Despejado da Cracolândia, idoso dorme na calçada da Avenida Paulista

“Não fomos avisados. Nada de cadastro, já chegaram metendo o trator na parede”, queixou-se o ex-morador de um dos hotéis lacrados pela Prefeitura , durante a operação para "acabar com a Cracolândia"

*Por Daniel Mello/Agência Brasil 

José Aparecido Nogueira, 73 anos, está morando na rua desde que a prefeitura lacrou o hotel em que vivia na Cracolândia, na região central da cidade de São Paulo, na operação do dia 23 de maio.

Em entrevista à Agência Brasil, ele contou morava há 3 anos no local, onde pagava mensalidade de R$ 350. Sem o quarto que cabia dentro do orçamento de um salário mínimo, Nogueira passou dormir nas calçadas da Avenida Paulista. “Estou dormindo na marquise da farmácia ou na marquise do bar. Estou passando as noites ali, com duas cobertas”, disse.

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José Aparecido Nogueira (Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil)

José Aparecido reclama que não sabia do despejo, realizado após a mega-operação policial que destruiu as barracas improvisadas que ocupavam a Rua Helvetia e a Alameda Dino Bueno.

“Não fomos avisados. Nada de cadastro, já chegaram metendo o trator na parede”, contou, referindo-se ao imóvel, ao lado do hotel onde vivia, que começou a ser derrubado por engano com pessoas dentro. No episódio, três pessoas ficaram feridas.

Ele diz que, devido aos problemas de saúde, que incluem complicações renais e dificuldades de locomoção, não conseguiria se adaptar aos abrigos disponibilizados para moradores de rua. “Albergue é só para gente sadia. Para gente doente, que nem eu, não serve. Prefiro morar na calçada. Albergue tem muitos problemas internos”, diz Nogueira, que anda com a ajuda de muletas, carregando seus pertences em duas sacolas de compras.

“Um quartinho simpático, confortável. Tinha banheiro privativo, chuveiro quente. Todo conforto e não pagava muito. Tem outros hotéis por ali, mas cobram demais”, relatou.

Demolições proibidas pela justiça

Após o caso, uma decisão do juiz Luis Manuel Fonseca Pires, da 3ª Vara de Fazenda Pública, proibiu a prefeitura de continuar com as demolições e remoções sem o cadastramento prévio dos moradores “para atendimento nas áreas de saúde e habitação, disponibilizando-lhes alternativas de moradia e atendimento médico, além de permitir que retirem os pertences e animais de estimação dos imóveis”, consta na decisão do dia 24 de maio. Foi estipulada multa de R$ 10 mil em caso de descumprimento.

Desde a determinação, a Secretaria Municipal de Habitação informou ter cadastrado 275 famílias na região. No entanto, para casos como o de Nogueira, a prefeitura oferece acolhimento na rede de atenção social. “Nesses locais de acolhimento eles podem tomar banho, dormir, fazer refeições e ter acesso a atendimento socioassistencial”, destaca comunicado da prefeitura.

Segundo o último balanço da prefeitura, desde o dia 21 de maio foram realizados 7,4 mil encaminhamentos para a acolhimento na rede assistencial. Há a previsão ainda da criação de 280 vagas de atendimento emergencial na região da Luz. Os contêineres instalados perto da Cracolândia fizeram 2,2 mil atendimentos, entre fornecimento de refeições, banho e pernoite.

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As ações na Cracolândia têm dispersado usuários de drogas e população em situação de rua por outros pontos da cidade. Após a operação do dia 21, a Guarda Civil Metropolitana mapeou 22 pontos de concentração dessas pessoas, alguns novos outros já existentes.

Na área próxima ao Museu de Arte de São Paulo (Masp) se concentram pessoas que não têm onde dormir e não foram para os albergues municipais. O governo estadual e a prefeitura alegam que a dispersão em grupos menores facilita as abordagens das equipes de saúde e assistência social.

2 Comentários

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José Eduardo Garcia de Souza

13/06/2017 - 10h46

A situação deste senhor é realmente lamentável e inaceitável, e estou certo que esta divulgação ajudará a solucionar o seu problema. Mas valeria a pena também ter mencionado na matéria que, após as duas intervenções, o Denarc está na caça de 37 procurados da Justiça identificados como traficantes com atuação na Cracolândia – são 18 mulheres e 20 homens cuja atuação na região do fluxo foi documentada pelos investigadores com imagens em que os suspeitos aparecem portando armas, realizando disparos e organizando a distribuição e venda da droga nas barracas anteriormente instaladas no local.

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    Eliana Barsotti

    13/06/2017 - 16h58

    Uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa, José Eduardo. A questão do tráfico é questão de polícia, mas casos como o deste Sr. precisam ser tratados como prioridade e com política pública. Política esta que não existe na administração do gestor municipal.

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