Morre Ernestina Herrera de Noble, dona do Clarín, porta-voz da ditadura argentina
Uma das empresárias mais ricas da Argentina, Ernestina ergueu sua fortuna durante a ditadura e foi acusada de adotar dois bebês ilegalmente
Por Nocaute em 17 de junho às 13h30Morreu na quarta-feira (14/6) a empresária Ernestina Herrera de Noble, 92 anos. À frente do grupo Clarín desde 1969, o maior conglomerado de mídia da Argentina, Ernestina era detentora de uma das maiores fortunas de seu país e de uma reputação polêmica.
Aliada do atual presidente, Mauricio Macri, Ernestina se declarou arqui-inimiga de Nestor e de Cristina Kirchner. Acima de todos os interesses que possam ter estragado essa relação, como a anulação das leis que anistiava agentes da repressão e colaboradores da ditadura, está a criação da Lei de Mídia. A medida regulamenta o setor de imprensa e difusão na Argentina e é aplicada integralmente desde 2013, após uma disputa judicial entre empresas e governo que se estendeu por quatro anos.
Aprovada em 2009, a lei substituiu a norma que havia sido criada em 1980 e fixa para os meios privados de difusão nacional um máximo de 35% do mercado em cobertura de televisão aberta e 35% de assinantes em televisão a cabo, 10 licenças de rádio, 24 de TV a cabo e uma de TV por satélite.
Os principais conglomerados de mídia da Argentina, além do Grupo Clarín (dono de jornais, rádios e emissoras de TV), são o Grupo La Nación, o grupo Multimedios La Capital (com sede em Mar del Plata e dono do jornal La Prensa) e a rede Telefe, controlada pela Telefónica de España. Entre todos estes, o Clarín foi o mais atingido.
Com um discurso jornalístico contra os Kirchner, o Clarín alegava perseguição e censura. Com medo de que o Brasil também tivesse uma medida para regulamentar o setor, a imprensa tradicional brasileira acabou reforçando o coro contra a lei argentina.
Ernestina herdou a direção do Clarín com a morte de seu marido, Roberto Noble, em 1969, após um litígio com a enteada. Na década seguinte, a empresa cresceu, principalmente nos anos em que a Argentina enfrentou sua última ditadura civil-militar (1976-1983).
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Ernestina, o ditador Jorge Rafael Videla e Julio Grondona, então presidente da Associação de Futebol Argentina (AFA)
Quem controla o papel da imprensa
O êxito do grupo se deve, sobretudo, ao fato de ser um dos principais acionistas da Papel Prensa, fundada em 1972. É a única fábrica a fornecer o papel utilizado pelos jornais e revistas da Argentina. De um consumo médio de 230 mil toneladas por ano, distribui 175 mil toneladas. Outras 55 mil são importadas, isentas de impostos.
O Clarín tem 47% das ações, o La Nación outros 22%, enquanto o Estado é dono de 27%. Pequenos acionistas detêm os outros 4%.
A suspeita está na forma como Clarín e La Nación se tornaram proprietários da Papel Prensa. Durante a ditadura, o controle da fábrica, que pertencia ao grupo Graiver, foi transferido, por preço irrisório, para esses jornais. A venda aconteceu depois da morte do seu líder do grupo, o empresário David Graiver, em um acidente de avião.
A viúva de Graiver, Lídia Papeleo, já declarou ter recebido ameaças de morte para pressioná-la a vender a fábrica. Héctor Magnetto, hoje CEO do Clarín, era próximo de Ernestina desde os anos 1970. Foi apontado por Lidia como o principal responsável por forçar a venda da empresa.
Há quem assegure que a CIA (Agência Central de Inteligência) esteve envolvida com a morte de Graiver. Há quem diga que ele foi assassinado pela ditadura por ter recebido um investimento de 17 milhões de dólares da guerrilha peronista Montoneros.
O Clarín nunca escondeu seu apoio à ditadura. O jornal chegou a publicar reportagens para estimular pessoas a entregar comunistas ao governo para “reabilitação”. Com entrevistas falsas, mostravam que era possível a “recuperação de um comunista”, depois de passar uma temporada na prisão em lugares como a ESMA. Localizada em Buenos Aires, a Escola de Mecânica da Armada foi uma dos principais centros de detenção do país. Por ali passaram pelo menos cinco mil pessoas, entre as quais 4.500 desapareceram.
