Brasil

O Estado reconhece mais uma vítima: o embaixador José Jobim foi torturado e assassinado pelos militares

O Estado brasileiro reconheceu oficialmente que o diplomata José Jobim foi morto após sequestro e tortura pela ditadura militar no Brasil em março de 1979. Nessa sexta-feira (21) o Estado brasileiro emitiu uma nova certidão de óbito de Jobim corrigida 39 anos após sua morte.

A nova certidão corrige o motivo de óbito de Jobim: “O falecimento ocorreu por volta do dia 24 de março de 1979, na Cidade do Rio de Janeiro-RJ, em razão da morte não natural, violenta, causada pelo Estado brasileiro, no contexto da perseguição sistemática e generalizada à população identificada como opositora política ao regime ditatorial de 1964 a 1985”.

O documento é resultado dos trabalhos da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos e da Comissão Nacional da Verdade, que em seu relatório final, ainda em dezembro de 2014, recomendou que o país retificasse a causa de morte de pessoas que faleceram em decorrência de graves violações de direitos humanos, incluindo desaparecidos políticos.

A filha do de Jobim, a também diplomata Lygia Maria Collor Jobim, entrou com um pedido para corrigir a certidão de óbito de seu pai, que até hoje trazia causa de morte “indefinida”, a depender “dos resultados dos exames complementares solicitados”. Em entrevista à revista Época ela afirmou que o Brasil tem que conhecer o que aconteceu no passado para que isso não continue acontecendo no presente.

“Ainda vemos desaparecidos, assassinados, torturados, pelo mesmo Estado. Isso tem que parar. O que me deu forças para não desistir, muito mais do que um dever para com a minha família, foi o que meus pais me ensinaram: que, antes de mais nada, temos um de`ver para com o país”, disse Lygia.

José Jobim, à esquerda, no velório do irmão Danton, em 1978. Junto com ele está o almirante Amaral Peixoto, genro de Getúlio Vargas.

Desaparecimento

O embaixador havia desaparecido uma semana depois de anunciar que denunciaria um esquema de corrupção cometido durante a ditadura do regime militar. José Jobim iria revelar em um livro de memórias o superfaturamento de dez vezes o valor original para a construção da Usina Hidrelétrica de Itaipu – obra gigantesca construída em sociedade entre os governos do Brasil e do Paraguai, ambos então governados por ditaduras..

Depois de trabalhar como jornalista, José Jobim ingressou na carreira diplomática em 1938, tendo servido no Japão, EUA, Argélia, Argentina, Uruguai, Equador, Colômbia, Paraguai, Vaticano e Marrocos.

Quando nasceu a idéia da construção de Itaipu, entre 1957 e 1959, Jobim era embaixador no Paraguai. Chegou a ser enviado pelo presidente João Goulart a uma missão, em fevereiro de 1964, com ministros paraguaios para tratar do tema. Em 1966, voltou a participar de um encontro para assinar a “Ata das Cataratas”.

Sete dias antes de seu desaparecimento, no dia 15 de março de 1979, o embaixador José Jobim compareceu à posse do general João Figueiredo como o novo presidente do Brasil. Na ocasião, mencionou a alguém que estava escrevendo um livro de memórias, no qual revelaria o esquema de corrupção. Ao sair para visitar um amigo no dia 22 de março daquele ano, não retornou.

O diplomata conseguiu entregar um bilhete à dona de uma farmácia na Barra da Tijuca, informando que tinha sido sequestrado e que seria levado para “logo depois da Ponte da Joatinga”. A menos de um quilômetro da ponte, seu corpo foi encontrado, pendurado pelo pescoço em uma corda de náilon amarrada a uma árvore, mas suas pernas tocavam o chão.

De acordo com o Relatório da CNV, José Jobim foi sequestrado e mantido em cativeiro por dois dias e meio, em local incerto, e interrogado sob tortura.

Não se sabe que segredos o diplomata levou para o túmulo, mas são incontáveis as histórias obscuras envolvendo a construção da mega usina de Itaipu – a maior do mundo, superior à de Três Gargantas, na China. Empresários testemunharam, por exemplo, que ao ver o resultado da licitação, vencido por um consórcio liderado pela construtora Mendes Júnior, e de cujo grupo não fazia parte a gigante Camargo Corrêa, o ditador paraguaio Alfredo Stroessner passou os olhos pela papelada e perguntou:

– Pero donde está el Chino? No veo el nombre del Chino.

“El Chino” era como Stroessner tratava seu melhor amigo, o brasileiro Sebastião Camargo, dono da Camargo Corrêa, que havia sido alijada da lista dos vencedores. Diante dos olhares espantados dos presentes, o ditador disse apenas uma frase e virou as costas:

– Si no está el Chino, no habrá usina de Itaipu.

A exigência do ditador foi cumprida, deu-se um jeito, claro, e a Camargo Corrêa acabou recebendo sua fatia na obra monumental.

A família Jobim nunca foi próxima dos militares que tomaram o poder em 1964. Ao contrário. Danton Jobim, irmão mais velho do diplomata, foi quem assumiu a presidência do jornal oposicionista “Última Hora” quando seu criador, Samuel Wainer, foi exilado pela ditadura. E em 1970 seria eleito senador pelo MDB, partido de oposição ao regime.

Segunda via da certidão de óbito de José Jobim

Com informações do Jornal GGN

Notícias relacionadas

  1. Avatar

    Ainda tem trouxas que querem a volta da ditadura e milico de baixa patente para governar o Brasil.Dez vezes o valor de uma Itaipu , sem contar Coroa Brastel,Brasilinvest,Petropaulo,Polonetas e tantos outros que ninguem fala mais , isto sim foi uma epoca degradante e que o Brasil nao quer que se repita nunca mais.

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *