Lula [exclusivo]: “Depois de cassar a Dilma, querem banir o PT e impedir que esse tal de Lula volte a ser presidente.”
Entrevista exclusiva do ex-presidente Lula para o Nocaute
Por Ricardo Amaral em 30 de setembro às 19h57
Lula [exclusivo]: “Vai ser difícil me tirar do jogo”.
Lula [exclusivo]: “Política externa altiva e ativa do Brasil não pode parar”.
Lula [exclusivo]: “A frase do Chico Buarque define minha vida: esse não fala fino com EUA e grosso com Bolívia”.
Lula [exclusivo]: “Sabe quando vai ter paz no Oriente Médio? Quando os EUA não forem os donos da paz”.
Vídeo 1
Eu sou o Ricardo Amaral e estou aqui com o presidente Lula para uma conversa de estreia do nosso Nocaute. Presidente Lula, na próxima semana os seus advogados vão entregar em Curitiba a resposta à denúncia aceita pelo juiz Sérgio Moro no âmbito da Lava-Jato. Presidente, como é que é se defender de uma acusação sem provas?
Lula: Ô Ricardo, eu continuo estarrecido com esse processo, porque na medida que você cria uma força tarefa e essa força tarefa vai criando autonomia, faz um conluio, um acordo com a imprensa – já que a orientação do juiz é no sentido de que sem a imprensa não é possível você apurar crime de corrupção – e passa, uma parte da Polícia Federal, uma parte do Ministério Público, passa informações para a imprensa e a imprensa passa informações para eles, ou seja, na necessidade de manter o assunto aceso, o assunto forte, o assunto todo santo dia sendo novidade, tentando culpar as pessoas ou condenar as pessoas pelas manchetes dos jornais, antes de checar no dia do depoimento, no dia da investigação. Às vezes prendendo as pessoas, quando poderiam convidar as pessoas para prestar depoimento. Isso tudo me deixa estarrecido, porque isso vai ferindo a liberdade democrática nesse país, vai ferindo a liberdade individual das pessoas.
A segunda coisa que eu ouvi de alguns procuradores é que quando você cria um grupo tarefa, esse grupo tarefa vai criando autonomia e vai criando as suas próprias regras. Você veja, o Tribunal Federal do Rio Grande do Sul chegou a dizer que a Operação Lava-Jato não tem que obedecer as leis. Ela tem regras próprias. Olha, nada nesse país pode ter regras próprias, a não ser o cumprimento da Constituição. Eu comparo um pouco essa operação no meu caso, à guerra do Iraque. Eu vou dar um exemplo. O Bush precisava entregar ao povo dos Estados Unidos um culpado. E o culpado foi (pelo atentado às torres) – eu estive com o Bush dia 10 de dezembro de 2002 e ele estava obsessivamente mais ou menos com uma força tarefa. Sabe, tentando mostrar que tinha armas químicas no Iraque. O embaixador brasileiro, que era o responsável pela fiscalização de armas químicas, sabe, dizia claramente que não tinha armas químicas. Então o Bush, por conta de uma mentira e porque precisava dar respostas à questão do atentado às torres, tinha que encontrar um culpado. Ou era o Osama Bin Laden ou era o Sadam Hussein, ele então não se importou com quantas mortes aconteceram, não se importou com o povo, resolveu que era preciso acabar com o Iraque. E acabou. E nesse caso o que que está acontecendo? As pessoas criaram um mundo de fantasia, a ponto de um menino, um jovem, sem nenhuma prova, dizer o seguinte, olha, tinha uma quadrilha montada aqui, uma quadrilha montada. Tem indicação, na eleição, montou isso, montou aquilo, conversou com aquele, indicou aquele, ou seja, ele construiu um mundo fantasioso na cabeça dele e tá tentando, junto com a imprensa convencer a sociedade de que é verdade. Isso é grave. Isso é grave porque – eu respeito muito o Ministério Público, é uma instituição que eu respeito, como respeito muito a Polícia Federal e como eu respeito a Justiça nesse país. Aos setenta anos eu tenho história pra provar que eu respeito a Justiça. O que eu não posso é aceitar uma mentira. O que eu não posso é aceitar uma montagem fantasiosa. Eu tô muito tranquilo, nós vamos apresentar nossa defesa, nós vamos apresentar nossas testemunhas, e eu continuo falando o que eu falei durante setenta anos da minha vida – sabe, pra mim não existe ninguém acima da lei. E para mim deve prevalecer a verdade, apenas a verdade. O que eu acho, o que eu acho, eu não me conformo das mentiras, das manchetes