DNA sob suspeita
“Antes de tudo foi mãe. Antes de tudo, foi avó”, declarou o padre Guillermo Marcó, durante a cerimônia religiosa que antecedeu ao enterro da empresária no Cemitério da Recoleta. Justamente nessa maternidade estava uma das polêmicas.
Ernestina foi acusada de ter sequestrado dois bebês durante a ditadura. Seus filhos, Felipe e Marcela, foram adotados em 1976 e em um processo irregular. Tanto ela como os filhos se recusavam a fazer o teste de DNA, solicitado pelas Avós da Praça de Maio, que buscam filhos de desaparecidos que nasceram em prisões clandestinas e foram entregues a apoiadores da ditadura.
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Felipe, Ernestina e Marcela
A dona do Clarín chegou a passar dois dias na cadeia, em 2002, por irregularidades na adoção dos filhos.
Em 13 de maio de 1976, Ernestina se apresentou diante da Justiça em San Isidro, com um bebê a quem chamou de Marcela. Disse que a havia encontrado onze dias antes em uma caixa abandonada na porta de sua casa. Ofereceu como testemunhas uma vizinha e o caseiro da vizinha, cujos depoimentos foram desmentidos em 2001.
No caso do Felipe, Ernestina declarou que foi entregue em 7 de julho de 1976, pela suposta mãe, Carmen Luisa Delta, que não podia ficar com o bebê. No mesmo dia uma juíza concedeu a segunda guarda a Ernestina. A Justiça descobriu, anos depois, que Carmen nunca existiu.
Desde 2001, quando começaram as acusações, eles se recusam a fazer o exame. A questão deixou de ser opcional em novembro de 2009, quando o congresso aprovou uma lei de exame compulsório de DNA.
Felipe e Marcela foram obrigados a fazer o exame e o resultou mostrou que eles não são filhos de desaparecidos – pelo menos não estão entre aqueles registrados no Banco Nacional de Dados Genéticos.
Ernestina teve uma vida pública discreta, com poucos textos assinados e poucas aparições em eventos. Sua morte foi noticiada pelo Clarín. “A obra de Ernestina de Noble deixou sua marca”, lamentou o jornal.
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Carlos Valentin
19/06/2017 - 12h08
Foi abraçar o Gal. Videla juntamente com o diabo.
Cristóvão Feil
18/06/2017 - 17h20
PAPEL PRENSA, O FORDISMO NOS CRIMES DE LESA HUMANIDADE
É como se a Folha e O Globo tivessem o monopólio do papel de imprensa no Brasil, conseguido graças a extorsão mediante tortura, assassinato e desaparecimento de pessoas com a ajuda da mão forte da CIA
A presidente Cristina Fernández de Kirchner é uma mulher corajosa. Ela está mexendo com o thriller mais palpitante da Argentina. Suspense total. Ou como chamaríamos a uma história que está sendo contada desde janeiro de 1976, por ocasião de um jantar servido pelos generais Jorge Rafael Videla e Roberto Eduardo Viola ao bilionário casal David Graiver e Lidia Papaleo de Graiver, então donos da empresa Papel Prensa, e prossegue até nossos dias, com a ameaça de quebra da espinha dorsal dos dois principais diários da Argentina? É como se a Folha e O Globo estivessem envolvidos em crimes de lesa humanidade para lograr êxito no controle do papel de imprensa com o qual editam seus diários.
Repito: thriller, suspense.
Ingredientes: mortes violentas jamais explicadas, milhões de dólares (a preços da década de 70), CIA, sabotagem, queda de avião, muitos bancos envolvidos, a O.P.M. Montoneros, um banqueiro que financia a esquerda, grupo Abril/Civita, organizações Bunge y Born, sequestro dos irmãos Born, compra de bancos em Nova York, sequestro em massa da família Graiver, tortura, extorsão, dois presidentes argentinos, não por acaso, gorilas, assassinatos, Martínez de Hoz (que seria o cérebro do caso Papel Prensa, e ainda vive), jornais Clarín e La Nación como monopolizadores de todo o papel destinado à imprensa argentina, etc.
