos. Mensagens revelam que os procuradores tiveram acesso à contabilidade paralela quase um ano antes de a Lava Jato estar apta para usar formalmente os dados entregues pela Odebrecht.

Duas fontes ligadas à empresa, que falaram ao UOL sob condição de terem suas identidades preservadas, relataram que a convicção de que os investigadores “escondiam cartas nas mangas” foi essencial para que parte dos 78 delatores da empresa decidissem firmar acordos de colaboração premiada.

A troca de mensagens entre procuradores ainda indica que Deltan Dallagnol, chefe da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, fez uso de prova ilícita, obtida junto a autoridades de Mônaco, no pedido de prisão de Renato Duque em março de 2015. “É natural tomar algumas decisões de risco calculado em grandes investigações”, justificou Dallagnol, após ser alertado pelo procurador regional da República Vladimir Aras cinco dias antes de Sergio Moro decretar a prisão.

Antes disso, em novembro de 2014, primeira vez que integrantes da força-tarefa se reuniram com suíços, houve transmissão de documentos de maneira irregular. Documentos obtidos pelo UOL em ações judiciais mostram que Dallagnol trouxe sem registro oficial um pen drive com informações bancárias de Paulo Roberto Costa, ex-diretor de Abastecimento da Petrobras e um dos primeiros delatores importantes da operação. Esses registros, corroborados pela delação de Costa, incluíam elementos essenciais para que a Lava Jato abrisse uma linha de investigação sobre a Odebrecht: a empreiteira pagou a ele US$ 23 milhões em propina através de contas de duas empresas offshore.

Mensagens privadas revelam que, meses depois, a Lava Jato pediu a um órgão do MPF (Ministério Público Federal) alteração de documento para atribuir a remessa do pen drive a canal oficial com a Suíça, simulando que as informações tiveram origem legal.

A estratégia de troca de informações fora do canal oficial de cooperação com a Suíça também fica evidente em uma espécie de ata de reunião realizada com uma autoridade daquele país em 2015, quando Dallagnol registrou como tarefa a elaboração de uma lista com alvos suspeitos da Lava Jato a serem remetidos para análise por equipe de investigação suíça —como exemplo citou “familiares de Lula”.

No mesmo ano, entre 1º e 4 de dezembro, mensagens em chats privados ainda revelam que procuradores da Lava Jato tiveram reunião secreta em Curitiba com investigadores suíços.

“Caros, sigilo total, mesmo internamente. Não comentem nem aqui dentro: Suíços vêm para cá semana que vem. Estarão entre 1 e 4 de dezembro, reunindo-se conosco, no prédio da frente. Nem imprensa nem ninguém externo deve saber. Orlando estará com eles todo tempo, assim como eu (que estarei fora na quarta). Vejam o que precisam da Suíça e fiquem à vontade para irem a qq tempo, ficarem nas reuniões todo o tempo que quiserem”

Deltan Dallagnol, chefe da força-tarefa da Lava Jato

O uso de informações ilícitas chegou até mesmo a ser cogitado para pressionar Sérgio Machado a fechar delação premiada. A proposta, que foi descartada, foi feita por Paulo Roberto Galvão, da Lava Jato em Curitiba. “Se é pressão que o SM está precisando, nós temos conhecimento da conta do filho dele na Suíça”, disse em 13 de abril de 2016, no chat “Conexão BSB -CWB”, ao promotor Sérgio Bruno Cabral Fernandes que negociava a delação de Machado.

“É uma informação que não podemos usar de forma alguma, pois nos foi passada para inteligência pelos suíços. Mas acho que se for necessário vc pode dar a entender que Curitiba já tem conhecimento “de contas no exterior””, detalhou Galvão.

Por que provas obtidas fora do canal oficial são ilegais?

A estratégia, coordenada por Dallagnol, era montar uma espécie de “lavanderia” de provas obtidas no exterior: os procuradores recebiam informalmente documentos e informações de autoridades estrangeiras e então estudavam formas de legalizar aquelas evidências perante os tribunais brasileiros. Sobretudo no caso da Suíça, havia um jogo combinado.

Os procuradores brasileiros eram avisados sobre quais informações as autoridades suíças possuíam e então solicitavam exatamente aqueles dados. Em outros casos, pediam que os suíços investigassem pessoas e empresas específicas —inclusive parentes do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ainda havia a alternativa de, com base nas informações privilegiadas recebidas dos procuradores estrangeiros, criar subterfúgios para obter as mesmas provas no Brasil.

A legislação brasileira obriga que sejam firmados acordos de cooperação internacional em matéria penal para que investigações usem informações apuradas no exterior. A relação com cada país é estabelecida através de acordos bilaterais e também de tratados internacionais em que o Brasil é signatário —como a convenções de Palermo, para crime organizado transnacional, e a de Mérida, para combate à corrupção.

No caso de cada acordo é estabelecida uma autoridade central, que fica responsável por articular a troca de informações. Esse papel quase sempre é desempenhado pelo DRCI (Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional), vinculado ao Ministério da Justiça.

Por isso, os membros da Lava Jato são obrigados a remeter seus pedidos de colaboração à autoridade central, que é responsável por enviá-los a outros países. Da mesma forma, as evidências colhidas a partir desses pedidos devem chegar através do DRCI, que é o responsável por entregá-las aos investigadores.

Na outra ponta, autoridades estrangeiras podem enviar informações ao Brasil sem serem demandadas desde que também por meio do canal do DRCI.

Falando em tese, Thiago Bottino, professor da FGV Direito Rio, diz que a legislação brasileira obriga que a troca de informações se dê através da autoridade central para a cooperação internacional. Assim, ele diz que qualquer evidência colhida fora dos trâmites normais configura uma prova ilegal.

“Uma prisão preventiva decretada com base nisso tem que ser imediatamente relaxada. Se essa pessoa já foi solta, na minha opinião essa pessoa tem que ser inclusive indenizada. Se foi feita uma busca e apreensão nesses termos, as provas obtidas por meio dela também são ilícitas”, afirmou Bottino.

Para o advogado Yuri Saihone, que pesquisa o tema das cooperações internacionais em matéria penal, essas práticas violam os princípios do devido processo legal. Falando em tese, ele avalia que provas obtidas fora dos canais oficiais de cooperação devem ser consideradas ilícitas. É preciso avaliar caso a caso a extensão das nulidades que elas provocariam, ressalta.

“Se existe uma lei, que neste caso seriam os tratados internacionais, e ela prevê um rito para a produção de provas, qualquer coisa que fuja dele é prova ilícita”, explica.

Na avaliação de Saihone, autoridades que adotam esse tipo de prática têm “certeza da impunidade”. “É uma maneira de burlar o próprio sistema, na lógica de justiça a qualquer preço. A gente não pode aceitar esse tipo de conduta porque dessa forma não é preciso ter o devido processo legal.”

Acesso clandestino a sistema de propina da Odebrecht

As mensagens revelam que Dallagnol se esforçou para criar canais clandestinos de troca de informações com autoridades estrangeiras de países como Suíça e Mônaco. O ex-procurador suíço Stefan Lenz —que atuou até outubro de 2016 como o principal responsável pelas investigações sobre corrupção na Petrobras na Suíça— foi seu principal colaborador nessa empreitada. O principal objetivo de ambos era fisgar a Odebrecht, maior empreiteira brasileira.

Embora não tivesse provas de que havia tráfico de informações entre Brasil e Suíça, a desconfiança de que isso ocorresse era uma constante na cúpula da construtora, que chegou a mover ações na Justiça para questionar os canais de cooperação.

Ações da Lava Jato levaram executivos da Odebrecht a especularem sobre o acesso privilegiado dos procuradores às autoridades suíças. Despertou especial desconfiança a Operação Erga Omnes, 14ª fase da Lava Jato, deflagrada pela Polícia Federal em 19 de junho de 2015. Na ocasião, Marcelo Odebrecht foi preso e 38 mandados de busca e apreensão, cumpridos.

“A extensão das buscas e o nível de detalhamento a que chegaram chamou muito a atenção. Tinham detalhes sobre servidores de e-mail e de documentos que estavam na sala de pessoas físicas específicas… Isso antes mesmo de delações e remessas de documentos importantes para desvendar o esquema da Odebrecht serem concluídas. Não havia chance de uma investigação no Brasil naquele momento já dispor desse tipo de informação”, disse uma fonte ligada à empresa ao UOL.

O acesso integral ao sistema de controle de propina da Odebrecht foi uma das exigências da Lava Jato para fechar acordos de delação com os executivos da empreiteira —incluindo Emílio e Marcelo Odebrecht. No entanto, diálogos entre os procuradores mostram que eles já tinham acesso à contabilidade paralela da empreiteira quase um ano antes de o MPF estar apto a usar formalmente os dados entregues pela Odebrecht —o que só ocorreu em abril de 2017.

Em 14 de maio de 2016, a procuradora Laura Tessler, também da Lava Jato, já citava no chat “João Santana – Ode” —destinado a discutir informações delatadas pelo ex-marqueteiro de campanhas petistas— descobertas feitas através do Drousys.

Laura demonstra estar em contato direto com a equipe do então procurador suíço Stefan Lenz, sugerindo caminhos de apuração na Suíça e recebendo informações sobre investigados no Brasil. Segundo ela, as informações seriam utilizadas “como inteligência”, termo frequentemente usado pelos procuradores para se referir a provas ilegais obtidas no exterior. Dallagnol mostra empolgação com a notícia.

UOL manteve as grafias das mensagens tal qual constam nos arquivos enviados ao Intercept, mesmo que contenham erros ortográficos.

Lista de familiares de Lula

A troca de informações fora dos canais oficiais envolveu, além de membros do Ministério Público suíço, ao menos um funcionário da Embaixada da Suíça no Brasil, lotado em Brasília. Chamado apenas de Marco pelos procuradores, o UOL apurou que o interlocutor seria Marco Marinzoli, adido policial na representação diplomática.

O policial federal suíço chegou ao Brasil em 2014 e logo se aproximou de membros da força-tarefa. Além dos contatos via aplicativos de mensagens, que eram constantes, a proximidade pode ser vista em cortesias mútuas: Marinzoli foi convidado a palestrar em 2017 na Jornada Internacional de Investigação Criminal, em 1º e 2 de setembro em Gramado (RS), que já teve entre os palestrantes Moro, o juiz federal Marcelo Bretas e Dallagnol.

Os procuradores fazem constantes menções a ele como origem de informações de “inteligência” recebidas da Suíça. Em 2015, Deltan falou com os colegas sobre uma reunião que tinha realizado com o adido policial para tratar da Lava Jato e chegou a enviar um documento com uma espécie de ata, onde listava as informações recebidas e as providências que sua equipe deveria tomar.

O texto deixa claro que —mais do que colaboração— os investigadores dos dois países mantinham uma estratégia conjunta, com os suíços guiando suas apurações de acordo com os desígnios da Lava Jato no Brasil. Entre essas prioridades, estavam familiares do ex-presidente Lula.

“É natural tomar algumas decisões de risco calculado em grandes investigações”, diz Dallagnol

Muito antes de chegarem à Odebrecht, os procuradores brasileiros já usavam canais informais de cooperação internacional para conseguir prisões e outras medidas cautelares.

Em 10 de março de 2015, Dallagnol é alertado por Vladimir Aras —que comandava a SCI (Secretaria de Cooperação Internacional) do MPF— sobre o risco de cometer violações ao usar informações passadas por autoridades de Mônaco à revelia do DRCI.

No diálogo, Dallagnol expõe o ponto central do que seria a “lavanderia de provas” que havia criado: usaria as remessas informais para sustentar o ritmo frenético de operações do começo da Lava Jato e, caso houvesse contestações ao rito, obteria as mesmas informações pelo canal oficial para legalizar as evidências.

Como suspeitava Aras, Renato Duque seria preso muito em breve —mais precisamente cinco dias depois, na Operação Que País É Esse?, a 10ª fase da Lava Jato. Moro embasa a prisão citando que a Lava Jato anexou dados bancários de Duque, informações oriundas justamente de Mônaco.

Outro lado: o que diz a Lava Jato

Questionada pelo UOL, a força-tarefa da Lava Jato não comentou o acesso, através do MP suíço, ao sistema Drousys.

Sobre a troca direta de informações entre os procuradores da Lava Jato e autoridades estrangeiras, os procuradores afirmam: “A troca de informações de inteligência e a cooperação direta entre autoridades estrangeiras é absolutamente legal e constitui boa prática internacional, incentivada pelos manuais da AGU (Advocacia-Geral da União), GAFI (Grupo de Ação Financeira Internacional), UNODC (Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime), UNCAC (Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção), Banco Mundial, dentre outros organismos internacionais, bem como constitui orientação da 2ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal (MPF) e é aceita pelo Judiciário brasileiro. Para essa troca de informações, o auxílio de representantes estrangeiros no Brasil, como os adidos, é essencial para a celeridade e melhor compreensão dos dados trocados”.