dos jornais, porque o que é grave, Ricardo, é o conluio, é um acordo. As revistas alimentam o Ministério Público, que alimenta os jornais, que alimentam as revistas, que alimentam a televisão. Ou seja, isso já faz anos e anos e anos. E é preciso que haja seriedade, porque esse comportamento da parte do Ministério Público, da parte da Polícia Federal e da parte da imprensa vai estimulando o ódio na sociedade. Vai estimulando o ódio. Entre as pessoas dentro de casa, entre as pessoas no bairro, entre as pessoas nas escolas, sabe. É preciso que se tenha responsabilidade nesse país. Quando você quiser acusar uma pessoa, primeiro você prova. Quando você provar, aí você anuncia pra imprensa. Eu lembro quando eu era presidente, de ministros meus que foram mostrados no horário nobre da televisão recebendo dinheiro num envelope e nunca apareceu o dinheiro, nunca apareceu a investigação, nunca chamaram ele pra prestar depoimento, nada. Esta é a minha indignação. Por isso eu vou apresentar a defesa, sabe, não apenas responder mas mostrar a desfaçatez da denúncia. Ou seja, ao não ter prova, eu conto uma mentira. Daí o que disseram, eu não tenho prova mas tenho convicção.
Quando o juiz Moro diz que é preciso fomentar a imprensa porque a imprensa vai denunciar e a imprensa vai fazer com que o cidadão chegue no julgamento já condenado. Porque em alguns casos se o cidadão for absolvido ele pode ser morto na rua. Porque ele já tá condenado.
Vídeo 2
Ricardo: O manchetômetro da Universidade Estadual do Rio de Janeiro mostra que somente este ano entre janeiro e agosto o Jornal Nacional da rede Globo acumulou 13 horas de matérias negativas e denúncias sem provas contra o senhor. Isso é o equivalente a sete partidas de futebol, um mês de novela. É um verdadeiro massacre midiático, não há comparação com nenhum outro personagem da política.
Lula: Eu acho que essa parceria, isso é quase que um acordo. Quase um acordo feito entre a força tarefa, entre um setor da Polícia Federal, o pessoal todo da Lava-Jato, ou seja, você me alimenta que eu te alimento, você me dá o almoço que eu te dou a janta. A quantidade de cretinices, de mentiras, de leviandades levantadas pelo Jornal Nacional contra mim é uma coisa que não tem comparação.
Eu sou um cara, Ricardo, eu não sou de perder muito a calma. Eu fico tranquilo dando tempo ao tempo, porque eu acho que a história não é feita no dia que a pessoa conta a história. Eles devem ficar muito indignados, porque, veja, primeiro porque eles estão atacando muito mais por preconceito, muito mais pelos acertos que eu tive do que pelos erros que eu cometi. Eles sabem que nós fomos um bom governo, eles sabem o que nós fizemos nesses treze anos no Brasil, e eu acho que faz parte da política deles fazer o golpe que eles fizeram. Até hoje não tá explicado para a opinião pública, até hoje, a famosa passeata de junho de 2013. Quando eu perguntei pro João Roberto Marinho por que que a Globo tinha deixado de transmitir a novela para transmitir a passeata (porque não tinham transmitido nem o enterro do pai ao vivo, não tinham nem suspendido a grade da novela) ou seja, nem para divulgar o penta campeonato suspenderam a grade da novela. Mas nesse caso suspendeu, eu lembro que eu perguntei ao João Roberto Marinho, por que que vocês suspenderam? – “Ah, porque tinha um clima que todo mundo queria ir.” Ora! Ora, você não abre mão, sabe, de uma novela, da publicidade por causa de um clima. Se fosse assim, sabe, cada vez que tivesse uma eleição de presidente da República que ele acreditavam, eles suspenderiam pra transmitir! Nunca fizeram isso. Então, até hoje não tá explicado pra opinião pública o comportamento de setores da imprensa, sabe, coordenados pelo Millenium, sabe, com relação à tentativa de golpe nesse país. Como eu acho que essas coisas vão acontecendo e essas coisas podres vão aparecendo, a gente vai ter que ir descobrindo aos poucos, vai ter que ir estudando, já tem muita gente escrevendo qual é o interesse da Lava-Jato, qual foi o interesse com o mensalão, sabe. Eu acho que tem determinados setores da imprensa que estão ficando quase que uma fábrica de mentiras. Uma coisa horrível, uma coisa imprestável para o país, porque não presta serviço ao país.