A psicóloga de olhos verdes, Lidia Papaleo, está com 66 anos, hoje. É viúva do conhecido “banqueiro dos Montoneros”, David Graiver, morto misteriosamente aos 35 anos de idade no acidente fatal de um avião Jet Falcon de sua propriedade, quando viajava de Nova York, onde trabalhava durante os dias úteis, para Acapulco no México, onde morava e convivia com a sua família nos finais de semana. Quando morre no suspeito acidente, até hoje inexplicado, David Graiver era dono de um império avaliado em 200 milhões de dólares, hoje, certamente mais que um bilhão, corrigidos. Entre suas posses se podiam somar vários imóveis rurais e urbanos herdados de sua família judia, e mais: dois bancos na Argentina, dois bancos em Nova York, um banco na Bélgica e um banco em Israel. Sem esquecer a própria empresa de papel e celulose Papel Prensa, praticamente um monopólio na fabricação e distribuição de matéria-prima para todos os jornais argentinos.
Dudi Graiver, como era conhecido, eram também rico em amigos. Em parte, pelo casamento com Lidia Papaleo, uma mulher forte e influente junto ao marido, e que havia sido companheira de um jornalista de esquerda chamado Jarito Walker, editor da revista política El Descamisado. A relação de Graiver com Jarito Walker lhe valeu uma aproximação com a Organização Político-Militar Montoneros, um dos braços armados do peronismo, através do adjunto do comandante Mario Firmenich, Roberto Quieto.
A propriedade parcial da Papel Prensa foi conseguida em 1973, graças à intervenção de Josef Ber Gelbard, ministro de Economia tanto dos presidentes “peronistas” Raúl Lastiri e Héctor Cámpora, quanto do próprio Perón e Isabelita, quando o líder de massas já havia morrido. O montonero (ex-PC) Gelbard foi um aliado determinante de Graiver na pressão sobre os ítalos-argentinos Civita (grupo Abril) para que estes vendessem cerca de 26% das ações da Papel Prensa. Outros 25% das ações eram do Estado e os 49% restantes estavam pulverizadas em cerca de 30 mil acionistas anônimos.
No conturbado governo de Isabelita Perón (na foto ao lado com Videla e Almirante Massera), grupos de extrema direita começam a se organizar à sombra generosa do peronismo. Eram conhecidos e temidos como a Triple A, a rigor, forças parapoliciais comandadas de dentro do governo de Isabelita pelo “bruxo” José Lopez Rega. Todos eram peronistas e mesmo assim se matavam mutuamente em plena luz do dia, ora eram os sindicalistas, os autores, ora os Monto, as vítimas, ora a milícia fascista e palaciana de Lopez Rega, com a discreta aprovação da presidenta Maria Estela Martínez de Perón. E vice-versa. Os militares assistiam de camarote blindado, prontos para intervir como porta-vozes dos interesses das oligarquias latifundiárias e de suas próprias armas corporativas.
Numa tarde quente de janeiro de 1976, o casal Graiver estava veraneando em seu bangalô em Punta del Este, litoral uruguaio. O telefone toca e no outro lado da linha estava o comandante do Exército argentino, Jorge Rafael Videla, subordinado à temerária presidente Isabelita. O general-comandante estava convidando Dudi e Lidia para jantar naquela noite de verão. Eles aceitaram e seguiram para Buenos Aires de avião alugado. No jantar, estavam os três, o casal e Videla, e juntou-se a eles o subcomandante, general Roberto Eduardo Viola Redondo. O jantar foi indigesto, os dois gorilas estavam comunicando ao influente casal que o golpe estava marcado para março daquele ano, portanto, a menos de dois meses.
E assim aconteceu o “pronunciamento militar” de 24 de março de 1976, como os jornais oligárquicos chamavam os golpes militares na América Latina, em décadas passadas.
Desde o início do governo de Isabelita e com as ameaças e assassinatos da Triple A, os Graiver já haviam se mudado para o eixo Acapulco-Nova York. Mas Dudi Graiver jamais deixou abandonado os interesses negociais e sobretudo as propriedades na Argentina. O resgate pelo sequestro dos irmãos Born (do grupo Bunge y Born), operado pelos guerrilheiros Montoneros em setembro de 1974, estava investido nos bancos de David Graiver. Foram 60 milhões de dólares que circularam pelos bancos Graiver de Buenos Aires, Nova York, Bruxelas e Tel-Aviv. Em março de 1976, mês e ano do golpe gorila de Jorge Rafael Videla contra Isabelita, os bancos de Graiver remuneraram a organização guerrilheira peronista com 193 mil dólares, só de juros, segundo o jornalista investigativo argentino, que vive na Suíça, Juan Gasparini. Hoje, essa quantia não ficaria por menos de meio milhão de dólares ao mês.