A Lava Jato sustenta ainda que “nenhum documento foi utilizado judicialmente pela força-tarefa Lava Jato sem ter sido transmitido pelos canais diplomáticos oficiais. Somente em situações de urgência, quando expressamente autorizado pelas autoridades estrangeiras, conforme permite a respectiva legislação, pode haver a remessa de dados por meio mais expedito e sua utilização judicial para fins cautelares”.

Em relação à definição, por meio de conversas informais, sobre linhas de investigação conjuntas com procuradores suíços, a Lava Jato alega que “no vultoso esquema de corrupção descoberto pela força-tarefa Lava Jato, foram abertas contas bancárias no exterior, em especial na Suíça, para receber dinheiro de propina e lavagem de dinheiro. Paralelamente às investigações brasileiras, as autoridades suíças também instauraram investigação própria para a apuração dos crimes ocorridos em seu território. Logo, absolutamente legal o intercâmbio de informações e estratégias de investigação entre as autoridades desses dois países, que foi fundamental para alcançar servidores públicos e políticos corruptos”.

Sobre a realização de reuniões secretas, a Lava Jato diz que “diversas autoridades estrangeiras de variados países vieram ao Brasil para a realização de diligências investigatórias, algumas ostensivas, outras sigilosas, conforme interesse dessas autoridades. Sendo um caso ou outro, todas as missões de autoridades estrangeiras no País são precedidas de pedido formal de cooperação e de sua autorização”.

Ao tratar da prisão de Renato Duque, os procuradores dizem que “os documentos utilizados foram transmitidos à força-tarefa Lava Jato e seu uso em caráter cautelar foi expressamente autorizado em comunicação entre as autoridades. O eventual uso não autorizado causaria grave prejuízo à cooperação com o Principado de Mônaco, o que nunca se verificou”.

Na explicação sobre o pen drive com documentos de Paulo Roberto Costa, a Lava Jato diz que já prestou informações à PGR no bojo de mandado de segurança impetrado pela Odebrecht. A Lava Jato confirma que recebeu os documentos em mãos dos suíços, o que, segundo a força-tarefa, foi autorizado na delação premiada do ex-diretor da Petrobras. Ainda segundo a Lava Jato, as contas também tiveram os sigilos bancários quebrados pela Justiça.

Sobre as mudanças nos documentos da PGR, a Lava Jato afirma que “os documentos recebidos para fins de inteligência com autorização de Paulo Roberto Costa foram encaminhados para análise interna no MPF (SPPEA – Secretaria de Perícia, Pesquisa e Análise). No curso dessa análise os documentos efetivamente utilizados nas ações penais chegaram oficialmente por meio da autoridade central, tendo sido também encaminhados à SPPEA, aproveitando-se a análise já iniciada, procedendo-se à conferência das informações e a elaboração de relatório, não havendo simples acerto de datas”.

Sem citar expressamente a sugestão de pressão sobre Sérgio Machado, a Lava Jato disse: “Ao tratar com investigados, é perfeitamente lícito e leal informá-los de que as autoridades brasileiras já possuem conhecimento sobre eventuais offshores e contas bancárias controladas por eles. Diante dessa informação, o investigado, igualmente, pode traçar sua estratégia defensiva, inclusive buscando uma colaboração, já que têm conhecimento de que tais informações chegarão oficialmente no Brasil em pouco tempo”.

A força-tarefa reiterou que o material é “oriundo de um crime e tem sido usado fora de contexto e com edições para fazer falsas acusações contra a Lava Jato”. O UOL transcreveu todas as conversas sem omitir seu contexto original ou editar seu conteúdo. Não há indícios de que as mensagens tenham sido adulteradas, tendo inclusive por diversas vezes tido sua autenticidade confirmada por pessoas envolvidas nos diálogos.

O que dizem os outros citados na reportagem

Por meio de nota, o Ministério Público da Suíça afirmou apenas que pauta seu trabalho conforme as leis suíças.

“O Escritório do Procurador Geral da Suíça está conduzindo seus processos criminais com base na legislação suíça pertinente”, diz o órgão, em resposta ao UOL.

Questionado, o MP suíço não comentou o acesso clandestino da Lava Jato ao sistema de propina da Odebrecht tampouco o fato de Dallagnol ter trazido em segredo ao Brasil um pen drive com dados de Paulo Roberto ou a revelação de reunião secreta em Curitiba com seus procuradores.

O Departamento de Assuntos Estrangeiros do governo suíço não comentou as suspeitas sobre a atuação do funcionário Marco Marinzoli em sua embaixada em Brasília e repassou o assunto ao Departamento Federal de Justiça e Polícia. Por sua vez, o órgão também não comentou as irregularidades reveladas nas mensagens vazadas.

Comunicado do departamento enviado ao UOL confirma que Marco Marinzoli atuou no Brasil como adido policial responsável pela intermediação entre os dois países.

“A pessoa que você menciona é um colaborador da polícia federal suíça (fedpol). Foi destacado de 2014 a 2018 como agente de ligação no Brasil”, diz o departamento.

“Em geral, o principal mandato de um agente de ligação [adido] é facilitar a cooperação policial e judiciária e, nomeadamente, assegurar o intercâmbio de informações policiais e judiciárias entre a Suíça e o país anfitrião”, afirma a nota. “Como tal, o agente de ligação responde exclusivamente perante as autoridades responsáveis pela aplicação da lei”, completa.

O ex-procurador suíço Stefan Lenz negou que as práticas eram ilegais.

“Não houve prática ilegal no contexto que descreveu. Além disso, não comento estas alegações”, disse ele, que deixou o Ministério Público da Suíça em 2016 e hoje atua em um escritório de advocacia em seu país.

O Ministério Público de Mônaco foi procurado, mas ainda não respondeu.

O procurador regional da República Vladimir Aras também foi procurado, mas também não retornou.

O espaço está aberto para eventuais manifestações.

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The Intercept: Áudio revela o plano de Bolsonaro para acabar com a floresta Amazônica https://nocaute.blog.br/2019/09/20/plano-de-bolsonaro-para-acabar-com-a-amazonia/ Fri, 20 Sep 2019 15:31:31 +0000 https://nocaute.blog.br/?p=54606 Áudios obtidos pelo site través de uma fonte anônima, revelam exatamente o contrário que o presidente Jair Bolsonaro vem falando nos últimos dias: "A proteção da floresta é nosso dever". Nos áudios, o que se ouve é que a prioridade é destruir a floresta para explorar riquezas, extrair minério, facilitar a intervenção de grandes corporações, fazer grandes obras, ocupar terrenos cultiváveis e atrair novos habitantes. Acredite. Existe até o temor de uma invasão chinesa pela fronteira com o Suriname.

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Áudios obtidos pelo site The Intercept através de uma fonte anônima, revelam exatamente o contrário que o presidente Jair Bolsonaro vem falando nos últimos dias: “A proteção da floresta é nosso dever”. Nos áudios, o que se ouve é que a prioridade é destruir a floresta para explorar riquezas, extrair minério, facilitar a intervenção de grandes corporações, fazer grandes obras, ocupar terrenos cultiváveis e atrair novos habitantes. Acredite. Existe até o temor de uma invasão chinesa pela fronteira com o Suriname.

Veja a reportagem completa do Intercept.

O governo de Jair Bolsonaro está discutindo, desde fevereiro, o maior plano de ocupação e desenvolvimento da Amazônia desde a ditadura militar. Gestado pela Secretaria de Assuntos Estratégicos, com coordenação de um coronel reformado, o projeto Barão de Rio Branco retoma o antigo sonho militar de povoar a Amazônia, com o pretexto de desenvolver a região e proteger a fronteira norte do país.

Documentos inéditos obtidos pelo Intercept detalham o plano, que prevê o incentivo a grandes empreendimentos que atraiam população não indígena de outras partes do país para se estabelecer na Amazônia e aumentar a participação da região norte no Produto Interno Bruto do país. A revelação surge no momento em que o governo está envolvido numa crise diplomática e política por conta do aumento do desmatamento no Brasil. Bolsonaro se comprometeu a proteger a floresta em pronunciamento em cadeia nacional de televisão, mas o projeto mostra que a prioridade é outra: explorar as riquezas, fazer grandes obras e atrair novos habitantes para a Amazônia.

O plano foi apresentado pela primeira vez em fevereiro deste ano, quando a secretaria ainda estava sob o comando de Gustavo Bebbiano. O então secretário-geral da Presidência iria à Tiriós, no Pará, em uma comitiva com os ministros Ricardo Salles, do Meio Ambiente, e Damares Alves, dos Direitos Humanos, para se reunir com entidades locais. Bolsonaro, no entanto, não sabia da viagem. Foi surpreendido pelas notícias e vetou a comitiva — uma das razões que culminaram na crise que tirou Bebbiano do governo em 18 de fevereiro. O plano acabou sendo apresentado dias depois só pelo coronel reformado Raimundo César Calderaro, seu coordenador, sem alarde, em reuniões fechadas com políticos e empresários locais.

Parte do conteúdo do encontro foi revelado no mês passado pelo Open Democracy. O Intercept, agora, teve acesso a áudios e à apresentação feita durante uma reunião organizada pela Secretaria Especial de Assuntos Estratégicos no dia 25 de abril deste ano na sede da Federação da Agricultura do Pará, a Feapa, em Belém. A secretaria afirmou ter reunido a sociedade, academia e autoridades locais para ouvir opiniões e sugestões que guiarão os estudos sobre o programa. Mas os documentos, até agora inéditos, revelam que indígenas, quilombolas e ambientalistas parecem ter ficado de fora da programação.

Clique para acessar o Plano De Desenvolvimento Da Amazônia

Na apresentação, os responsáveis esmiuçaram a preocupação do governo com a “campanha globalista” que, de acordo com o material, “relativiza a soberania na Amazônia” usando como instrumentos as ONGs, a população indígena, quilombola e os ambientalistas. E afirmaram ser necessária a execução de obras de infraestrutura — investimentos “com retorno garantido a longo prazo” —, como hidrelétricas e estradas, para garantir o desenvolvimento e a presença do estado brasileiro no local.

1 – INDUSTRIALIZAÇÃO DE MINÉRIOS AMAZÔNICOS

O documento mostra que o governo vê como “riquezas” os minérios, o potencial hidrelétrico e as terras cultiváveis do planalto da Guiana, que ficam entre o Amapá, Roraima e o norte do Pará e do Amazonas. “Tudo praticamente inexplorado”, “distante do centro do Brasil”, “e de costa (sic) para as riquezas do norte”, diz um slide.

O plano prevê três grandes obras, todas no Pará: uma hidrelétrica em Oriximiná, uma ponte sobre o Rio Amazonas na cidade de Óbidos e a extensão da BR-163 até o Suriname. O objetivo é integrar a Calha Norte do Pará, na fronteira, ao centro produtivo do estado e do país. A região, extremamente pobre e com baixa densidade demográfica, está cortada por rios e é de difícil acesso. Também é a mais preservada do Pará, estado campeão em desmatamento.

No plano, a BR-163, que começou a ser construída nos anos 1970, seria estendida até a fronteira norte do Brasil, ligando hidrovias e cortando a Amazônia do Suriname até o “centro de poder” do país — hoje, a rodovia vai de Tenente Portela, no Rio Grande do Sul, até Santarém, no Pará.

O objetivo é escoar a produção de soja do centro-oeste e integrar uma região até agora “desértica”, nas palavras do secretário Especial de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, general Maynard Santa Rosa, um militar da reserva dado a teorias da conspiração sobre as intenções de ambientalistas na floresta e que alimenta paranoias sobre a insegurança das fronteiras brasileiras no extremo norte devido à “escassez populacional”. Ele defende a extensão da estrada desde pelo menos 2013. Pelo projeto, a rodovia também atravessaria a Reserva Nacional de Cobre e Associados, rica em minérios, e daria acesso a uma região de savanas que pode ser convertida em plantações de soja e milho.

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Mapa: Rodrigo Bento/The Intercept Brasil

O governo diz que a ampliação “possibilitará livre mobilidade de cerca de 800 mil habitantes” que moram nas cidades da região e dependem de hidrovias. Também aposta que a construção terá “impacto direto” na redução do valor do transporte de grãos na região. No total, a interligação das rodovias, que inclui uma ponte sobre o Rio Amazonas beneficiaria 2 milhões de pessoas, argumenta a Secretaria Especial de Assuntos Estratégicos.