Olha, se você tem que fazer um processo de apuração de corrupção, você precisa investir na inteligência, precisa ter mecanismos de inteligência para apurar, por isso que nós investimos na Polícia Federal, por isso que nós investimos na autonomia do Ministério Público escolhendo o cidadão indicado por eles pra ser procurador, por isso que nós investimos na inteligência da Polícia Federal, por isso criamos centenas de mecanismos legais para facilitar a apuração. Porque só tem um jeito de você não ser pego no país – é você ser honesto. É você ser honesto. Do jeito que eles estão fazendo há um direcionamento claro, nós temos que banir o PT da política brasileira e nós temos que tirar a possibilidade desse partido continuar governando. E não adianta só cassar a Dilma não, temos que cassar a Dilma, temos que banir o PT e temos que tentar evitar que esse tal de Lula volte a ser candidato a presidente. Temos que tentar evitar. E é isso que eles estão fazendo.
Vídeo 3
Ricardo: Presidente, o Sr. nessas últimas duas semanas esteve no nordeste, no Ceará, Pernambuco, no Rio Grande do Norte, foi ao Rio de Janeiro, esteve aqui em São Paulo, fazendo campanha eleitoral e mergulhou nos braços do povo. O senhor acha que depois desse périplo o senhor avalia que eles alcançaram o objetivo de tirar o Lula do jogo?
Lula: Vai ser difícil. Vai ser difícil porque eu vou continuar andando no Brasil, não apenas pra discutir as coisas que precisam ser feitas daqui pra frente nesse país, porque não é possível esse país sofrer um retrocesso, as pessoas que subiram um degrau na vida estão descendo esse degrau. Pra poder recuperar a economia? Não, se você quer recuperar a economia você tem que fazer as pessoas subirem mais um degrau, não descer um degrau, você tem que fazer as pessoas subirem um pouco mais. Porque foi os pobres, sabe, chegando ao orçamento da União, foi os pobres chegando a ter um pouquinho de consumo que a gente fez esse país crescer, que a gente fez esse país sonhar. E sonhar rapidamente, e conquistar a copa do Mundo, e conquistar a Olimpíada, e conquistar o respeito da China, da Rússia, dos Estados Unidos, da Itália, da Alemanha, da França, de todo o mundo. Sabe, esse país que estava quase na perspectiva de chegar a 5ª. Economia do mundo.
Então, eu vou continuar andando pelo Brasil e eu quero fazer duas coisas. Primeiro eu quero discutir o problema do povo mais uma vez, ir aos lugares mais humildes, conversar com as pessoas que estão sofrendo privações, os trabalhadores que estão perdendo o emprego, que estão reduzindo os salários. Agora mesmo eu estou vendo a Petrobrás, com a maior desfaçatez do mundo anunciando a compra de plataforma e de sonda na China e na Coréia, em detrimento aos empregos que tem que gerar no país! Não há nada pior do que isso! Essas pessoas parece que nunca trabalharam e não sabem o que é dignidade! O que dá dignidade a um país é o povo trabalhar e receber um salário e levar pra casa o pão de cada dia com o trabalho do seu suor! E eles estão acabando com isso, porque é preciso a gente terceirizar as coisas, é preciso encomendar, nós temos que ser um país de 35% podendo tudo e 70% não podendo nada. Voltar ao que a gente era no passado!
Então, eu sinceramente eu vou voltar porque eu quero discutir duas coisas com o povo: o Brasil em si, e quero começar a discutir uma nova política cultural para esse país: é preciso acabar com o domínio de recursos para o eixo Rio-São Paulo. É preciso fazer com que o dinheiro da cultura chegue ao restante do país. É preciso que as televisões locais tenham transmissões locais. Não é possível que uma menina em Maués, na Amazonia, que uma menina em Cruzeiro do Sul no Acre, que uma pessoa em Vilhena, em Rondonia, que uma pessoa em qualquer lugar do Brasil seja obrigada a receber todo dia, sabe, a cultura do centro-sul do país, e as coisas deles quase que não passam aqui, a não ser crimes. A não ser miséria, a não ser enchente. Então, é preciso a gente garantir que uma parte da transmissão da televisão, das retransmissoras sejam locais! Pra esse país poder sair da mesmice! Pra esse país deixar de ser colonizado pela parte mais rica! Nós queremos um país igual, nós queremos viver num país com muitas oportunidades, onde o norte, o nordeste, o sudeste tenham a mesma chance que o sul já teve! Eu não tenho nada contra o sul! Mas é preciso que o governante trate de trabalhar para dar chances, porque quando crescer o nordeste, cresce S. Paulo. Quando crescer o norte, cresce o sul do país, porque vão virar comprador, vão virar consumidor, vão virar produtor!
