Eric Nepomuceno: o que significa o “não” da Colômbia aos acordos de paz.

Aprovar esse acordo de paz com as Farc, não seria apenas desarmar uma guerrilha degradada: seria o fim de meio século de violência sanguinária. No entanto, a maioria dos colombianos que foram às urnas rejeitaram o acordo. E agora?

 

No domingo, dia 2, houve outra votação – além das eleições municipais brasileiras. Foi a realizada na Colômbia, um plebiscito para aprovar – ou recusar – os termos do acordo de paz entre as FARC, as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, e o governo. Ao longo de longas 297 páginas, os termos do acordo que poderia encerrar mais de meio século de uma guerra civil que custou 270 mil mortos, 45 mil desaparecidos – que é outra maneira de dizer ‘mortos’ – e uns sete milhões de colombianos forçados a abandonar seu lugar de origem.

Aprovar esse acordo, como disse meu amigo, o formidável – e jovem – escritor colombiano Juan Gabriel Vásquez, não seria apenas desarmar uma guerrilha degradada: seria o fim de meio século de violência sanguinária.

E no entanto, a maioria dos colombianos que foram às urnas rejeitaram o acordo. Uma diferença ínfima: 50,2% contra, 49,8% a favor do acordo. Pouco mais de 54 mil votos.

E agora?

Se com o acordo aprovado o caminho para a verdadeiras pacificação já seria difícil, com sua rejeição, qual a saída?

Tanto o presidente Juan Manuel Santos como o líder guerrilheiro Rodrigo Londoño Echeverry, conhecido como ‘Timochenko’, disseram que o cessar fogo continuará em vigor.

Nenhum dos dois disse, mas deixaram claro que poderão ceder em alguns pontos do acordo, principalmente aqueles que foram considerados demasiado benevolentes com a guerrilha.

Nenhum dos dois disse, mas deixaram claro que tem que haver alguma outra alternativa. Não pode ser só ‘paz’ ou ‘guerra’. Ninguém quer a guerra de volta. A questão é como estabelecer a paz.

Ainda atônitos com o resultado – todas as pesquisas indicavam uma vitória do sim por pelo menos 60% dos votos –, governo e guerrilha buscam uma saída. Pode ser uma revisão do acordo e um novo plebiscito, pode ser uma Assembleia Constituinte, pode ser qualquer coisa – menos o reinício da guerra.

E enquanto guerrilha e governo procuram uma saída, os colombianos buscam uma resposta para um enigma: dos 35 milhões de eleitores, uns doze milhões e novecentos mil foram votar. Por que os outros vinte e dois milhões ficaram em casa?

Não dá, ainda, para dizer quem perdeu. Afinal, o jogo continua.

Mas dá, pelo menos por enquanto, para dizer quem ganhou: um político astuto, hábil, inteligente – e completamente cínico e irresponsável chamado Álvaro Uribe, que foi presidente dos colombianos.

Ele encabeçou uma formidável campanha contra o acordo de paz. Contou com apoio total das grandes elites, dos grandes latifúndios, das grandes fortunas do interior do país.

A história haverá de se lembrar dele – nem que seja por isso.

2 Comentários

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Fernando Cezar Teixeira Hottum

04/10/2016 - 19h41

O deslocamento de 7 milhões de bolivianos, da área rural, para as cidades, abriu campo talvez para a consolidação de um processo exploratório nos centros urbanos e mesmo nas grandes propriedades rurais. Agora não querem correr o risco de perderem essa mão de obra barata, subserviente, além de ela poder vir a tentar se reinstaurar pelo interior, retomando sua trajetória interrompida.

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Paulo da Mata Machado Jr.

04/10/2016 - 15h35

Nesses casos, a pergunta necessária: a quem aproveita?

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