Nunca um golpe militar é puramente obra de militares, limitados e parvos que são para as coisas da política, da economia e da gestão pública como um todo. Videla, assim, leva Martínez de Hoz, membro de secular oligarquia argentina, para exercer o cargo de ministro da Economia. Atualmente se sabe que Martínez de Hoz foi um dos ideólogos do golpe e do regime autodenominado de Processo de Reorganização Nacional, ou simplesmente Processo, que durou até 1983, abortado pela derrota argentina na Guerra das Malvinas.
Martínez de Hoz está sendo atualmente processado por seus inúmeros crimes, em especial os que extorquiam grandes empresários mediante tortura para que endossassem a “venda” de suas empresas e bens para militares influentes na ditadura que controlavam com grande violência e crueldade. Foram dezenas de comerciantes, proprietários rurais, industriais e banqueiros que tiveram seus bens roubados debaixo de tortura nos inúmeros aparelhos repressivos clandestinos das três armas militares. O cérebro deste processo fordista de saque consentido e operado pelo aparelho estatal foi o ministro da Economia, José Alfredo Martinez de Hoz, apelido Joe, que está agora com 85 anos.
Pois é o método pragmático e objetivo de Martínez de Hoz (ao lado, sorrindo com o general Videla) que foi empregado à família Graiver para subtrair-lhe o controle da empresa de celulose Papel Prensa. A ditadura civil-militar precisava vencer e impor uma versão ideologizada dos atos abomináveis que cometiam. Para tanto, nada mais justo e adequado do que creditar à mídia impressa o papel que lhe cabe na escrita de um novo consenso, ainda que parido pela vaca fardada da coerção. Os diários Clarín, La Nación, La Razón (hoje extinto) já haviam sido parceiros no golpe de 24 de março, assim como os dois jornais de Jacob Timmermann, La Opinión e La Tarde, este dirigido pelo seu filho Héctor, ex-embaixador argentino nos EUA e atual ministro de Relações Exteriores do governo Cristina Kirchner. Héctor Timmermann, registre-se, está, no presente momento, assumindo uma posição correta, reclamando justiça e pela completa solução do misterioso caso.
No segundo semestre de 1976, nos meses posteriores ao golpe, Lidia Papaleo de Graiver e seus familiares sofrem pressão quase insuportável até que concordam em repassar o controle da Prensa Papel para as empresas que representavam o Clarín, La Nación e la Razón. Os ativos são calculados em 8,3 milhões de dólares, bem abaixo do preço efetivo de mercado, especialmente se fosse considerado o caráter monopolista e estratégico da empresa papeleira. Lidia cedeu não só pela pressão sofrida, mas também pela insolvência que rondava as demais empresas e negócios da família. A morte prematura e misteriosa de David em agosto de 1976 desencadeou uma iliquidez em série nos negócios dos Graiver, era ele que conduzia pessoalmente todos os investimentos cruzados e interdependentes dos ativos financeiros que possuiam. Lidia e familiares estavam acuados, economicamente abalados, politicamente pressionados, e biologicamente em risco.
O jornalista Juan Gasparini assegura que tem a mão pesada da CIA no acidente que levou a vida de Graiver. Para ele, os militares argentinos e Washington não iriam tolerar que o financiador ou gerente financeiro de um grupo político considerado terrorista, como os Montoneros, fosse dono de dois bancos no coração de Nova York e ainda por cima manejar dinheiro mal havido sem que as autoridades pudessem sequer intervir. Logo, a ação de sabotagem no avião foi uma saída honrosa tanto para a Casa Branca quanto para a Casa Rosada.
Depois disso a situação estava em plano inclinado, deslizando rápido para o completo desastre. Culminou que em março de 1977, a repressão argentina desencadeou a Operação Amigo, que consistiu no sequestro de 24 pessoas ligadas às empresas Graiver. A violência se abateu sobre Lidia Papaleo e mais 23 familiares, empregados, e executivos do grupo Graiver, sendo que dois indivíduos ligados ao falecido Dudi Graiver, de nome Rubinstein e Sajón, já estavam mortos e desaparecidos.