Então, eu quero voltar a viajar pelo Brasil. Eu, sinceramente, Ricardo, não tenho a ideia fixa que eu tinha em 89. Eu tinha vontade de ser presidente pra poder provar que eu tinha mais competência do que a elite brasileira pra governar o Brasil. Eu tinha competência. Pois bem, provei que tinha. Provei que tinha. E esse é o ódio deles. O ódio deles, porque um cara que não tem diploma universitário, um cara que não fala inglês nem francês, entende 3 palavras em espanhol e fala um pouco ainda em português. Como é que pode esse cara governar o país e dar certo, e nós que somos letrados, que fizemos pós graduação, que fomos pra Harvard, Stanford e não sei mais pra onde não conseguimos? É por uma razão, é porque essa gente não conhece a alma do povo brasileiro. Essa gente conhece o povo de cima do palanque, é assim que eles conhecem o Brasil. Eles não entraram na entranha desse povo brasileiro. Eles nào sabem o que é a fome, o que é o desemprego, sabe, não sabem o que é uma mulher ter 4 ou 5 filhos pra criar e não ter condições. Eles só sabem disso estatisticamente, mas eles não tem sentimentos por isso. Então, eu vou voltar. Se as forças políticas acharem, que chegando em 2018, a situação tá difícil, se não tem candidato, eu não tenho nenhum problema em ser candidato outra vez. Te confesso que eu gostaria que a gente tivesse três, quatro opções que a gente pudesse indicar, e eu me contentaria em ser cabo eleitoral de um outro companheiro. Mas se as condições objetivas exigirem que eu saia candidato outra vez, pra provar que é possível a gente sair dessa crise sem afundar o Brasil. porque sabe, afundar, é como se eu estivesse num navio em alto mar, e para poder resgatá-lo eu tenho que afundá-lo? Não! Eu tenho que trazer ele pra cá, bom. E o Brasil tem que começar valorizando seu mercado interno. O Brasil tem que começar valorizando a necessidade de aumentar a possibilidade de consumo, a possibilidade de financiamento para micro empreendedor individual, para micro e pequena empresa. O Brasil precisa voltar a fazer crédito para as pessoas consumirem. Porque tem gente que me criticava, que dizia assim, ah a economia do Lula foi legal mas foi uma economia baseada no consumo e precisa fazer uma economia baseada na indústria. Ora, eu quero ver qual é o sábio, qual é o sábio que vai fazer a economia crescer baseada na indústria se não tiver consumo. Porque tem duas fórmulas: ou tem consumo externo pra você exportar, e exportar é sempre uma guerra, porque tem milhares querendo vender do mesmo jeito, ou você acredita no seu mercado interno de 204 milhões de pessoas que ainda estão ávidas pra ter muitas coisas. Ainda querem melhorar dentro de casa, ainda querem fazer um puxadinho, querem comprar uma televisão nova, querem comprar uma geladeira nova, querem comprar um carro novo, um sapato, uma calça. Gente do céu, é isso que gera economia. É isso que faz a economia crescer. E é simples, não precisa estudar, é só sentir. É só ter compromisso com o povo, não precisa ser tão letrado, é preciso só ser mais humano, ter mais compromisso.
Então, eu acredito, sabe Ricardo, que esse país, eu não sei porque, eu não quero ser ousado não, mas eu aprendi que não é difícil governar esse país quando você envolve o povo nas decisões, quando você envolve os empresários, sabe. Nós saímos de um movimento de 100% de otimismo, de 100% de alegria para um momento de 100% de pessimismo e 100% de tristeza!
Vídeo 4
Ricardo: O senhor, no seu governo construiu relações com o mundo, praticamente, participou de todas as reuniões do G8, fortaleceu o Mercosul, construiu a Unasul, e nós estamos vendo um movimento de retrocesso nesse governo, talvez um isolamento do Brasil com subserviência a a determinadas forças que mandavam antigamente. Como é que o senhor vê esse momento ruim da nossa politica externa?
