A dança dos coxinhas
Mesmo sem ser convidado, nosso repórter participou da festa eleitoral de João Dória Junior.
Por Alex Solnik em 30 de setembro às 15h59
Por Alex Solnik
Quando chegamos, eu e meu filho, à calçada em frente ao Club Homs, na Avenida Paulista, pouco depois das 17h00 do dia 26, terça-feira, para registrar o evento da campanha de João Dória, mais conhecido ultimamente como João Dólar (que era o apelido de seu pai), já havia um clima eleitoral acentuado, com muitas bandeiras sendo agitadas, um barulho infernal espalhando o jingle do candidato aos quatro ventos, moças e rapazes distribuindo santinhos – uma festa muito grande para o candidato que, naquele dia, assumiu o primeiro lugar em todas as pesquisas.
Caciques, havia poucos. Dentre eles, identifiquei o ex-deputado Marco Antônio Castello Branco, a quem conheço desde os tempos do governador Abreu Sodré, aquele que escondeu Geraldo Vandré em 1968, no Palácio dos Bandeirantes enquanto era procurado pelo exército. Comento que ele não envelhece, qual é o segredo daquele baby face? – no que, aliás, se assemelha ao candidato. “Não paro de trabalhar” justifica.
À medida em que a tarde cai a calçada recebe mais e mais cortejos que empunham bandeiras do candidato a prefeito e dos candidatos a vereador. O barulho aumenta ainda mais. Converso com algumas moças uniformizadas com a propaganda do candidato. Somente uma delas admitiu estar ganhando pelo serviço – 700 reais por quinzena. Além de lanche: sanduiche de mortadela. Fiquei pasmo e rebati: mas o candidato mais rico dá pão com mortadela de lanche? Pensei que isso fosse coisa do PT! Perguntei se ela tinha ideia de como seu candidato era rico. Ela não tinha. Informei-a, então, que ele declarou à Justiça Eleitoral patrimônio de quase 200 milhões de reais. Ela não acreditou. Outra moça da campanha, de seus 17 anos, com piercing no nariz, contou que tinha gravado para a TV com o candidato e que nesse dia “teve almoço de verdade”. Nos outros dias, pão com mortadela. “O que você faria se tivesse 200 milhões de reais”? perguntei. “Eu ajudaria os outros” respondeu.
Também conversei com alguns transeuntes. Me surpreendi com a quantidade de eleitores de Haddad, apesar de sua colocação nas pesquisas. Uma eleitora afirmou, aliás, acreditar que as pesquisas sejam manipuladas ao gosto do freguês. “Eu trabalho em pesquisas” afirmou. “Mas pesquisas de mercado, não de política” aduziu.
Aproximei-me de um grupo de moças uniformizadas com o número 45 que cantavam, muito animadas, enquanto agitavam bandeiras. “Nós fizemos essa música” disseram. Eu sugeri que vendessem o jingle à campanha. “Quanto vale”? perguntaram. “Uns 10 mil reais, pelo menos” respondi.
A maioria das moças e dos rapazes contratados pela campanha não tinha a menor ideia de quem seja o candidato que estão divulgando. Repete o discurso que mandaram repetir: ele é um bom candidato porque é trabalhador e tem boas propostas. Vago desse jeito. Ao estilo do próprio candidato, cuja principal proposta, homem de negócios que é, é negociar todos os equipamentos que hoje são da cidade e pertencem a todos, como o autódromo de Interlagos, o Estádio do Pacaembu, o Centro de Convenções do Anhembi e outros.
Além das pessoas que se vêem geralmente em eventos desse tipo, moradoras dos grotões, com suas roupas simples e havaianas nos pés, líderes comunitários que estão ali defendendo o seu, cabos eleitorais, também chegavam pessoas com outro visual, perfumadas, usando ternos ou então vestidos de gala, exibindo joias – o eleitorado que de fato combina com o candidato.
Comentei com o candidato a vice, Bruno Covas, se o número de partidos coligados tinha sido escolhido de propósito para irritar o PT, pois são 13. Ele riu muito e ponderou: “A coligação é o PSDB mais 12”, tomando o cuidado de não mencionar o número 13 para não divergir do candidato, que nunca o pronuncia. Ao seu lado, o deputado Carlos Sampaio também se divertiu com a coincidência. “Preferíamos que fossem 45”. Contou a gracinha à sua mulher e ainda observou: “Boa essa, gostei”. Perguntei como é que ia ser a convivência com Temer se o candidato ganhar a eleição, pois sua vitória favorece a candidatura do governador Geraldo Alckmin. “Vai ser maravilhosa” respondeu Sampaio. “Nós fazemos parte do governo Michel Temer e ele não confunde as coisas”.
