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Morreu o advogado Iberê Bandeira de Mello, um herói da luta contra a ditadura militar

Morreu ontem, aos 80 anos, o jurista Iberê Bandeira de Mello, advogado de presos políticos e valente defensor dos Direitos Humanos nos momentos mais negros da democracia brasileira. Vai fazer muita falta, nesses tempos turvos que estamos vivendo.

Li no Breno Altman, ontem à noite, que morreu nesta segunda, dia 2, aos 80 anos, Iberê Bandeira de Mello, um dos heróis da resistência democrática contra a ditadura militar, advogado de presos políticos nos anos de chumbo. Bem humorado, espirituoso e mão de ferro no trato com os milicos, Iberê me socorreu em duas ocasiões. A primeira na tarde 24 de outubro de 1975, uma sexta-feira, quando um capitão e um major do DOI-CODI estavam no meu encalço. Por sorte, ao chegar ao seu escritório, encontrei-o reunido com os também advogados José Carlos Dias e Airton Soares. Os três recomendaram um lugar seguro para me esconder, junto com minha mulher, até sabermos a gravidade da situação. Na manhã seguinte o DOI-CODI mataria o jornalista Vladimir Herzog.

Nossos destinos se cruzaram anos depois, em 1980, quando o general Figueiredo decretou a instalação de duas usinas nucleares no coração do santuário ecológico de Iguape/Peruíbe, no litoral sul de São Paulo. No auge da irresponsabilidade dos trinta anos, decidi enfrentar o ditador na Justiça. Juntei um time de craques formado pelos físicos Mário Schemberg e Luís Carlos de Menezes, o economista Raul Ximenes Galvão, o sociólogo Ricardo Abramovai, o geógrafo Aziz Ab’Saber e a ecóloga Eclea Bosi e cada um deles preparou um trabalho sobre os danos causados pelo sonho atômico dos militares. Faltava conseguir quem tivesse peito de amarrar o guiso no pescoço do ditador – um advogado que formalizasse a Ação Popular contra Figueiredo. Iberê logo se apresentou como voluntário, trabalhando, claro, pro bono, sem cobrar um tostão e montou a peça jurídica.

Nossa expectativa era a de que todo aquele calhamaço fosse parar no lixo. Ao contrário, porém, do que reza a Lei de Murphy, de onde menos se espera é de lá que costumam vir as surpresas. Para espantado generalizado, o juiz Jacy Garcia Vieira, da Justiça Federal de Brasília, não só acatou a Ação, intimou Figueiredo e, ao final de um ano de trâmites, cravou a estaca no peito do ditador e nos deu ganho de causa. Usinas nucleares no litoral paulista, nem pensar.

A única foto que consegui localizar do Iberê é esta que aparece acima, quando ele (em primeiro plano, meio desfocado), Geraldo Mayrink e eu assistíamos a televisão anunciar que tínhamos ferrado Figueiredo. Iberê continuará vivo para sempre na história dos heróis da democracia brasileira.

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