Metalúrgico conta ao Nocaute como foi preso pela ditadura dentro da Volks

Volkswagen e outras empresas apoiaram o golpe militar em 1964. Mais do que isso, financiaram a repressão e permitiram prisões e tortura dentro de suas instalações.

Extensa documentação mostra que a Volkswagen do Brasil teve um papel ativo ao colaborar com a ditadura militar brasileira.

Há quase dois anos, foi aberta em São Paulo uma investigação sobre e empresa alemã para determinar sua responsabilidade na violação dos direitos humanos durante o regime de exceção.

Conforme estabeleceu a Comissão Nacional da Verdade (CNV), que examinou as violações dos direitos humanos cometidas pela ditadura militar, muitas empresas privadas, nacionais e estrangeiras, deram apoio tanto financeiro como operacional ao regime militar.

No caso da Volkswagen, a comissão constatou que alguns galpões que a empresa tinha numa fábrica de São Bernardo do Campo foram cedidos aos militares, que os usaram como centros de detenção e tortura. Além disso, a comissão sustentou que encontrou provas que a multinacional alemã doou ao regime militar cerca de 200 veículos, depois usados pelos serviços de repressão.

Reportagem de Manuela Azenha
Edição de Lydia Abud e Guilherme Janini

 

 

 

Lucio Bellantani: Em 64, eu comecei a trabalhar na Volkswagen de São Bernardo e ali comecei também a minha atividade política mais frequente, até julho de 72.

Quando no dia 29 de julho, eu estava trabalhando na ferramentaria, estava numa seção, na ala 4. E 11h30 da noite, fui surpreendido, estava na bancada, quando encostaram o cano da metralhadora nas minhas costas, me algemaram e já fui conduzido para o departamento pessoal da Volkswagen. No ato da prisão estavam dois policiais no Dops, que eu fiquei sabendo depois que eram do Dops. E seguranças da fábrica.

Sebastião Neto: Qual foi o papel das empresas durante a ditadura? É muito difícil uma grande empresa que nāo tenha cooperado com a ditadura. Do ponto de vista da vigilância, do controle, das greves, das associações empresariais para fazerem as chamadas listas negras, isso é senso comum. Agora, algumas cooperaram mais ativamente com a repressão. Há muita documentação do grupo Ultra, do Boilesen, que foi fuzilado pela guerrilha, cooperando ativamente na caixinha do Doi-Codi.

Nos outros estados, a mesma coisa. Cada grande grupo empresarial. Do Rio Grande do Sul, Gerdal, Renner, do Ceará, Edson Queiroz, em Pernambuco, os latifundiários, o caso da usina Estreliana, o fuzilamento de trabalhadores, o assassinato do Jeremias.
Cada estado tem o seu principal grupo econômico e normalmente esse grupo, no mínimo, foi beneficiário da política da ditadura em relações incestuosas com regime.

Adriano Diogo: Os militares assumiram o comando. Lógico que as empresas tiveram esse convívio e usufruíram. Vocês agora, jovens, estão vendo como é que é um golpe. A Fiesp organiza, bota um pato amarelo, e aí qual é a primeira medida? Igualzinho em 64, leis contra o interesse dos trabalhadores.

A General Motors montou um estande de tiro lá no porão do Dops, que é o estacionamento da Secretaria da Cultura estadual. Quando você vai na Sala São Paulo, nāo tem um estacionamento enorme? Lá era o estande de tiro montado pela GM. A GM desenhou um carro especial para a repressão, que a turma chama de perua veraneio. Era um carrão enorme. Ele tinha o papel que o Ford Falcon tinha na Argentina para os militares argentinos.

Lucio Bellantani: Na segunda-feira de manhã, já me levaram para cima, na presença do delegado Fleury, e ali começou uma espécie de interrogatório. Mas logo em seguida já me levaram para o terceiro andar, para a tortura. Aí me amarraram, me penduraram no pau de arara, amarraram o fio elétrico na orelha, também no canal do pênis, e começaram os choques, a pancadaria total. Fiquei nisso durante 47, 48 dias, nessas sessões de tortura, de pancadaria. E minha família me procurando. Na época eu já era pai de três filhos e minha esposa ia diariamente na Volkswagem para pedir informação e não obtinha resposta alguma. Só diziam: ele veio mas não marcou o cartão de ponto, não sabemos o que aconteceu.

Adriano Diogo: A Volkswagem, além de toda a colaboração, cedia os veículos, contribuía com a repressão e fez um programa corporativo que todo oficial e suboficial podia retirar veículos da Volkswagem por um preço altamente subsidiável.

Sebastião Neto: A Volks não apenas permitiu barbaridades em sua fábrica, como ela organizava no Vale do Paraíba o Secosi, ela era o cérebro, organizava, chamava atenção, fulano foi demitido. Isso era uma relação que havia com a aeronáutica, Exército, Marinha, Capitania dos Portos, Polícia Rodoviária Federal, PM, isso está no inquérito contra a Volkswagem.

Lucio Bellantani: Você tinha dentro dela uma espécie de delegacia, vamos dizer assim, onde os trabalhadores eram interrogados pela segurança da própria empresa.
Aconteceu um fato, minha mãe, muito religiosa, foi e me levou uma bíblia. Aí me entregou a bíblia e a hora que ela foi embora apanhei feito um cão velho aquele dia, o Fleury e o outro delegado: ah você gosta da bíblia! Assim de graça, apanhei à beça ali.

Sebastião Neto: Esperamos a reparação coletiva. Um monumento aos vitimados, um pedido público de desculpas da Volkswagen na imprensa, gastar uma página de jornal, como fazem com propaganda de carro, dizendo nós erramos, colaboramos com a ditadura, pedimos perdão à sociedade brasileira pelos estragos, lançar programas educacionais. E principalmente um fundo para investigar outras empresas.

Adriano Diogo: As empresas prepararam o golpe, financiaram o golpe e usufruíram do golpe e ganharam dinheiro pra chuchu com o golpe.

Lucio Bellantani: O foco central é o reestabelecimento da verdade, ou seja, que a empresa reconheça publicamente que ela cometeu um erro. Que ela foi apoiadora, é responsável por um série de desmandos, é responsável por violação de direitos humanos. É necessário que ela reconheça isso.

Um comentário

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Susumo Shirata

30/09/2017 - 16h00

Prezados Srs jornalista da NOCAUTE ,esta materia e interesante mas foi somente da volwagem ,vai ter mais seguimento,eu percebo que sr tem algum receio em ser mais insisivo nas palavras,estou lendo pela primeira vez tem preparado mais materia de outros acontecimento da epoca,tb fui preso pela ditadura vi barbaridade cometidas por militares,desde entaõ comecei a ler tudo que acontece na vida na imprensa sensulada,isso e de tamanha importancia na historia do Brasil ,como adquirir suas materias ,e aonde encontrar ,desde já obrigado.

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