GABRIEL PRIOLLI: NOTÍCIA-VAGALUME

O chanceler do Brasil, ex-candidato à Presidência da República, acusado formalmente na Operação Lava-Jato de levar um troco por fora de 23 milhões de reais. Delatado com prova e tudo. Notícia para eclipsar qualquer outra, certamente.


NOTÍCIA-VAGALUME

 

A grande imprensa brasileira é muito criativa. Temos de reconhecer essa virtude. Que outra imprensa do mundo é capaz de inventar a… notícia-vagalume?
Notícia-vagalume é aquela que pisca e apaga. Brilha por instantes e some.

Ao contrário do coleóptero lampirídeo do qual empresta o nome, a notícia-vagalume não faz isso muitas vezes. Não emite luz intermitente.

Seu brilho fosforescente pode até ofuscar, quando o incauto olha para ela sem proteção. Quando olha, por exemplo, para a manchete principal de um dos três maiores jornais do país e lê: “Odebrecht afirma ter pago caixa 2 a Serra na Suíça”.

Que esplendor, não?
O chanceler do Brasil, ex-candidato à Presidência da República, acusado formalmente na Operação Lava-Jato de levar um troco por fora de 23 milhões de reais. Delatado com prova e tudo.
Notícia para eclipsar qualquer outra, certamente. Notícia para derrubar de imediato o ministro e para fazer qualquer presidente ajoelhar no milho da autocontrição e das desculpas.
Mas, boa notícia-vagalume que é, ao brilho intenso corresponde o breu subsequente. Piscou, apagou. Luziu, sumiu.
Não teve repercussão, desdobramento, crítica, editorial. O pouco que teve, quase nada, foi tão escondido que ninguém viu.
Isso, no próprio jornal que a publicou, para não falar dos outros, que sequer viram Serra piscar, aqui ou na Suíça.
Porque notícia-vagalume é assim: só pisca aqui e ali, jamais na grande imprensa inteira.
Não é repercutida pelos outros jornais, não abre os telejornais, não é capa das revistas semanais, não tem comentário no rádio. Não alimenta campanhas do jornalismo de guerra.
Talvez porque os bichos se entendam melhor que os humanos, a notícia-vagalume gosta de tucanos. Tem uma queda especial por eles.
Quando vemos um tucano detonado numa manchete negativa, podemos ter certeza absoluta de que a espantosa notícia é vagalume. Vai piscar e sumir.
Incautos vão pensar que a luz ficará, produzirá calor intenso e irá até incendiar as instituições. Mas, nada disso.
Ela será tão fugaz quanto a disposição da grande imprensa em manter um mínimo de isenção, equilíbrio e seriedade no noticiário.
Notícia-vagalume é aquela que morre rápido, no pote de vidro das nossas ilusões.
2 Comentários

Os comentários aqui postados são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião do NOCAUTE. Todos as mensagens são moderadas. Não serão aceitos comentários com ofensas, com links externos ao site, e em letras maiúsculas. Em casos de ofensas pessoais, preconceituosas, ou que incitem o ódio e a violência, denuncie. Leia o nosso termo de uso.

Lu Rosas

30/10/2016 - 12h15

E não se pode fazer nada qto a isso…sniff

Responder

Tatiana Portela

30/10/2016 - 00h37

Excelente o comentário. O jornalismo no Brasil, de fato, já era. Onde será que vamos parar?

Responder

Deixe uma resposta

Recomendadas