Lula: Eu tinha noção de que era necessário fazer da política externa brasileira um trunfo na nossa governança. Eu dizia pro Celso, ô Celso nós temos que tentar mudar a geografia comercial e a geografia política do mundo. Não é possível que um acordo de 1948 ainda prevaleça até hoje! Sabe, o mundo mudou. A África não pode continuar isolada, o Brasil tem que dar importância pra África, porque os chineses estão ocupando a África. O Brasil precisa ser o garante da América Latina, não os Estados Unidos! O Brasil é que tem fronteiras com quase todos os países, menos com o Chile e o Equador. O Brasil tem que ter uma política mais forte com os países árabes. Parece que é tudo coisa dos Estados Unidos! Eu não quero mal aos Estados Unidos, eu admiro os Estados Unidos, mas eu quero meu espaço. Quando eu ia num baile quando eu era jovem, eu não ficava contente de ver os outros dançando, eu queria dançar. Eu ficava procurando uma mulher solteira lá, livre, pra eu dançar. Na política internacional você tem que procurar os seus parceiros, nada é de graça, a pessoa não vem porque quer, você tem que motivar as pessoas, você tem que motivar, você tem que convencer. E eu acho que nós tivemos o mais importante período de política ativa e altiva da história desse país. E eu acho que isso não pode parar. O Brasil tem dívida histórica com a África que não pode ser paga com dinheiro, tem que ser paga com solidariedade. O Brasil não pode deixar os países vizinhos ficarem dependentes de outros ou ficar mais pobres do que o Brasil, eles tem que crescer junto com o Brasil. Porque a gente fala em tempo de paz, onde tudo é melhor pra ser feito. A gente fala, ah o país é pequeno, não tem importância, mas veja quanto custou pro Brasil a guerra do Paraguai. A guerra custa cem vezes mais do que um acordo feito em tempo de paz.
Então, eu sou suspeito pra falar, Ricardo, porque eu vivi períodos extraordinários na minha relação com os Estados Unidos, com a França, com a Itália, com a Alemanha, com os países nórdicos, com os países africanos, com os países árabes, com a América Latina. Eu sinceramente, o Celso Amorim, na minha opinião vai demorar muito para aparecer um chanceler como ele, um ministro das Relações Exteriores. Uma competência de trabalhar extraordinária, um cara que acredita nas coisas que faz. E qual é o problema do presidente? O problema do presidente é ele dizer o que ele quer e deixar as pessoas fazerem. Não é o presidente que tem que fazer. Eu fiz muito, eu viajei muito, mas o Celso tinha total liberdade de trabalhar. Olha, o caminho é esse. É como um time, sabe, a seleção brasileira vai jogar, o técnico tem que dizer apenas pro jogador o seguinte, olha, o gol que a gente tem que chutar é aquele lá do lado do adversário, não é o nosso não. Eu dizia pro Celso, ô Celso, o jogo é esse vamos jogar, filho. Vai lá e enfrenta. E nós enfrentamos e tivemos um papel importante na OMC, não fizemos o acordo na rodada de Doha por causa da India, que tinha eleições no mês de março de 2008, maio me parece, e o negociador era candidato a governador, e o Bush porque tinha eleição nos Estados Unidos, e não quis fazer. E nunca mais retomaram, estivemos muito perto. E estivemos muito perto de conquistar a mudança no Conselho de Segurança da ONU. Ah, mas de qualquer forma eu acho que foi um movimento maravilhoso, e ele tá aí para ser construído, ele tá aí, o mundo precisa disso. O mundo precisa de harmonia.
Vídeo 5
Ricardo:… nós traçamos um quadro aqui de extrema gravidade pro país, de exceção do meio judiciário, como indica aquela decisão do Tribunal Judiciário do Rio Grande do Sul, de oligopólio da mídia direcionada politicamente, um quadro de agravamento da recessão e de uma medida em sentido oposto por parte do governo, de perseguição a uma determinada corrente política, perseguição deliberada, criminalização de uma das mais importantes correntes políticas do Brasil – como é que diante desse quadro o senhor ainda consegue ter esperança? Da retomada do crescimento e da plena democracia no Brasil?
