América⠀Latina

Lá, assim como cá: quando o Judiciário resolve fazer política, o golpismo avança


 
Por Aline Piva
É interessante notar o papel que determinadas instituições dentro e fora do Estado desempenham nos novos golpes de Estado na América Latina, instrumentalizando as leis e distorcendo flagrantemente os fatos para legitimar processos antidemocráticos. Já vimos esse filme no Brasil, e agora vemos também na Venezuela. Tanto em um como em outro, supostos “paladinos da Justiça” se levantam das profundezas do Estado, amparados por um forte esquema midiático, para dar voz aos seguimentos mais reacionários da sociedade, disfarçando seu golpismo com um manto de defesa dos “valores democráticos”.
No Brasil, Moro é o exemplo mais visível – mas, obviamente, não é o único. Na Venezuela, quem está cumprindo esse papel é a procuradora geral Luísa Ortega Díaz. Antes considerada como um quadro do chavismo – ainda que sua lealdade tenha sido questionada por muitos –, Ortega agora se lança em uma verdadeira cruzada midiática contra a Constituinte, cerrando fileiras com os setores mais reacionários da oposição venezuelana. Ultrapassando todos os escopos de sua função como procuradora, Ortega tem feito depoimentos questionando a legalidade do processo constituinte, instrumentalizando o Ministério Público venezuelano como mais uma ferramenta do projeto golpista, em um formato muito semelhante ao que vem sendo usado no Brasil, onde ações ilegais dos procuradores e juízes são legitimadas pela opinião pública moldada pela mídia.
Ortega também tem feito declarações criticando a violência das forças de segurança nos protestos. Mais uma vez, assim como no Brasil, o que mais chama atenção é a forma casuística com que são apresentadas as “denúncias”: são horas de denúncias da violência dos corpos de segurança, e nenhuma palavra sobre os linchamentos promovidos pela oposição. Para se ter uma ideia, até o momento, já foram registradas 107 mortes devido aos protestos violentos da oposição; dessas, 9 foram ocasionadas pelas forças de segurança. Todas as outras foram resultado direto ou indireto da ação dos manifestantes violentos. Mas para a procuradora, essas 98 mortes não são dignas nem de serem mencionadas.
Os atos da procuradora, ainda que cercados por jargões legais, não deixam de ser fatos políticos que beneficiam a oposição, legitimando a violência e fortalecendo a estratégia de tentar implodir o chavismo desde a sua institucionalidade. É muito preocupante que líderes dos setores mais radicais da oposição, como Freddy Guevara, assumam abertamente que eles têm em Ortega uma aliada. Mas é ainda mais preocupante o silêncio frente aos crimes dessa mesma oposição, promovendo um perigoso clima de impunidade.
Há menos de um mês para as eleições da Constituinte, a oposição venezuelana parece finalmente ter encontrado uma porta-voz disposta a legitimar seus crimes de ódio. Mais: encontrou uma procuradora disposta a fazer política e deixar de lado o zelo pelas leis e pelo Estado de Direito. E nós, brasileiros, sabemos muito bem o resultado disso.
 
 

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  1. Avatar
    José Eduardo Garcia de Souza says:

    Mais uma vez, a incompetentíssima articulista “esquece” que quando afirma que “Ortega tem feito depoimentos questionando a legalidade do processo constituinte, instrumentalizando o Ministério Público venezuelano como mais uma ferramenta do projeto golpista,” ela ataca o fato óbvio, básico e incontestável que Maduro inventou esta “constituinte” para poder eternizar-se no poder com apenas 20% dos votos – é simples questão aritmética. Quem tenta ou mesmo imagina fazer isto não é democrata, não quer democracia, tem medo da democracia. Esta “constituinte” não vai ocorrer, e Maduro, devido à sua sanha cega de poder, será deposto pelo povo que ele diz representar mas a quem tenta subjugar de qualquer forma.

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