A BR-163 é há três décadas uma via precária devido à falta de asfalto. “Quando olhamos projetos como esse, não sei se estamos falando em infraestrutura para a Amazônia”, me disse Caetano Scannavino, coordenador da ONG Saúde e Alegria e morador de Santarém. “O que essa região está precisando e esperando há 30 anos é o término do asfaltamento. Então, de repente, surge uma estrada em uma ponta, uma hidrelétrica, e tudo isso sem respostas concretas e efetivas em relação à obras que começaram e não terminaram”. A obra está a cargo dos militares, e o governo promete asfaltar o último trecho até o final do ano.

As margens da BR-163 na altura do Pará são, hoje, um dos principais focos de conflitos agrários no país. A região de Novo Progresso, por exemplo, foi o epicentro do Dia do Fogo, evento marcado por ruralistas no WhatsApp para incendiar diversas áreas do local para mostrar apoio às políticas de Bolsonaro para a região. O fogo simultâneo chamou a atenção internacional e foi estopim da crise diplomática com o presidente da França, Emmanuel Macron – o caso está sendo investigado pela Polícia Federal.

Em um artigo publicado em um jornal de Santarém, o coordenador do projeto Barão do Rio Branco, o coronel Calderaro, explicou as razões do plano: viabilizar que as riquezas do Brasil “se movimentem ‘porta à porta’ (sic), em toda a Nação” e possibilitar o acesso dos brasileiros “às suas próprias terras ricas, no planalto ao norte, em seus municípios”.

O objetivo da hidrelétrica em Oriximiná seria reduzir a quantidade de apagões na região e abastecer a Zona Franca de Manaus. Segundo a Secretaria Especial de Assuntos Estratégicos, além da segurança energética, a hidrelétrica em Trombetas também viabilizará a industrialização do minério de alumina-alumínio, “abundante nos municípios da Calha Norte, principalmente em Oriximiná e Óbidos”. E reduzirá gastos públicos com as termoelétricas, “com impacto direto na redução de emissão de gás carbônico”.

Não é a primeira tentativa: outros projetos, no mesmo rio Trombetas, já foram abandonados por causa do impacto socioambiental em comunidades indígenas e quilombolas. Na região, há registro, inclusive, de tribos indígenas isoladas – mas isso não freia o ímpeto do novo governo.

“Nos preocupa muito a forma na qual as coisas vêm sendo feitas”, diz Scannavino. “A questão não é ser contra a infraestrutura. É importante rever a forma como ela vem sendo implantada, sem respeitar os devidos ritos de consultas”.

Truckers line up behind a banner reading "For the regularization of garimpos (illegal mines) in Tapajos", referring to the Tapajos River, on the BR 163 highway, blocked by "garimpeiros" -illegal gold miners- during a protest in Morais Almeida, Itaituba, Para state, Brazil, on September 13, 2019. - Members of an indigenous tribe in the Amazon in northern Brazil on Friday called for wildcat miners to be allowed to prospect for gold on their land, saying it was a source of income. (Photo by NELSON ALMEIDA / AFP)        (Photo credit should read NELSON ALMEIDA/AFP/Getty Images)

Caminhões usados para o transporte de grãos de soja parados na BR-163 em setembro em Itaituba, Paraná, devido a um bloqueio feito por garimpeiros que pediam a regularização de áreas de mineração ilegal, uma promessa histórica de Jair Bolsonaro.

Foto: Nelson Almeida/AFP/Getty Images

2 – OS CHINESES NO SURINAME

Na apresentação do projeto, o governo diz enxergar uma oposição orquestrada à sua “liberdade de ação” na região. Os slides listam os previsíveis supostos opositores: ONGs ambientalistas e indigenistas, mídia, pressões diplomáticas e econômicas, mobilização de minorias e aparelhamento das instituições.

Na visão da gestão Bolsonaro, a população tradicional — indígenas e quilombolas — é um empecilho à presença do estado no local. Segundo o projeto, a “situação econômica do Brasil” e os paradigmas do “indigenismo”, do “quilombolismo” e do “ambientalismo” eram entraves do passado. O “novo paradigma”, com o governo Bolsonaro, com o “liberalismo” e o “conservadorismo”, traz “nova esperança para a Pátria”. “Brasil acima de tudo”, diz o slide, repetindo o slogan de campanha do ex-deputado.

Em um áudio gravado durante a reunião e enviado ao Intercept por uma fonte que pediu para não ser identificada, o General Santa Rosa afirmou que o Brasil precisa agir para garantir a soberania na fronteira com o Suriname, país que recebe investimento e imigrantes chineses. Segundo ele, a China tem resolvido conflitos em fronteiras promovendo políticas de imigração em massa para regiões problemáticas ou que são consideradas estratégicas, como a Sibéria, o Nepal e o Suriname. “Na fronteira oeste da Sibéria tem mais chinês hoje do que cossaco. A Rússia está acordando para um problema de segurança nacional muito sério. Nós temos que acordar aqui antes que o problema ocorra”, disse, na gravação.

Perguntei a Mauricio Santoro, professor de relações internacionais na Universidade Estadual do Rio de Janeiro, se a preocupação encontra respaldo na realidade. Ele explicou que a China não tem uma política de imigração de seus cidadãos. Pelo contrário: o país está tentando atrair de volta o pessoal técnico e científico que vive no Ocidente.

Na Rússia, de fato há uma presença crescente de imigrantes chineses, em terras em que os dois países disputaram nos séculos 17 e 18 e ainda despertam preocupação do lado russo. No Suriname — país muito pequeno, com 500 mil habitantes — também houve uma onda de imigração chinesa que acompanhou os investimentos do país oriental. “Nos últimos anos a China tem investido bastante no país, que tem reservas minerais significativas, e aumentado sua influência por meio de ajuda internacional e empréstimos ao governo local”, diz Santoro. Mas também há imigração de brasileiros para lá, sobretudo, segundo o pesquisador, para explorar oportunidades nos garimpos ou na construção civil.

“Os militares tendem a ver a presença de estrangeiros na Amazônia, sobretudo de países de fora da América do Sul, como um problema e um risco à segurança nacional. Isso diz mais sobre a visão de mundo das Forças Armadas brasileiras do que sobre os objetivos de outras nações na região”, argumentou Santoro.RelacionadoNo fronte da guerra de Bolsonaro pela Amazônia, quem depende da floresta luta contra a catástrofe climática

Não é a primeira vez que esse temor aparece. Em um texto de 2013, o general Santa Rosa diz que o contexto estratégico na região era “preocupante”. “Pressões ambientalistas e indigenistas de toda a ordem invalidam as políticas governamentais. No entorno, multiplicam-se os ilícitos transnacionais”, ele escreveu. “A Venezuela tende à fragmentação da ordem interna. O Suriname e a Guiana enfrentam o problema da expansão chinesa.” Em uma entrevista no mesmo ano, Santa Rosa dá a dimensão de sua preocupação: “o maior problema geopolítico da Amazônia é o vazio populacional”. “Eu acredito que criar reservas [indígenas] na faixa de fronteira contrariando interesse nacional é um crime de lesa-pátria. Diga aos antropólogos o que quiserem, a antropologia militante o que quiser. Para mim é um crime de lesa pátria.”

Professor do Programa de Pós Graduação em Estudos de Fronteiras da Universidade Federal do Amapá, Paulo Correa também me disse que o temor de uma invasão pela fronteira na região não faz sentido – a região é remota dos dois lados, cercada por rios de difícil acesso e pequenas cidades. “Estamos falando de uma das fronteiras mais desabitadas que existem.” Debaixo da terra, porém, há um potencial desconhecido. “Ali é uma região inexplorada do ponto de vista dos minérios. Tem muito ouro e bauxita. Esse poderia ser um interesse: os recursos minerais”, diz o cientista político.

Professor do Programa de Pós Graduação em Estudos de Fronteiras da Universidade Federal do Amapá, Paulo Correa também me disse que o temor de uma invasão pela fronteira na região não faz sentido – a região é remota dos dois lados, cercada por rios de difícil acesso e pequenas cidades. “Estamos falando de uma das fronteiras mais desabitadas que existem.” Debaixo da terra, porém, há um potencial desconhecido. “Ali é uma região inexplorada do ponto de vista dos minérios. Tem muito ouro e bauxita. Esse poderia ser um interesse: os recursos minerais”, diz o cientista político.

Para proteger as fronteiras, os militares planejam também desenvolver a região – sem explicar como ou a que custo ambiental, social e financeiro. “Tem que aumentar a renda, a contribuição da Amazônia para o PIB do Brasil, que hoje não passa de 5,4% numa região riquíssima. Nós temos que chegar a 50%, pelo menos, para equilibrar o restante do país”, disse na gravação o homem que aparenta falar em nome do governo Bolsonaro.

Na verdade, hoje o PIB gerado pela Amazônia Legal corresponde a 8,6% do total do Brasil — fatia que vem aumentando. Para se chegar ao valor proposto, a Amazônia precisaria gerar uma riqueza quase duas vezes maior à de São Paulo, estado mais rico do Brasil, hoje responsável por 31% do PIB.

Nenhuma organização indígena foi envolvida no projeto. Elas ficaram sabendo do projeto Barão de Rio Branco pela imprensa.

Em uma nota técnica, quatro organizações afirmaram que o projeto do governo “causará impactos destrutivos e irreversíveis para nós, povos indígenas, e o nosso modo de vida, baseado no uso sustentável dos recursos naturais, fato que permitiu até aqui a conservação de uma das áreas de maior preservação ambiental do planeta”. O texto é assinado pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira, Articulação dos Povos Indígenas do Amapá e Norte do Pará e pela Federação dos Povos Indígenas do Pará.

Segundo o documento dos indígenas, publicado em maio, o plano “rasgaria pelo meio” terras indígenas reconhecidas pelo estado brasileiro — o que o tornaria inconstitucional.

No total, o projeto Barão de Rio Branco afetaria 27 terras indígenas e áreas protegidas da chamada Calha Norte — a terra indígena Wajãpi, no Amapá, onde foi relatado o assassinato de um cacique por garimpeiros, é uma delas.

Terras indígenas na Calha Norte que seriam afetadas pelo projeto Barão do Rio Branco.
Mapa: Combate Racismo Ambiental

3 – UMA ANTIGA OBSESSÃO DOS MILITARES

Não é a primeira vez que as Forças Armadas traçam um plano de defesa da Amazônia — e nem que ignoram a população indígena que vive no local. O Exército tem uma preocupação antiga com as fronteiras do norte.

O país tem, desde o século 18, políticas de desenvolvimento para a região, passando pela Superintendência para a Valorização Econômica da Amazônia de Getúlio Vargas, até chegar ao governo instalado após o golpe de 1964. Conhecida como Operação Amazônia, o plano de colonização criado na ditadura militar visava integrar nos anos 1960 o território com estradas, povoando seus entornos com empreendimentos agrícolas e empresariais. Seu lema revela o objetivo: “ocupar para não entregar”.

“Havia um aspecto da doutrina que dizia que o Brasil não podia ter espaços vazios porque seriam ameaças à segurança nacional”, me disse João Alberto Martins Filho, que pesquisa as Forças Armadas há três décadas. “O conceito era de que era necessário vivificar as regiões com baixa ocupação populacional, e isso se transformou em política de estado”.

Além de criar órgãos para isso, como a Sudam, Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia, os militares investiram em megaobras de infraestrutura na região. Para garantir a implantação do plano, atacaram os ambientalistas — acusados de apátridas e inimigos da nação — e passaram por cima dos povos tradicionais – os indígenas e quilombolas.

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Vista aérea de garimpo ilegal próximo à terra indígena 
Menkragnoti, em Altarima, em agosto passado.
Foto: João Laet/AFP/Getty Images

Durante a construção da BR-174, a Manaus-Boa Vista, por exemplo, o Exército realizava “demonstrações de força” com metralhadoras, granadas e dinamites contra os indígenas Waimiri-Atroari. A ideia era mostrar que os militares eram muito mais fortes do que eles. “A estrada é irreversível, como é a integração da Amazônia ao país. A estrada é importante e terá que ser construída, custe o que custar. Não vamos mudar o seu traçado, que seria oneroso para o batalhão, apenas para pacificarmos primeiro os índios”, disse em 1975 o Coronel Arruda, comandante do 6º Batalhão de Engenharia e Construção, em depoimento disponível no relatório da Comissão Nacional da Verdade.‘Exército se preocupa com a presença de ambientalistas, ONGs e até da Igreja Católica, vistos como manipuláveis e que permitiriam a internacionalização da Amazônia’.

O embate não ficou só no campo da demonstração: milhares de indígenas foram massacrados. Em 1972, havia cerca de 3 mil Waimiri-Atroari. Em 1983, eram 350.

“Os militares ignoravam completamente a existência da população indígena”, diz Martins Filho. Estima-se que mais de 8 mil indígenas tenham sido mortos durante o regime — eles eram vítimas de envenenamento, pistolagem, confronto com militares, fazendeiros e de doenças trazidas pelos brancos durante a colonização e as grandes obras, principalmente rodovias.

A intenção do governo com a construção de estradas era trazer pessoas do nordeste e do sul do país para começarem a ocupar a região. Mas o processo era precário: não havia água, eletricidade, escolas. Muitas vezes, os colonos eram largados na beira da estrada sem nada — nem mesmo a demarcação dos lotes de terra. Muitos não resistiram às condições adversas na Amazônia, como a malária. A estratégia é apontada como uma das origens dos conflitos fundiários que acontecem até hoje na região — e, apesar de ter promovido um aumento na população dos estados na Amazônia legal, passou longe de conseguir ocupar e desenvolver o território do jeito que os militares esperavam.

Com o fim da guerra fria, o contexto geopolítico mudou, e a preocupação dos militares passou a ser os EUA. Entre os anos 1980 e 1990, começou a surgir na comunidade internacional uma discussão sobre se o Brasil estava falhando em proteger a Amazônia.

Os quartéis passaram a temer que os americanos invadissem a floresta sob a justificativa de proteger o meio ambiente global. O receio foi abrandado com políticas ambientais mais efetivas, como a criação do Ibama, e se manteve relativamente discreto nos governos de Fernando Henrique Cardoso e Lula. Mas, com a crise econômica e a oposição dos militares ao governo de Dilma Rousseff, as teses sobre a perda de soberania na região voltaram a fermentar.

Hoje, o Exército acredita que há uma “grande estratégia indireta” de anulação do estado brasileiro na Amazônia. A tese tomaria o lugar do medo de uma invasão militar, popular na caserna durante a ditadura. A dissolução do estado brasileiro na região aconteceria com apoio internacional para que os indígenas fundassem novas nações baseadas em etnias. Há um temor antigo, por exemplo, de que os Yanomami brasileiros se juntem com os venezuelanos na criação da nação Yanomami.

É por isso que o Exército se preocupa com a presença de ambientalistas, ONGs e até da Igreja Católica no local, vistos como passíveis de manipulação por outros países e que permitiriam a internacionalização da Amazônia.

A realização do Sínodo da Amazônia, em outubro deste ano, por exemplo, é vista com preocupação pela cúpula militar por seu “viés político”. No encontro, organizado pelo Vaticano, 250 bispos líderes da Igreja Católica discutirão por 21 dias o tema “Amazônia: novos caminhos para a Igreja e para uma ecologia integral”. Em uma apresentação em agosto, os generais Alberto Cardoso e Villas Bôas disseram que o Sínodo, a mídia, os governos, a ONU, as ONGs e o Cimi, o Conselho Indigenista Missionário, são os “instrumentos” para a “grande estratégia indireta”.

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Floresta incendiada em Altamira, no Pará, em agosto passado.
Fotos: João Laet/AFP/Getty Images

4DA CRISE À OPORTUNIDADE

O governo queria que o projeto Rio Branco fosse viabilizado por um decreto em um prazo de 100 dias a partir de janeiro, mas isso não aconteceu. O plano, no entanto, tem sido discutido em reuniões fechadas. Seu coordenador, o coronel Raimundo César Calderaro, foi em fevereiro ao Rio de Janeiro se reunir com engenheiros do Instituto Militar de Engenharia para tratar do projeto. Também procurou cartas cartográficas da região feitas pela Marinha. Em março, discutiu o plano com o Secretário de Assuntos Estratégicos do governo, general Santa Rosa.

O projeto também foi apresentado em abril a empresários do agronegócio na sede da Federação da Agricultura e Pecuária do Pará. Dentro do Palácio do Planalto, foram feitas várias reuniões para discutir o assunto. A última delas, em 19 de junho, contou com a participação do general Santa Rosa, do secretário de Planejamento Estratégico, Wilson Trezza, e do diretor de Assuntos Internacionais Estratégicos, Paulo Érico Santos de Oliveira. Não há, na agenda oficial, registro de participação de autoridades do Ministério do Meio Ambiente nessas discussões.

Segundo a Secretaria de Assuntos Estratégicos, o programa Barão do Rio Branco “ainda se encontra em fase de discussão e de amadurecimento”. “Está prevista a constituição de um grupo de trabalho interministerial, por meio de Decreto, para a elaboração do Programa Barão do Rio Branco. No entanto, ainda não há data para publicação”, disse a assessoria de imprensa do órgão.

A secretaria afirmou que não houve visita oficial de comitiva interministerial para apresentação do programa no Pará. Não é verdade. Segundo o Portal Transparência, César Calderaro foi à Santarém em visita oficial de comitiva interministerial em fevereiro de 2019, com recursos da própria secretaria. Discutiu o projeto, inclusive, com o prefeito de Santarém, Nélio Aguiar, do Democratas, e o encontro foi registrado publicamente no Facebook.

Desde agosto, a Amazônia tem sido o palco da maior crise internacional no governo Bolsonaro. Por causa do desmatamento recorde e das queimadas de grandes proporções, autoridades estrangeiras têm mostrado preocupação sobre a eficiência do Brasil em cuidar da maior floresta tropical do mundo — e reacenderam os velhos temores dos militares sobre a suposta internacionalização da Amazônia.

Emmanuel Macron, presidente da França, cobrou publicamente ações do governo brasileiro para proteger a região. O presidente francês cogitou solicitar “status internacional” à Amazônia – pedir à ONU que ela seja gerida por outros países – se a catástrofe ambiental continuar.

Autointitulada “sem ideologia”, a gestão de Bolsonaro e de seu ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, é marcada pelo desmonte do Ibama e de órgãos de monitoramento, como o Inpe. Em campanha, Bolsonaro avisou que não demarcaria nem “mais um centímetro” de terras indígenas, e, quando assumiu, colocou Nabhan Garcia — um ruralista conhecido por gostar de fuzis para expulsar supostos invasores de terras — à frente da reforma agrária e das demarcações.

O resultado? Em 2019, dados prévios indicam que o desmatamento é 50% maior do que no ano passado — e a estimativa pode ser maior, já que os dados consolidados no final de ano costumam ser muito maiores do que os dados divulgados mês a mês pelo Inpe. Segundo esse sistema, julho foi o pior mês, com um aumento de 278% no desmatamento em relação a julho do ano passado.RelacionadoMilícias e fuzis: as más companhias de Nabhan Garcia, o homem de Bolsonaro para a reforma agrária

Embora os incêndios sejam comuns nessa época do ano, dados do Inpe também mostram que, este ano, as queimadas aumentaram 84% em relação ao período de janeiro a agosto de 2018. E há evidências de que muitos focos foram causados de propósito por madeireiros e grileiros em apoio à política de Bolsonaro de afrouxar a fiscalização ambiental. Pior: o governo foi alertado pelo Ministério Público do Pará que seus apoiadores fariam as queimadas, nas margens da mesma BR-163 que o governo quer expandir, mas não fez nada. O Ibama diz que não agiu por falta de proteção para seus fiscais.

Acuado, Bolsonaro seguiu a cartilha do projeto Rio Branco na resposta à crise. Primeiro, acusou ONGs de terem provocado os incêndios para “chamar atenção”. Em uma reunião com governadores dos estados da Amazônia Legal há duas semanas, afirmou que reservas indígenas têm a intenção de “inviabilizar o país” e que políticas de proteção usaram indígenas “como massa de manobra” e impediram que as riquezas da região fossem usadas “para o bem comum”. Também disse que as ONGs são uma maneira de deixar intacta a Amazônia para “futura exploração de outros países”.‘O objetivo dos militares, pensando estrategicamente, é esse: se reaproximar do governo’.

O tom foi alinhado com a cúpula militar. O general Villas-Bôas disse que a manifestação de Macron foi um “ataque direto à soberania brasileira”; Heleno, que “querem frear nosso inevitável crescimento econômico”; e Mourão, que transformar os incêndios em crise “é má-fé de quem não sabe que os pulmões do mundo são os oceanos, não a Amazônia”.

Para Martins Filho, o Exército, que enfrentava um mal-estar com o alto escalão do Planalto, em Brasília, viu na crise uma oportunidade. “O objetivo dos militares, pensando estrategicamente, é esse: se reaproximar do governo”, me disse o pesquisador.

Perguntei ao Exército sobre o projeto Rio Branco e preocupações com a soberania nacional na Amazônia. Por meio de sua assessoria de imprensa, a instituição afirmou que não responde sobre o projeto e não tem declarações a fazer sobre o tema. Também afirmou que o coronel Calderaro não fala pelo Exército. Questionado a respeito, o ministério do Meio Ambiente não respondeu se o projeto Rio Branco avançou.

Já a Secretaria Nacional de Assuntos Estratégicos afirmou que o governo deverá criar, por decreto, um Grupo de Trabalho Interministerial para discutir o projeto. Com ele, o governo planeja o “desenvolvimento com maior presença das instituições de Estado na região da Calha Norte”. “O que se espera é o desenvolvimento a integração da Região da Calha Norte, com benefícios para a população, que, hoje, em sua maioria, vive abaixo da linha da pobreza.”

Colaborou: Manuella Libardi (Open Democracy)

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The Intercept: Moro autorizou investigar mesmo quem não tinha nada a ver com o processo https://nocaute.blog.br/2019/09/11/the-intercept-moro-autorizou-investigar-mesmo-quem-nao-tinha-nada-a-ver-com-o-processo/ Wed, 11 Sep 2019 14:26:54 +0000 https://nocaute.blog.br/?p=54174 O Ministério Público Federal (MPF) pediu duas vezes ao então juiz Sergio Moro, investigações contra Nathalie Angerami Priante Schmidt Felipppe, filha do empresário Raul Schmidt, alvo da operação Lava Jato, mesmo sabendo que não havia nenhuma suspeita que pesasse sobre ela. Essas são informações divulgadas na manhã desta quarta-feira (11), de vazamentos obtidos pelo site The Intercept. Em um trecho da conversa, o procurador Diogo Castor de Mattos diz claramente que a ação contra a filha visava criar um "elemento de pressão" para que o empresário, que estava em local ignorado, se entregasse. Moro, que acolheu o pedido na época, agora não quer comentar o caso, como de costume.

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O Ministério Público Federal (MPF) pediu duas vezes ao então juiz Sergio Moro, investigações contra Nathalie Angerami Priante Schmidt Felipppe, filha do empresário Raul Schmidt, alvo da operação Lava Jato, mesmo sabendo que não havia nenhuma suspeita que pesasse sobre ela. Essas são informações divulgadas na manhã desta quarta-feira (11), de vazamentos obtidos pelo site The Intercept. Em um trecho da conversa, o procurador Diogo Castor de Mattos diz claramente que a ação contra a filha visava criar um “elemento de pressão” para que o empresário, que estava em local ignorado, se entregasse. Moro, que acolheu o pedido na época, agora não quer comentar o caso, como de costume.

Deu no The Intercept Brasil

O Ministério Público Federal pediu duas vezes ao então juiz Sergio Moro operações contra a filha de um alvo da Lava Jato que vive em Portugal como forma de forçá-lo a se entregar. Apesar de ser titular de contas no exterior que receberam propinas, ela não era suspeita de planejar e executar crimes.

O plano, revelado em mensagens de Telegram trocadas entre procuradores e entregues ao Intercept por uma fonte anônima, era criar um “elemento de pressão”, como disse o procurador Diogo Castor de Mattos, sobre o empresário luso-brasileiro Raul Schmidt. O MPF apelou a Moro mirando na filha do investigado: queria que o passaporte de Nathalie fosse cassado e que ela fosse proibida de sair do Brasil. O plano era forçá-lo a se entregar para evitar mais pressão sobre a filha.

Na primeira tentativa, Moro vetou a manobra dos procuradores. “Apesar dos argumentos do MPF, não há provas muito claras de que Nathalie Angerami Priante Schmidt Felippe tinha ciência de que os valores tinham origem ilícita e/ou eram fruto de atos de corrupção”, argumentou num despacho.

A tentativa frustrada dos procuradores de cassar o passaporte de Nathalie para pressionar o pai a se entregar ocorreu em fevereiro de 2018. A justiça portuguesa havia determinado o cumprimento da extradição de Schmidt para o Brasil no mês anterior, mas ele não foi encontrado onde morava, em Lisboa, pelas autoridades locais.

Em maio daquele ano, após novo fracasso em buscas por Schmidt em Portugal, a Lava Jato reapresentou seu pedido a Moro. Dessa vez, sem que houvesse qualquer suspeita adicional contra ela, o juiz mudou de ideia e deu sinal verde ao desejo da Lava Jato, que incluía uma varredura na casa, nas comunicações e nas contas de Nathalie.