Lula: Eu estou muito convencido, Ricardo, do que eu fiz nesse país. E só o consegui fazer porque o povo foi o artista principal da minha governança. Foram 74 conferências para deliberar políticas públicas. Eu sempre trabalhei em relação aos outros países sem a cláusula da hegemonia. Eu tratava a Bolívia como tratava os Estados Unidos. Eu tratava o Paraguai como eu tratava a China. Eu tratava o Uruguai como eu tratava a Alemanha. Para mim não era o status social do país que fazia eu rir ou não rir. Eu sou um ser humano, como diz a música do Zeca Pagodinho, e eu gosto de me realizar como ser humano, sabe. E aquela frase do Chico Buarque no ato da Dilma no Teatro Casa Grande no Rio de Janeiro de que eu gosto desse governo porque ele não fala grosso com a Bolívia e não fala fino com os Estados Unidos é o que marcou a minha vida na política. Aprender a respeitar os diferentes, tratar as pessoas como elas são e aceitá-las como elas são. A elite brasileira queria que eu brigasse com o Evo Morales quando ele tentou nacionalizar o gás, e eu achava que o gás era dele e que ele tinha que nacionalizar mesmo. Eu só queria que ele pagasse o que a Petrobrás tinha gasto. Sabe, que bobagem é essa, sabe. Ficar gritando grosso com o Paraguai, com a Argentina, não, tem que tratar com carinho, com respeito, são países irmãos. Eu acredito numa sociedade em que um dia a gente não tenha fronteira. Que todo mundo aqui fale portunhol, que todo mundo se entenda, sabe. Que todo mundo beba a nossa cachaça e que a gente beba o chimarrão deles, que todo mundo faça as coisas, sabe, é possível.
É possível. Isso, nós quase que atingimos. Acredito em paz no Oriente Médio sabe quando? Quando não for os Estados Unidos o dono da paz. Porque ele é uma razão dos conflitos. Então, paz é possível. E aí, eu quero terminar parabenizando o presidente Santos da Colômbia. Que teve a coragem, a decência e a honradez de não transformar em normalidade uma guerra que já durava 50 anos. Sabe, trazer para dentro do país os irmãos que estavam fora. Vai ter problema? Vai ter problema, mas é assim mesmo. É assim mesmo, a família vai crescer, vai ficar mais gente lá, em Bogotá vai ter gente contra. Mas, Santos, parabéns, porque é um sucesso extraordinário o que você conseguiu.
Ricardo: Presidente, o Nocaute agradece essa entrevista na nossa estreia, boa sorte.
Lula: Isso aqui é uma homenagem ao nosso grande companheiro Fernando Morais, um beijo e boa sorte com o Nocaute.
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ANA MARIA
05/10/2016 - 16h47
delicia de entrevista
Cleusa
05/10/2016 - 11h42
Excelente entrevista! O Lula é uma alma superior. Por isso não é compreendido pelos seres das sombras que dominam, no momento, o Brasil! Que Deus o proteja e à sua família grande estadista Lula.
Pereira
01/10/2016 - 15h40
Grande entrevista! Ex-presidente lula sempre mostrando que de brasil e de brasileiros ele entende muito bem. Ótima estreia do blog. Parabéns por disponibilizar mais uma alternativa de informação. Sucesso!
Aloysio França
01/10/2016 - 11h03
Bela entrevista!
Adelaide Terzinha do Nascimento Vitoreti
01/10/2016 - 09h41
FANTÁSTICA a entrevista, uma verdadeira aula de História, Sociologia, Política, Economia! Cada vez mais eu admiro e respeito o Presidente Lula, o maior presidente que o Brasil já teve. Devemos pedir a Deus para proteger os homens de bem, para que o bem vença.
Otávio Nunes
01/10/2016 - 07h48
Muito boa a entrevista, mas acho que o Ricardo deveria ter perguntado um pouco mais e o Lula falado menos.
ruy marcondes garcia
01/10/2016 - 07h08
Com esse cara não tem tempo ruim. Levanta o moral de qualquer um. Bola prá frente Luis Inácio!
Ejcs
30/09/2016 - 22h40
Impedir Lula, persegui-lo pra imobilizá-lo, para afastá-lo da possibilidade de tentar conduzir algum consenso sociopolítico capaz de reconstruir o único projeto de país minimamente soberano e independente, esta é apenas parte da estratégia de destruição do País em curso, o golpe dentro do golpe, que no final é a completa inviabilização do Brasil como Nação.
Bento Matos
30/09/2016 - 21h59
Excelente entrevista!