Quando o carro preto do candidato encostou na calçada foi um corre-corre. Parecia a chegada, sei lá, da Gisele Bündchen, do papa, do Mick Jagger. Ele desceu ao lado de sua mulher e, enquanto flashes de fotógrafos da campanha espocavam, ele agradecia a recepção com acenos e sorrisos. A primeira a quem beijou foi uma moça negra que segurava a bandeira. Depois de mais alguns beijos e abraços, sempre cercado por uma pequena multidão, ele se deslocou lentamente até o salão, sempre cercado de fotógrafos, na maioria profissionais contratados pela campanha.
Eu não via uma recepção tão histérica/eufórica desde os tempos de Mário Covas, logo depois das Diretas Já. Uma coisa impressionante! Todos queriam atenção do candidato, um beijinho à distância, um olhar, um sorriso. Dória subia olhando para todos e para ninguém, exibindo um sorriso Colgate. Fiquei impressionado com os cabelos totalmente pretos e o rosto sem rugas.
O auditório explodiu quando se deu conta de sua chegada, ainda que fosse um ilustre desconhecido para quase todos, no fundo. Uma grande ovação foi dedicada ao governador, recebido com o coro “Brasil pra frente/ Geraldo presidente”, lembrando o malfadado slogan da ditadura: “Pra frente, Brasil”. E deixando claro que a vitória à Prefeitura de São Paulo será o primeiro degrau da candidatura presidencial do governador paulista.
Antes dos protagonistas falaram dois políticos que já estiveram em companhias melhores. O deputado Roberto Freire, ex-comunista e atual presidente do PPS, confirmou sua adesão aos golpistas de primeira hora e manchou em definitivo sua biografia ao enunciar pessoalmente apoio ao candidato dos ricos e dos capitalistas. E o presidente do PV, José Luís Penna provou que a decadência do seu partido é cada vez mais acentuada e irreversível.
O discurso mais agressivo foi o de Bruno Covas. “As forças que estão aqui reunidas derrubaram a presidente Dilma e o PT” disse ele, num ato falho, confirmando a tese do golpe “e agora vão afastar o PT da prefeitura de São Paulo”. O governador Alkmin destacou que as prévias tinham sido democráticas, o que é contestado por poderosos tucanos, como o ex-governador Alberto Goldman, para quem Dória “não tem escrúpulos”. O candidato tava que tava. Empolgado pela inesperada ascensão nas pesquisas, subiu na cadeira e comandou o auditório ao estilo Simonal, acompanhou seu jingle com palmas e com uma dancinha tão desengonçada quanto as suas ideias. Nessa hora me veio à cabeça a imagem do Gugu Liberato cantando no “Domingo Legal” o seu grande hit: “Meu pintinho amarelinho/ cabe aqui na minha mão…”
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Fernandinho
02/10/2016 - 10h12
João ‘dolar’ ou João ‘do lar’?
Mara de Andréa
01/10/2016 - 07h14
Matérias assim são importantes para mostrar a fragilidade e a falta de propostas, além das incoerências dessas campanhas que só se baseiam no “acabar com o PT nos níveis nacional e municipal”. O maior perigo não foi falado no microfone deles, só no do Nocaute: Carlinhos Sampaio, que aparece na célebre foto de dedinhos indicadores levantados ao lado direito, bem grudadinho a Cunha, nos diz que eles fazem parte do desgoverno destruidor e têm convivência maravilhosa com o usurpador. Alckmin que nunca fala nem dá a mínima satisfação aos paulistas se revela nessas festinhas. Agradeço de montão a Alex Solnik e ao Nocaute.
Fabiano
30/09/2016 - 23h39
O video está travando um pouco, mas a cobertura ficou legal. Mostrou o quanto joao dólar é ridículo.
Adelvan
30/09/2016 - 20h11
E eis que o primeiro texto que leio no glorioso blog do Fernando Morais tinha que ser, mesmo, do Alex solnik. Delicioso, como sempre. Começamos com o pé …
ESQUERDO!