No dia seguinte, os policiais cumpriram o mandado de busca e apreensão na casa da filha do investigado, no Rio de Janeiro. A defesa alegou que ela foi coagida pela Polícia Federal, na ocasião, a dizer onde o pai estava. O plano, no entanto, não teve tempo de ser testado. No mesmo dia, Raul Schmidt conseguiu extinguir seu processo de extradição em Portugal. A Lava Jato tenta até hoje trazê-lo ao Brasil.

Suspeito de operar o pagamento de propinas na Petrobras, o empresário Raul Schmidt é alvo da Lava Jato desde março de 2016.
Suspeito de operar o pagamento de propinas na Petrobras, o empresário Raul Schmidt é alvo da Lava Jato desde março de 2016. GIF: Reprodução/YouTube/SBT

“PENSAMOS EM FAZER UMA OPERAÇÃO NELA PARA TENTAR LOCALIZÁ-LO”

APONTADO COMO OPERADOR DE PROPINAS para ex-dirigentes da Petrobras, o empresário Raul Schmidt foi preso pela primeira vez em março de 2016, na 25ª fase da Lava Jato. Na primeira etapa internacional da operação, ele foi encontrado e detido em Lisboa, onde vivia. Dias depois, quando foi liberado para responder ao processo em prisão domiciliar, o Brasil já havia pedido sua extradição.

O requerimento foi aceito em dezembro de 2016, e o último recurso da defesa de Schmidt foi derrubado em 9 de janeiro de 2018, após o caso chegar ao Tribunal Constitucional de Portugal – equivalente ao STF brasileiro. Quinze dias depois, a justiça em Lisboa emitiu um mandado de detenção contra Raul, para que ele fosse entregue às autoridades brasileiras.

A notícia da ordem de prisão em Portugal foi dada pelo procurador Roberson Pozzobon no grupo de Telegram Filhos do Januario 2, que reunia apenas membros da força-tarefa da Lava Jato no Paraná. Mas Diogo Castor de Mattos, que estava à frente do caso, esfriou os ânimos da equipe 10 minutos mais tarde: “Msg do mp português: Olá Diogo, eu acho que ele fugiu. Ninguém o encontra”.

Mais de uma semana depois, Raul ainda estava desaparecido. Foi quando Castor de Mattos expôs aos colegas uma ideia para fazê-lo aparecer:

A sugestão de Castor acabou aceita. No dia seguinte, 2 de fevereiro, o MPF pediu a Moro que a filha de Raul Schmidt fosse proibida de deixar o Brasil. Não queria apenas a apreensão do passaporte, mas também outras medidas: busca e apreensão na casa de Nathalie, bloqueios em contas bancárias dela e da empresa dela, quebras de sigilo fiscal e do sigilo das mensagens de um número dela no WhatsApp.

O MPF justificou as medidas com evidências de que Nathalie era beneficiária de contas bancárias no exterior abastecidas com dinheiro pago a Raul Schmidt por multinacionais investigadas na Lava Jato. Parte desses valores, segundo o Ministério Público, foi usada na compra de um apartamento em Paris registrado no nome de uma empresa pertencente a Nathalie.

Na petição ao então juiz federal, os procuradores informaram que a filha de Schmidt havia pedido recentemente a renovação de seu passaporte brasileiro. E defenderam “a imprescindibilidade da aplicação da medida cautelar em face de Nathalie para assegurar a aplicação da lei penal brasileira, na medida em que, no exterior, a investigação e processamento de seus crimes estaria indubitavelmente prejudicada”.

Os argumentos da petição são bastante diferentes dos discutidos no Telegram. Ou seja, enquanto argumentava no processo que Nathalie não poderia sair do país para não prejudicar a investigação sobre os crimes que teria cometido, no Telegram os procuradores admitiam que a finalidade das medidas era pressionar Schmidt.

Um dia depois, em 3 de fevereiro, Raul foi encontrado e preso em Sardoal, a cerca de uma hora de carro de Lisboa. Os procuradores foram informados no mesmo dia e comemoraram a captura no grupo Filhos de Januario 2, mas não fizeram menção às medidas contra Nathalie, que haviam requisitado na véspera.

Moro só respondeu em 5 de fevereiro. No despacho em que tratou do assunto, o magistrado não viu “causa suficiente” para a ação mais drástica pedida pelo MPF contra Nathalie — proibi-la de deixar o país. O juiz escreveu que não havia comprovação suficiente de culpa e que o nome dela era inédito nas investigações até ali.

Sergio Moro no desfile de Sete de Setembro em Brasília, ao lado de Jair Bolsonaro e do ministro Onyx Lorenzoni, que já confessou crime de caixa dois eleitoral.
Sergio Moro no desfile de Sete de Setembro em Brasília, ao lado de Jair Bolsonaro e do ministro Onyx Lorenzoni, que já confessou crime de caixa dois eleitoral. Foto: Pedro Ladeira/Folhapress

“Apesar dos argumentos do MPF, não há provas muito claras de que Nathalie Angerami Priante Schmidt tinha ciência de que os valores tinham origem ilícita e/ou eram fruto de atos de corrupção praticado por Raul Schmidt Felippe Junior”, escreveu Moro. E emendou: “O nome dela, ademais, só apareceu agora nas investigações, aparentando ser talvez prematuro de pronto impor-lhe medida de restrição de locomoção pessoal”.

Tendo negado a cassação do passaporte de Nathalie, Moro perguntou ao MPF se as demais medidas contra ela (bloqueios de contas e quebras de sigilo fiscal e de comunicações no WhatsApp) ainda eram necessárias, considerando que Raul já havia sido preso em Portugal dois dias antes.

Isso significa que o juiz, assim como o MPF, justificou a operação contra Nathalie pelo fato de Raul estar foragido. Uma vez que ele foi encontrado, a força-tarefa da Lava Jato não viu mais motivos para impor as restrições a ela.

Raul, no entanto, acabaria não sendo extraditado: ele  foi solto 12 dias após a prisão, para responder em liberdade ao julgamento do recurso.

O processo contra Nathalie ficou adormecido até que o MPF o utilizasse, mais de três meses depois, com o mesmo objetivo de capturar o pai. No dia 18 de maio de 2018, a justiça portuguesa determinou o cumprimento imediato da ordem de extradição. Quatro dias depois os procuradores pediram a Moro, com urgência, o cumprimento das medidas contra Nathalie, afirmando que Raul “se evadiu” ao ser procurado pelas autoridades.

Desta vez, Moro acatou o desejo dos procuradores, sem qualquer incremento nas provas contra ela. O MPF não fez nenhum adendo ao processo, apenas reapresentou o pedido que fizera em fevereiro.

Nathalie teve o passaporte retido e foi alvo de busca e apreensão em casa, no Rio de Janeiro, em 24 de maio. Nessa busca, segundo a defesa dela alegou quatro dias depois em pedido de habeas corpus ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região, “três agentes da Polícia Federal portando metralhadora ingressaram na residência da paciente de forma truculenta, exigindo, aos berros, que ela revelasse o atual paradeiro do seu genitor, sob ameaça de ‘evitar dor de cabeça para seu filho’”, referindo-se à criança dela, um menino então com sete anos.

No entanto, o principal objetivo das medidas, que era aumentar as chances de prisão de Raul Schmidt em Portugal, esvaziou-se logo em seguida. No mesmo dia em que Nathalie foi visitada pela PF no Rio, um desembargador do Tribunal de Relação de Lisboa (primeira instância a que Schmidt recorria) determinou o cancelamento da extradição do empresário, que voltou a responder em liberdade. Assim, a segunda tentativa de usar a perseguição à filha para pressiona-lo fracassou.

A extradição de Raul foi arquivada pela justiça portuguesa em janeiro de 2019, e o Ministério Público do país recorre da sentença desde então. Nathalie foi denunciada pela Lava Jato por lavagem de dinheiro pela compra do imóvel em Paris no final de 2018, mas o caso corre, até hoje, sob sigilo.

QUESTIONADO A RESPEITO DO CASO PELO INTERCEPT, o Ministério Público Federal alegou que “os procuradores da força-tarefa Lava Jato formulam pedidos cautelares ou denúncias apenas quando estão presentes os requisitos legais”, e que “Nathalie Schmidt foi beneficiária de contas secretas que receberam milhões de dólares ilícitos no exterior, podendo estar sujeita, por tais condutas, a sanções criminais”.

Questionada sobre as ameaças relatadas pela defesa de Nathalie Schmidt, a Polícia Federal disse que “supostos envolvidos, caso intimados, devem se manifestar em juízo para apresentarem suas versões”.

O ex-juiz Sergio Moro, atual ministro da Justiça e Segurança Pública do governo de extrema direita de Jair Bolsonaro, também foi procurado para comentar o caso. A manifestação dele será incluída no texto assim que for enviada.

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The Intercept: Chegou a vez de Eduardo Cunha aparecer no circo da Lava Jato https://nocaute.blog.br/2019/09/10/chegou-a-vez-de-cunha-aparecer-no-circo-da-lava-jato/ Tue, 10 Sep 2019 14:43:49 +0000 https://nocaute.blog.br/?p=54108 "O desafio nesse caso vai ser escapar das milhares de cascas de banana que ele vai deixando pelo caminho". Este é apenas uma das várias conversas entre procuradores da Lava Jato, obtidas pelo site The Intercept e divulgados nesta manhã de ter-feira (10) pelo UOL. Os diálogos mostram que procuradores da operação optaram por não dar prosseguimento a uma denúncia de manipulação de escolha do relator do processo de cassação do ex-presidente Eduardo Cunha, preso há três anos, mesmo considerando-a importantes.

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“O desafio nesse caso vai ser escapar das milhares de cascas de banana que ele vai deixando pelo caminho”. Este é apenas uma das várias conversas entre procuradores da Lava Jato, obtidas pelo site The Intercept e divulgados nesta manhã de ter-feira (10) pelo UOL. Os diálogos mostram que procuradores da operação optaram por não dar prosseguimento a uma denúncia de manipulação de escolha do relator do processo de cassação do ex-presidente Eduardo Cunha, preso há três anos, mesmo considerando-a importantes.

Deu no UOL

Procuradores da Operação Lava Jato optaram por não dar prosseguimento a uma denúncia de manipulação de escolha do relator do processo de cassação do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (MDB-RJ), preso desde outubro de 2016, mesmo considerando-a importante. O relato da suposta fraude foi feito pelo próprio ex-deputado ao propor delação premiada — não aceita pelo MPF (Ministério Público Federal).

O procurador da Lava Jato Orlando Martello mencionou supostas “bolas mais pesadas no sorteio da relatoria” do Conselho de Ética em mensagens do Telegram obtidas pelo site The Intercept e analisadas pelo UOL. Mas a denúncia não foi averiguada.

UOL confirmou com pessoas ligadas a Cunha que sua proposta de colaboração premiada com a Lava Jato incluía essa denúncia de fraude na escolha de relatores no Congresso.

Segundo a reportagem apurou, Cunha acusou o ex-presidente do Conselho de Ética, José Carlos Araújo (PR-BA), de indicar um relator mais favorável ao próprio Cunha. “Bola mais pesada” é uma expressão que sugere manipulação (por ser mais “pesada”, ela se destaca demais) —o sorteio, no entanto, foi feito com papéis.

Segundo pessoas ligadas ao ex-presidente da Câmara, ele denunciou à Lava Jato que Araújo lhe enviou interlocutores com um “recado”. O presidente do Conselho de Ética apresentou os nomes que seriam sorteados e depois aquele que acabaria sendo escolhido para relatar o processo: Fausto Pinato (PP-SP). Ouvidos pelo UOL, Araújo e Pinato negaram a existência de fraude.

Cunha, presidente da Câmara na ocasião, abriu o processo de impeachment que culminou com o afastamento da então presidente Dilma Rousseff (PT), em maio de 2016. O próprio Cunha seria cassado e preso pela Operação Lava Jato dez meses depois, em outubro daquele ano.

Em 1º de agosto de 2017, ao analisar documentos em que o ex-presidente da Câmara narrava a suposta fraude na relatoria, os procuradores da Lava Jato se impressionaram, de acordo com as mensagens.

Realmente esse é um fato que talvez não devesse ser sonegado da sociedade. Isso mostra/expõe como ainda somos um País subdesenvolvido, em que os políticos estão tão distantes da realidade”
Orlando Martello, procurador da Lava Jato

Juristas ouvidos pela reportagem dizem que não se pode ignorar uma denúncia grave. Isso poderia ser considerado crime, já que o Ministério Público não pode escolher o que investigar e o que não investigar.

Nenhuma assessoria dos procuradores que negociaram o acordo quis comentar o fato, alegando sigilo. No entanto, sob anonimato, um dos participantes dos chats reconheceu que o modelo de tratar colaborações premiadas do Ministério Público resultava num “tudo ou nada”, o que deixava alguma coisa “para trás”. Ainda assim, segundo esse interlocutor, o saldo das delações seria positivo para a elucidação dos crimes e devolução de dinheiro para o país.

“Acordo Cunha”

As mensagens do aplicativo Telegram foram trocadas em um grupo chamado “Acordo Cunha”. Neles, participavam procuradores das forças-tarefa da Lava Jato em Curitiba, Rio de Janeiro, Natal e na Procuradoria Geral da República (PGR), em Brasília. Também participavam investigadores da Operação Greenfield, em Brasília.

O grupo foi criado por um procurador da PGR em junho de 2017, quando o advogado de Eduardo Cunha, Délio Lins e Silva Júnior, trouxe uma oferta de colaboração premiada. Ele havia falado com o cliente no presídio, em Pinhais (PR), na região metropolitana de Curitiba.

A maioria dos procuradores que se manifestaram no grupo de Curitiba achava melhor rejeitar a tratativa de acordo com Cunha. No entanto, o procurador Orlando Martello disse que deixar de investigar a denúncia da manipulação de relatores seria “lamentável”.

No dia anterior, em 31 de julho de 2017, o procurador disse que, de todas as informações prestadas pelo ex-deputado, aquele era “o anexo mais interessante”.

O documento com todas as acusações do ex-presidente da Câmara chegou a ser entregue aos procuradores da Lava Jato, segundo apurou o UOL. Ele foi compartilhado duas vezes no fim de julho daquele ano no grupo de Telegram que reunia os investigadores.

A proposta de delação foi rejeitada. Mas parte do grupo de procuradores defendia manter as negociações abertas com Cunha. “Há vários fatos que o Cunha esclarece enquanto que [o doleiro Lúcio] Funaro [que fechou colaboração semanas depois] não consegue, por não dominar a história toda”, escreveu Anselmo Lopes, em 30 de julho de 2017, procurador em Brasília, que atuava na Operação Greenfield e tinha informações sobre os dois casos.

A rejeição à denúncia de Cunha se deu porque ele não tratou de outras pessoas e fatos de interesse do Ministério Público. Eles queriam informações e acusações sobre Carlos Marun (MDB-MS), ex-ministro da Secretaria de Governo de Michel Temer (MDB), autoridades do Judiciário do Rio de Janeiro, fatos de suposta compra de votos para a eleição à Presidência da Câmara e repasses de dinheiro feitos pelo lobista Júlio Camargo e pelo empresário Joesley Batista, da JBS.

Cunha também “concorria” com a colaboração premiada do doleiro Lúcio Funaro, em negociação na mesma época. Os procuradores avaliavam se era necessário fechar acordo com um ou com os dois.

Escolha era feita com sorteio e decisão de deputado

As mensagens dos procuradores no Telegram contêm uma imprecisão: elas mencionam “bolas mais pesadas” para fraudar o sorteio da relatoria da comissão do processo de cassação do então deputado, embora a escolha tenha sido feita por meio de urnas de madeira.

Pelas regras da Casa, esse sorteio define uma lista tríplice. Depois dele, o presidente do Conselho de Ética da Câmara decide quem será o relator do caso que pode cassar o mandato de um colega.

Pessoas ligadas a Cunha disseram ao UOL que o ex-deputado ouviu a existência das bolas de peso adulterado por parte de José Carlos Araújo, quando recebeu a proposta de ter um deputado aliado cuidando de seu processo.

Mas na verdade, a escolha dos relatores era feita por meio de urnas de madeira com papéis com os nomes e fotos dos parlamentares.

De acordo com fontes ouvidas pelo UOL, Cunha narrou que Araújo mandou o recado com os nomes dos três relatores que seriam sorteados dias depois: Vinícius Gurgel (PR-AP), Zé Geraldo (PT-BA) e Fausto Pinato (PP-SP). E já teria adiantado que, após o sorteio, escolheria Pinato por ser da base aliada e disposto a dar um tratamento favorável ao então presidente da Câmara. Foi exatamente o que aconteceu. Na visão dos aliados de Cunha, Pinato não o iria prejudicar no Conselho.

No início, o próprio Pinato era considerado um aliado do emedebista, por ser do mesmo bloco parlamentar do presidente da Câmara. Réu na Justiça à época, ele teve que mostrar o contrário, assim que assumiu o cargo, em 5 de novembro de 2015: “Sou um cara independente”.

Pinato votou pela continuidade do processo de cassação. Em resposta, Cunha manobrou para retirá-lo da relatoria. Em entrevista em 11 de dezembro de 2015, Pinato disse que recebeu três ofertas de propina, mas disse não saber de onde vinham as propostas.

Com a saída de Pinato, foi escolhido outro parlamentar em dezembro para cuidar do caso, na urna de madeira. Marcos Rogério (DEM-RO) assumiu a relatoria do processo de cassação de Cunha. Não há, no entanto, indícios de que essa indicação foi fraudulenta. Marcos Rogério afirmou à reportagem que ignora qualquer esquema de adulteração da escolha. Ele votou pela cassação de Cunha, decisão que acabou sendo tomada pelo plenário da Câmara em setembro de 2016.

Lava Jato se empolgou com delação de Cunha

As mensagens do aplicativo Telegram mostram que os procuradores se empolgaram quando receberam a notícia de que o advogado de Cunha trazia proposta de uma colaboração premiada. “Esse aí tem assuntos do RJ desde a década de 80”, disse o procurador da Lava Jato no Rio Rodrigo Barreto, em 13 de junho de 2017.

No entanto, havia desconfianças. Em 6 de julho daquele ano, os investigadores rejeitaram assinar um acordo de confidencialidade antes de lerem o documento que contém a proposta de delação do ex-presidente da Câmara. Mencionam “milhares de cascas de banana” vindas de uma pessoa “ardilosa” do “submundo da bandidagem”.

O procurador Ronaldo Pinheiro de Queiroz, da Lava Jato na Procuradoria Geral da República (PGR), em Brasília, criador do grupo de Telegram “Acordo Cunha”, fez um alerta:

Pois é, estamos lidando com uma das pessoas mais ardilosas do país, cuja formação foi forjada no submundo da bandidagem. Todo cuidado é pouco”
Ronaldo Pinheiro de Queiroz, procurador em mensagem de 6 de julho de 2017

A proposta de colaboração de Cunha continha denúncias contra o então presidente da República, Michel Temer (MDB), que sofria processos criminais que poderiam levar a seu impeachment. Em 8 de julho, o coordenador da Lava Jato em Curitiba, Deltan Dallagnol, avalia se Cunha teria “provas fortes” contra Rodrigo Maia, o presidente da Câmara à época, e possível sucessor de Temer.

Se EC tiver provas fortes contra [Rodrigo] Maia e este é candidato forte em eleições indiretas, a variável que pode preocupar EC [Eduardo Cunha] é mais a nova PGR [Raquel Dodge] do que a queda do Temer”
Deltan Dallagnol, em mensagem de Telegram de 8 de julho de 2017

Orlando Martello avalia que as acusações de Cunha em sua delação perderiam valor se Michel Temer fosse cassado. Ao fim, os procuradores decidem não continuar a negociar uma colaboração com Cunha. “Péssimos elementos de corroboração, omissões evidentes, incosistências [sic], entre outros pontos”, diz Ronaldo Queiroz, em 10 de agosto.

Essa rejeição se deveu também ao fato de que, na Operação Lava Jato, o Ministério Público entende a colaboração premiada como “negócio jurídico”. Nela, investigadores e investigados acertam o que é interessante para ambas as partes.

No entanto, dez dos 11 ministros do Supremo Tribunal Federal em junho de 2018 determinaram —em um processo em que concordaram com uma nota técnica da Polícia Federal— que a colaboração é apenas um “meio de obtenção de prova” para se buscar a verdade, como prevê a Lei 12.850, de 2013.

Dois altos investigadores da Polícia Federal ouvidos pela reportagem entendem que, se esse modo de encarar as delações determinado pela lei e pelo STF tivesse sido aplicado ao caso de Eduardo Cunha, informações sobre a fraude no Congresso não seriam ignoradas. Isso porque, todas os dados seriam checados e, apenas na proporção em que fossem verdadeiros e úteis, renderiam um benefício na pena do ex-deputado. Sob condição de anonimato, um deles disse que houve uma “distorção”.

Consultado sobre o caso sem saber que se tratava de Eduardo Cunha, o advogado Daniel Gerber disse ao UOL que, em tese, os procuradores que rejeitam uma denúncia importante em acordo de colaboração cometem prevaricação. “Se merece uma investigação, tem que ser investigado, tem que fazer uma colaboração, por menor que ela seja. Se eu não faço acordo e não investigo, em tese é uma prevaricação”, avaliou ele, que é mestre em Ciências Criminais pela PUC do Rio Grande do Sul.

Também sem saber o nome do personagem da proposta de delação, o advogado Antônio Sérgio Moraes Pitombo disse que a Procuradoria não pode fechar os olhos para uma denúncia, ainda que no futuro ela se comprove falsa. “O Ministério Público não tem a possibilidade de escolher o que investiga”, diz o doutor em direito penal e autor de livros sobre lavagem de dinheiro e organização criminosa.

“Se você tem uma notícia no jornal, ainda que falsa, de que eu pratiquei uma infração penal, tem que se abrir o inquérito, até para apurar se é falso”, afirmou. Caso realmente parte das informações sejam falsas ou não produzam efeitos na investigação, os benefícios dados podem ser retirados, disse Pitombo. Ou, como defendeu a Polícia Federal em nota técnica no julgamento em que saiu vencedora no STF, os benefícios sequer serão concedidos ao colaborador.

No julgamento do STF, em junho de 2018, o ministro Marco Aurélio disse a polícia tem um “poder-dever” de investigar. E, no caso específico, de levar ao Judiciário proposta de colaboração premiada recebida de um suspeito caso isso seja necessário.

O voto-vencedor no julgamento do STF se baseou numa nota técnica da PF escrita pelos delegados Élzio Vicente e Denisse Ribeiro. Em livro sobre colaboração premiada lançado após o julgamento, eles defendem que até a recusa de uma proposta de delação – como aconteceu com Eduardo Cunha – precisaria ser justificada em nome da transparência.

“O agente público deve registrar a impossibilidade de formalização do acordo, de maneira fundamentada”, escreveram Vicente e Denisse em “Colaboração Premiada e Investigação”, lançado em agosto de 2018.

Defesa dizia que Cunha não falou o que MPF queria ouvir

Em 14 de setembro de 2017, um mês depois de ter seu acordo rejeitado, Cunha foi denunciado pela PGR, que utilizou informações de delatores. A defesa do ex-deputado disse que os colaboradores falaram apenas o que agradava aos procuradores.

“A defesa de Eduardo Cunha (…) provará no processo o absurdo das acusações postas, as quais se sustentam basicamente nas palavras de um reincidente em delações que, diferentemente dele, se propôs a falar tudo o que o Ministério Público queria ouvir para fechar o acordo de colaboração”, escreveu o advogado Délio Lins e Silva em nota à época.

Apesar disso, nem todos concordam que a colaboração deve ser sempre aceita mesmo quando há informações graves mencionadas nela. O ex-ministro do Superior Tribunal de Justiça Gilson Dipp diz que a ferramenta é nova no Brasil e ainda está “em construção”.

Sem conhecer o caso de Eduardo Cunha, ele defendeu cautela e uma “valoração” das provas por parte dos investigadores. “Delação é um processo em construção. Cada caso concreto se tem que examinar. Isso é um exemplo claro dos limites de uma colaboração premiada”, afirmou.

Presidente do Conselho de Ética nega fraude

O advogado do ex-deputado federal Eduardo Cunha, Délio Lins e Silva, foi procurado pelo UOL, mas não quis comentar o caso. O ex-deputado federal José Carlos Araújo (PR-BA) negou tivesse existido qualquer possibilidade de fraude na escolha do relator da comissão que analisou a cassação de Cunha. Ele disse que Cunha tentou persegui-lo e articulou denúncias vazias contra ele. “Você acha que o Eduardo Cunha, depois de tudo o que fez, pode gostar de mim?” Araújo diz que sua atuação no processo fez com que se conseguisse cassar o ex-presidente da Câmara.

Os relatores Fausto Pinato e Marcos Rogério disseram desconhecer qualquer informação sobre fraude na escolha dos relatores. “Isso é desespero do cara que quer achar fatos”, afirmou Pinato.

As assessorias de todos os procuradores mencionados nos chats não se posicionaram sobre a rejeição à colaboração de Cunha, mesmo considerando importante a denúncia sobre a fraude. “Em negociações de possíveis acordos de colaboração, quando os fatos revelados envolvem mais de uma jurisdição, é comum que os respectivos procuradores manifestem-se sobre a conveniência de eventual acordo tendo vista as investigações que conduzem”, disse a força-tarefa no Paraná.

As equipes da Lava Jato no Paraná e no Rio, além da da Greenfield em Brasília, disseram que não comentam procedimentos em sigilo e em apuração. “O MPF não comenta sobre negociação de colaboração premiada, pois o instrumento tem natureza sigilosa exigida por lei, sob dever de confidencialidade dos procuradores”, disse a assessoria do MPF em Brasília.

A Procuradoria na capital federal e no Rio destacaram que não se manifestam sobre “supostas mensagens” dos procuradores. A autenticidade das mensagens do caso Cunha foi confirmada pelo UOL com dois investigadores diferentes.

UOL ainda confirmou o teor de outros diálogos dos procuradores a partir de evidências de conversas de sus próprios repórteres com os investigadores.

A assessoria da Procuradoria da República no Rio Grande do Norte disse que não comentaria pois o procurador que participou das discussões do acordo está estudando no exterior. A Procuradoria Geral da República (PGR) disse que não se manifestaria.

Parceria

Desde 7 de agosto, o UOL publica reportagens em parceria com o site The Intercept Brasil com base em mensagens trocadas de 2014 até este ano.

Há conversas privadas e em grupos no Telegram, além de documentos e outros itens.

O Intercept, que deu início em 9 de junho à série de reportagens baseadas nas conversas vazadas, recebeu os arquivos de uma fonte anônima. Com a parceria, o Intercept permite o livre acesso de repórteres do UOL ao arquivo. A produção de reportagens se dá de maneira conjunta, com jornalistas de ambos os veículos de comunicação.

A Constituição Federal assegura a jornalistas o sigilo da fonte. Diz o inciso 14 do artigo 5º da Carta Magna: “é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional”.

A decisão do UOL em analisar as mensagens mira o interesse público. O UOL não cometeu ato ilícito para obter informações e pode, no entanto, publicar informações que foram fruto de ato ilícito se houver interesse público no material apurado.

As reportagens produzidas por UOL e Intercept têm como ponto de partida a confrontação do teor das mensagens com fatos e dados concretos. O UOL manterá reservada qualquer comunicação ou informação desprovida de real interesse público assim como investigações possivelmente em curso. A reportagem não viu indícios de adulteração das mensagens.

O Intercept também fechou parcerias com o jornal Folha de S.Paulo, com a revista Veja, a Agência Pública e os sites El País e BuzzFeed, que já publicaram reportagens baseadas nos mesmos arquivos. O trabalho de reportagem desses veículos também não identificou indícios de que o material possa ter sido adulterado.

Os procuradores têm dito que não reconhecem as mensagens atribuídas a eles e que o material “não pôde ter seu contexto e veracidade comprovado”. https://outline.com/YUZEDT

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Glenn Greenwald: O JN era quase um parceiro de Sergio Moro https://nocaute.blog.br/2019/08/30/o-jn-era-quase-um-parceiro-de-sergio-moro/ Fri, 30 Aug 2019 13:29:57 +0000 https://nocaute.blog.br/?p=53573 Em entrevista ao jornalista Juca Kfouri, da TVT, Glenn Greenwald, do site The Intercept, revelou que o Jornal Nacional, exibido de segunda à sábado pela Rede Globo, "recebia vazamentos da Força-Tarefa da Lava Jato e o Bonner (o apresentador) anunciava que tinha uma notícia muito importante sobre corrupção, com uma audiência enorme, e a Globo lucrava muito, sem fazer jornalismo"

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Em entrevista ao jornalista Juca Kfouri, da TVT, Glenn Greenwald, do site The Intercept, revelou que o Jornal Nacional, exibido de segunda à sábado pela Rede Globo, “recebia vazamentos da Força-Tarefa da Lava Jato e o Bonner (o apresentador) anunciava que tinha uma notícia muito importante sobre corrupção, com uma audiência enorme, e a Globo lucrava muito, sem fazer jornalismo”. E concluiu: “O papel da grande mídia no Brasil era quase como parceiro da Lava Jato e do Sergio Moro”.

Veja a íntegra:

E mais.

A GloboNews colocou no ar, também ontem, uma entrevista de quase uma hora com o ex-juiz Sergio Moro, agora ministro da Justiça. Num clima de muita amizade, a jornalista Andréia Sadi e Moro sorriram várias vezes.

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The Intercept: Grupo Silvio Santos topa tudo por dinheiro https://nocaute.blog.br/2019/08/29/grupo-silvio-santos-topa-tudo-por-dinheiro/ Thu, 29 Aug 2019 15:17:35 +0000 https://nocaute.blog.br/?p=53540 Novos vazamentos obtidos pelo site The Intercept e publicados na manhã desta quinta-feira (29) pela Folha de S.Paulo, chegam aos meios de comunicação. O operador financeiro Adir Assad, em delação premiada, diz que lavou milhões de reais para o Grupo Silvio Santos por meio de contratos fraudados de patrocínio esportivo. Os depoimentos do operador foram compartilhados entre procuradores do Ministério Público Federal no aplicativo Telegram.

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Novos vazamentos obtidos pelo site The Intercept e publicados na manhã desta quinta-feira (29) pela Folha de S.Paulo, chegam aos meios de comunicação. O operador financeiro Adir Assad, em delação premiada, diz que lavou milhões de reais para o Grupo Silvio Santos por meio de contratos fraudados de patrocínio esportivo. Os depoimentos do operador foram compartilhados entre procuradores do Ministério Público Federal no aplicativo Telegram.

Veja a íntegra da reportagem de Felipe Bächtold e Wálter Nunes, da Folha, e Bruna de Lara, do Intercept Brasil.

Deu na Folha

​Preso e depois delator da Lava Jato, o operador financeiro Adir Assad afirma que lavou milhões de reais para o Grupo Silvio Santos por meio de contratos fraudados de patrocínio esportivo.

As afirmações estão em anexos de seu acordo de colaboração premiada firmado com integrantes da Operação Lava Jato.

Depoimentos do operador foram compartilhados entre procuradores do Ministério Público Federal no aplicativo Telegram. O conteúdo dessas conversas, obtido pelo The Intercept Brasil, foi analisado pela Folha e pelo site.

Nos relatos compartilhados, Assad não menciona especificamente o apresentador e empresário Silvio Santos, mas aponta como um dos contatos no grupo o sobrinho dele Daniel Abravanel e o uso da empresa que comercializa a Tele Sena. 

O esquema funcionou em duas épocas distintas, segundo disse Assad ainda na época em que negociava a sua delação.

No fim dos anos 1990, o operador diz ter firmado contratos superfaturados de patrocínio entre suas empresas e pilotos da Fórmula Indy e da categoria Indy Lights. Naquela época, disse, ele se relacionava com Guilherme Stoliar, que hoje é presidente do Grupo Silvio Santos.

Assad contou que o SBT tinha necessidade à época de fazer um caixa paralelo, mas não sabe dizer com qual finalidade —se para remunerar bônus a executivos ou se para pagar propina no setor público.

Essa operação, estimou ele, movimentou R$ 10 milhões naquele período. Os pilotos patrocinados, contou, “apenas viabilizavam espaços de publicidade” e não sabiam das irregularidades nas transações. Entre os pilotos mencionados no relato do delator estão Helio Castroneves e Tony Kanaan.

O irmão de Assad, Samir, que trabalhava com ele e também virou delator, fez relato corroborando a história.

Na segunda fase, a partir de meados dos anos 2000, Assad diz ter feito contratos de imagem e de patrocínio na Fórmula Truck. Afirma que transferia aos esportistas uma pequena parte dos valores contratados e devolvia ao SBT o restante do dinheiro. 

O depoimento aponta que a maior parte do dinheiro era devolvida em espécie a um diretor financeiro chamado Vilmar em um escritório do grupo, no centro de São Paulo.

A Liderança Capitalização, empresa responsável pela Tele Sena, pagou ao menos R$ 19 milhões para uma das firmas do operador, a Rock Star, de 2006 a 2011, diz documento elaborado na delação. 

Folha apurou que o diretor financeiro das empresas de Silvio Santos à época era Vilmar Bernardes da Costa.

Essa segunda fase, afirma Assad, começou após acerto feito com Daniel Abravanel e com o pai dele, Henrique Abravanel, irmão de Silvio. 

O relato com acusações ao grupo dono do SBT, segundo a Folhaapurou, foi incluído na versão final do acordo de colaboração do operador, firmado em 2017 e homologado na Justiça.

O capítulo que trata do grupo Silvio Santos seria enviado para a Justiça Federal de São Paulo, a quem cabe, eventualmente, autorizar medidas de investigação sobre o assunto. Detalhes do caso e da apuração permanecem sob sigilo até hoje.

O delator prometeu apresentar, como provas, registros da movimentação financeira de suas empresas e emails trocados à época.

O modelo de lavagem por meio do automobilismo é o mesmo relatado por diversos delatores da Lava Jato desde 2014, como empreiteiros da UTC e Carioca Engenharia que acusavam Assad de operar dessa maneira.

Ao virar delator, o operador admitiu irregularidades e, em relatos já tornados públicos, se definiu como um “gerador de caixa” para grandes empresas, principalmente empreiteiras. 

Como regra, contou ele, entregava o dinheiro para seus contratantes sem saber o que cada um faria com os valores providenciados.

Na delação, aponta como uma das fontes de geração de dinheiro a atuação na categoria Stock Car, na qual chegou a ser sócio de uma escuderia.

Ele afirma que uma empresa sua, intermediária entre competidores e patrocinadores, comprava espaços de exposição de publicidade nos eventos e organizava ações promocionais nas corridas. As quantias declaradas nas notas fiscais, porém, eram muito superiores aos valores de fato dos patrocínios.

Sem se referir especificamente ao caso do Grupo Silvio Santos, Assaddisse que, do valor cobrado dos patrocinadores, descontava cerca de 10%, que equivaliam à efetiva prestação do serviço. Outros 10% eram sua comissão pela sua atuação e cerca de 80% eram sacados e devolvidos a grandes empresas.

Assim, empreiteiras expuseram suas marcas por anos na competição automobilística, apesar de não costumarem fazer gastos expressivos com publicidade fora dali.

As atividades de Assad sofreram um baque em 2012, quando virou personagem da CPI que investigou os negócios do bicheiro Carlinhos Cachoeira. Na Lava Jato, ele foi preso em 2015.

Assad já foi condenado em quatro ações no Paraná e no Rio por crimes como lavagem de dinheiro e associação criminosa.

Seu acordo de colaboração previa o pagamento de multa de R$ 50 milhões, juntamente com o irmão Samir e com um auxiliar. Ele deixou a cadeia em outubro do ano passado, depois de três anos detido, e hoje é obrigado a ficar em casa à noite e nos fins de semana.

OUTRO LADO

Procurados pela reportagem, o SBT e o Grupo Silvio Santos afirmaram, em uma nota, que, “por desconhecerem o teor da delação” de Adir Assad, não podem se manifestar a respeito.

“Aproveitamos para enfatizar que as empresas do GSS sempre pautaram suas condutas pelas melhores práticas de governança e dentro dos estritos princípios legais.”

A reportagem também procurou a defesa de Vilmar Bernardes da Costa, que afirmou que não pode se manifestar “sobre suposta delação sobre a qual não tem qualquer informação oficial”.

Ele também disse que sempre pautou sua “conduta profissional pelo estrito cumprimento de seus deveres éticos e legais”.

Os advogados de Adir Assad não comentam os termos do acordo de colaboração do operador.

Helio Castroneves, por meio de sua assessoria, disse apenas que não conhece Assad e que nunca teve qualquer negócio com o delator.

Folha procurou também a assessoria de Tony Kanaan e deixou recados, mas não obteve manifestação sobre o assunto.

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The Intercept: Procuradores da Lava Jato tripudiaram com o luto de Lula https://nocaute.blog.br/2019/08/27/procuradores-da-lava-jato-tripudiaram-com-o-luto-de-lula/ Tue, 27 Aug 2019 15:42:32 +0000 https://nocaute.blog.br/?p=53364 Brincar com a dor do ex-presidente Lula foi o passatempo preferido dos procuradores da Lava Jato, segundo mensagens obtidas pelo site The Intercept, e divulgadas na manhã desta terça-feira (27), pelo UOL.
Numa das mensagens, o coordenador da força-tarefa, Deltan Dallagnol disse: "Um amigo de um amigo de uma prima disse que Marisa chegou ao atendimento sem resposta, como vegetal".

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Brincar com a dor do ex-presidente Lula foi o passatempo preferido dos procuradores da Lava Jato, segundo mensagens obtidas pelo site The Intercept, e divulgadas na manhã desta terça-feira (27), pelo UOL.
Numa das mensagens, o coordenador da força-tarefa, Deltan Dallagnol disse: “Um amigo de um amigo de uma prima disse que Marisa chegou ao atendimento sem resposta, como vegetal”.

O procurador Januário Paludo comentou: “Estão eliminando as testemunhas”. A procuradora Laura Tessler foi além: “Ridículo… uma carne mais salgada já seria suficiente pra subir a pressão… ou a descoberta de um dos milhares de humilhantes pulos de cerca do Lula…” E completou: “Só fala dizer que a Lava Jato implantou 10 anos atrás um aneurisma na cabeça da mulher… milhares de pessoas morrem de AVC no mundo… isso faz parte do mundo real e pronto”. Sobre o pedido de Lula para ir ao enterro do irmão, Vavá, o procurador Januario Paludo disse: “O safado só queria passear”.

Deu no UOL

Integrantes da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba ironizaram a morte da ex-primeira-dama Marisa Letícia e o luto do ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva (PT), conforme revelam mensagens de chats privados no aplicativo Telegram enviados por fonte anônima ao site The Intercept Brasil analisadas em parceria com o UOL.

Os diálogos também mostram que procuradores divergiram sobre o pedido de Lula para ir ao enterro do irmão Genival Inácio da Silva, o Vavá, em janeiro passado –quando o ex-presidente já se encontrava preso– e que temiam manifestações políticas em favor de Lula. Na ocasião, alguns membros da Lava Jato disseram acreditar que a militância simpatizante de Lula pudesse impedir a volta dele à superintendência da PF (Polícia Federal), em Curitiba.

A despedida de Lula do neto Arthur Araújo Lula da Silva, que morreu aos 7 anos em março, também foi assunto entre procuradores da Lava Jato e alvo de crítica em chat composto por integrantes do MPF.

04.fev.2017 -- Lula se emociona durante o velório de sua mulher Marisa Letícia, em São Bernardo do Campo (SP) - Nacho Doce/Reuters
04.fev.2017 — Lula se emociona durante o velório de sua mulher Marisa Letícia, em São Bernardo do Campo (SP).

Em 24 de janeiro de 2017, Marisa Letícia sofreu um AVC hemorrágico. A internação no hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, é comentada em chat no aplicativo Telegram.

A reportagem manteve as grafias das mensagens tal qual constam nos arquivos enviados ao Intercept, mesmo que contenham erros ortográficos ou de informação. Não há indícios de que as mensagens tenham sido adulteradas.

morte encefálica da ex-primeira-dama foi confirmada em 3 de fevereiro de 2017. Na véspera, a procuradora da República Laura Tessler, do MPF (Ministério Público Federal) em Curitiba, sugere que Lula faria uso político da perda da mulher.

Minutos após a confirmação da morte de Marisa Letícia ser noticiada, o tema volta ao chat Filhos do Januário 1.

Em 4 de fevereiro de 2017, após nota da colunista do jornal Folha de S.Paulo Mônica Bergamo sobre a agonia vivida por Marisa em seus últimos dias de vida ter sido compartilhada no grupo, a procuradora Laura Tessler refuta a possibilidade de o agravamento do quadro da ex-primeira-dama ter acontecido após busca e apreensão na casa dela e dos filhos e condução coercitiva de Lula, determinada pelo então juiz Sergio Moro no ano anterior.

“Ridículo… Uma carne mais salgada já seria suficiente para subir a pressão… ou a descoberta de um dos milhares de humilhantes pulos de cerca do Lula”, afirma Laura.

Em abril passado, em entrevista ao jornal El País e à Folha de S.Paulo, Lula disse que “Marisa morreu por conta do que fizeram com ela e com os filhos dela. Dona Marisa perdeu motivação de vida, não saía mais de casa, não queria mais conversar nada”. O ex-presidente respondia à pergunta sobre a possibilidade de a saúde da mulher ter sido afetada pelas investigações.

Na mesma conversa, o procurador Januário Paludo, que também integra a força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, coloca sob suspeita as circunstâncias da morte de Marisa Letícia. “A propósito, sempre tive uma pulga atrás da orelha com esse aneurisma. Não me cheirou bem. E a segunda morte em sequência”, diz ele, sem especificar à qual outra morte se referia.

A suspeição em relação às circunstâncias da morte da ex-primeira-dama já havia sido exposta por Paludo em 24 de janeiro, quando Marisa Letícia fora internada. Na ocasião, o chefe da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, Deltan Dallagnol, afirma que Marisa havia chegado debilitada ao hospital.

“Um amigo de um amigo de uma prima disse que Marisa chegou ao atendimento sem resposta, como vegetal”, afirma Deltan. Paludo reage à frase dizendo: “Estão eliminando as testemunhas”.

Em 4 de fevereiro, o corpo de Marisa Letícia foi velado em São Bernardo do Campo, no ABC Paulista. A fala de Lula na despedida da mulher é compartilhada pela procuradora Laura Tessler no chat. Na ocasião, Lula afirmou: “Eles que têm que provar que as mentiras que estão contando são verdade. Então, Marisa, descanse em paz porque esse Lulinha paz e amor vai continuar brigando muito”.

Deltan define a manifestação de Lula como “uma bobagem”. “Bobagem total… nguém mais dá ouvidos a esse cara”, diz.

O tema volta ao grupo no dia seguinte, quando o procurador Antônio Carlos Welter diz que “a morte da Marisa fez uma martir [sic] petista e ainda liberou ele pra gandaia sem culpa ou consequência politica”.

A morte de Marisa também foi comentada por outros integrantes do MPF em chats no Telegram. Ainda em 4 de fevereiro, a procuradora da República Thaméa Danelon, da força-tarefa da Lava Jato em São Paulo, critica a participação da procuradora Eugênia Augusta Gonzaga no velório da ex-primeira-dama, o que, para ela, equivaleria a ir ao enterro da “esposa do líder de uma facção do PCC”.

“Olhem quem estava no velório da Ré Marisa Leticia”, escreve às 14h07 no grupo Parceiros/MPF – 10 Medidas, ao citar fotografia de Eugênia na cerimônia. Outros procuradores questionam qual seria o problema da presença no velório de Eugênia Gonzaga, que chefiou a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos de 2014 até o começo de agosto.

“Acho um desrespeito ao Janot e a todos os colegas envolvidos na LJ. Além disso, demonstra partidarismo. Algo q temos q evitar Apenas isso. Abraços”, responde Thaméa às 15h16. Ela se referia a Rodrigo Janot, então procurador-geral da República. “É como um colega ir ai enterro da esposa do líder de uma facção do PCC. No mínimo inapropriado”, compara.

“O safado só queria passear”, diz procurador sobre pedido de Lula para ir a enterro de irmão

A maneira com que Lula externou a perda de parentes e eventuais manifestações públicas de apoio ao ex-presidente nesses momentos foram debatidas por procuradores em ao menos outros dois episódios em 2019: em 29 de janeiro, ocasião em que o irmão Vavá morreu em decorrência de um câncer, e, a partir de 1º março, quando foi confirmada a morte do neto Arthur.

Em 29 de janeiro, o procurador Athayde Ribeiro Costa compartilha no grupo Filhos do Januário 3 a notícia de que Vavá havia morrido. A resposta de Deltan à informação já indicava o debate que se iniciaria no chat. “Ele vai pedir para ir ao enterro. Se for, será um tumulto imenso”, diz.

As consequências de uma eventual saída de Lula da superintendência da PF em Curitiba e a legalidade da liberação provisória dividem opiniões no chat. Parte dos procuradores defende o direito de Lula ir ao enterro de Vavá, enquanto outros sustentam que o ex-presidente não é um “preso comum” e se posicionam contra a ida de Lula ao sepultamento do irmão.

Athayde Ribeiro Costa faz uma ressalva em relação à possível repercussão internacional negativa que a proibição traria. “Mas se nao for, vai ser uma gritaria. e um prato cheio para o caso da ONU [Organização das Nações Unidas]”, diz em referência à manifestação que a defesa de Lula apresentaria dias depois ao Comitê de Direitos Humanos do órgão.

No texto, os advogados de Lula diziam que a prisão se devia a uma “perseguição política” e citavam que o tratamento dado a ele era “carregado de cruel mesquinhez”. Meses antes, durante a corrida eleitoral, a ONU já havia recomendado ao Estado brasileiro “garantir ao ex-presidente o exercício de todos os direitos políticos mesmo que na prisão”.

O procurador Orlando Martello diz achar “uma temeridade ele sair. Não é um preso comum. Vai acontecer o q aconteceu na prisão” e conclui: “A militância vai abraçá-lo e não o deixaram voltar. Se houver insistência em trazê-lo de volta , vai dar ruim!!”.

O procurador Diogo Castor pondera que “todos presos em regime fechado tem este direito”, e Orlando Martello retoma o argumento do risco à segurança: “3, 4, 10 agentes não o trarão de volta. Aí q mora o perigo caso insistam em fazer cumprir a lei”.

Em abril de 2018, Lula se entregou à PF após ficar dois dias na sede do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo do Campo. Manifestantes tentaram impedir que o ex-presidente fosse levado à prisão e dificultaram o trabalho dos policiais federais.

Depois desta troca de mensagens, Januário Paludo encaminha aos colegas uma manifestação que seria entregue à juíza responsável por avaliar o pedido de liberação. Trata-se de um parecer da força-tarefa da Lava Jato pelo indeferimento da saída solicitada pela defesa de Lula. Ao ler o texto, Athayde Ribeiro Costa pondera: “Simplesmente indefirir estamos agindo como pilatos e deixando a juiza em situaca difícil”.

Minutos depois, os procuradores têm acesso a parecer da Polícia Federal que disse não ter condições de atender ao pedido de Lula. O relatório levou em consideração três situações de risco: “Fuga ou resgate do ex-presidente Lula, atentado contra a vida do ex-presidente e comprometimento da ordem pública”. A PF também considerou que as aeronaves que poderiam estar disponíveis para levar o petista ao enterro, naquele momento, estavam realocadas para dar apoio às autoridades em Brumadinho (MG), onde o rompimento de uma barragem, dias antes, deixou aos menos 248 mortos.

Anteriormente, a Justiça Federal, na primeira e na segunda instâncias, já havia se posicionado contra a solicitação dos advogados do ex-presidente. Minutos depois da manifestação da PF, a Procuradoria da República do Paraná também se posicionou contra o pedido de Lula.

No chat, Antônio Carlos Welter concorda com a PF, mas diz acreditar que Lula tinha o direito de ir ao enterro do irmão. “Eu acho que ele tem direito a ir. Mas não tem como”. Januário Paludo responde: “O safado só queria passear e o Welter com pena”.

Laura Tessler comenta: “O foco tá em Brumadinho…logo passa…muito mimimi”.

O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), ministro Dias Toffoli, permitiu contudo que Lula fosse levado a São Paulo e se encontrasse com familiares em unidade militar da região. A decisão foi publicada no momento em que Vavá estava sendo sepultado em São Bernardo do Campo, e Lula acabou não deixando a carceragem da PF.

“Fez discurso político em pleno enterro do neto”, diz procuradora

Em 1º de março, o grupo Filhos de Januário 4 foi surpreendido com o compartilhamento de notícia sobre a morte de Arthur. Dias depois, o laudo da necropsia confirmaria a morte do neto de Lula por infecção generalizada provocada por uma bactéria.

A procuradora Jerusa Viecili diz: “Preparem para nova novela ida ao velório”.

Deltan opina com base na decisão de Dias Toffoli no dia do enterro do irmão de Lula. “Tem q fazer igual o Toffoli deu”, diz.

Após autorização judicial, Lula foi ao enterro do neto em uma aeronave cedida pelo governo do Paraná. Deltan encaminha aos colegas notícia sobre um contato telefônico feito entre Lula e o ministro do STF Gilmar Mendesem que o ex-presidente teria se emocionado.

O procurador Roberson Pozzobon comenta: “Estratégia para se ‘humanizar’, como se isso fosse possível no caso dele rsrs”.

No chat Winter is Coming, na mesma data, a procuradora Monique Cheker, que atua em Petrópolis (RJ), comenta a fala de Lula durante a despedida do neto. O grupo é composto por integrantes do MPF de diferentes estados.

No enterro, Lula afirmou que Arthur havia sofrido bullying na escola por ser seu neto e prometeu provar que não havia cometido irregularidades.

“Fez discurso político (travestido de despedida) em pleno enterro do neto, gastos públicos altíssimos para o translado, reclamação do policial que fez a escolta… vão vendo”, diz Monique Cheker.

Outro lado

Procurada, a força-tarefa da Lava Jato em Curitiba disse que não poderia se manifestar sem ter acesso integral às conversas. O espaço continua aberto a manifestações de seus procuradores.

As procuradoras da República Thaméa Danelon e Monique Cheker responderam, por meio das assessorias de imprensa do MPF em São Paulo e,no Rio de Janeiro, respectivamente, que não iriam se manifestar sobre as mensagens citadas na reportagem.

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