Nesta fase há um interregno de perguntas sem respostas, em parte, devido ao trauma sofrido pela viúva de Graiver, que não quis ou não pôde se manifestar. Osvaldo Papaleo, irmão de Lidia, sustentou por algum tempo que a Papel Prensa foi adquirida pelo Clarín e La Nación enquanto a família Graiver e os empregados estavam sequestrados e sendo torturados em algum covil policial ou militar.
O certo é que Lidia Papaleo de Graiver sofreu torturas na prisão. Um torturador perguntava sempre sobre o dinheiro dos Montoneros, chamando-a de “guacha de mierda”. O sofrimento foi maior quando desenvolveu um tumor no cérebro, tendo sido operada no próprio cárcere, segundo conta o jornalista Juan Gasparini no seu livro sobre David Graiver. Lidia só foi solta em agosto de 1982, quando a ditadura já havia perdido a Guerra das Malvinas para a Inglaterra de Margaret Thatcher, e estava nos seus estertores, tanto que o ditador Leopoldo Galtieri já havia renunciado. Foi sucedido ainda por outro ditador, o último, Reynaldo Bignone, que depois passou a presidência para o presidente eleito Raúl Alfonsín, em dezembro de 1983.
Antes de ganhar a liberdade, Lidia passou por choques elétricos e pontas de cigarros acesos sobre a pele nos centros militares de tortura conhecidos como Poço Banfield e Posto Vasco, ambos na província de Buenos Aires, sob a custódia do Departamento Central de Polícia. Finalmente, foi submetida à farsa judicial de um Conselho de Guerra, onde foi humilhada e acusada de crimes contra o Estado. O jornalista Juan Gasparini garante ainda que o policial Miguel Etchecolatz, Diretor de Investigações da Polícia Bonaerense, violentou Lidia depois de uma prolongada sessão de tortura física e psicológica. De fato, é certo que muitos psicopatas desenvolvem grande excitação sexual depois de assistirem cenas de sofrimento alheio, especialmente vendo a dor feminina.
Lidia, já em liberdade, ainda sofreria um câncer mamário, mas isso não a impediu de se dedicar à sua profissão de psicóloga e casar novamente, desta vez com um estadunidense chamado Steve Tage.
Segundo depoimento de um irmão de Lidia à imprensa portenha, ela não mexeu mais no áspero tema de sua vida porque considerava que este é um assunto de Estado. Ela não acreditava que as suas agruras e sofrimentos pudessem ser resolvidos por denúncias vagas na imprensa, em livros, em instâncias partidárias, em ONG’s, ou na Justiça comum. Não, ela acredita – segundo seu irmão – que este é um problema para o Estado argentino resolver. Tudo leva a crer que uma mulher, Cristina Fernández de Kirchner, entendeu o recado de Lidia Papaleo de Graiver.
Trata-se, sim, de uma questão de Estado. Foram cometidos “crimes de lesa humanidade” em série, segundo consta na denúncia da promotoria argentina. Uma família foi violentada, torturada e dela foi esbulhado um bem material – Papel Prensa – que hoje está servindo de instrumento de luta política pela mídia crioula e oligárquica para que a Argentina retorne a um tempo em que as cidadãs e os cidadãos eram torturados, mortos e desaparecidos.
O assunto Papel Prensa é estratégico. É uma disputa pelo Estado. Não é de graça que o editorial do jornal Clarín assume um tom confessional quando disse há dois dias que “o Governo avança em Papel Prensa para controlar a palavra impressa”. É como disse um articulista do jornal Página/12 ontem, essa admissão do Clarín em Direito se chamaria “confissão da parte” ou “relevo de provas”, já em Psicologia pode-se chamar de “projeção”. De qualquer forma, é sim um mecanismo de defesa que consiste em atribuir a terceiros ou ao mundo que o rodeia os erros ou desejos pessoais.
A rigor, um ciclo está se fechando na Argentina, e de resto, também em toda a América do Sul. A queda iminente e provável do grupo midiático Clarín (jornais, rádios, tevês) é uma parte da história que queremos ver pelo espelho retrovisor, e não é à toa que tem como protagonistas duas mulheres fortes, Lidia e Cristina.
[PUBLICADO DO BLOG “Diário Gauche”, em 26 de agosto de 2010.]
Davi Corrêa
18/06/2017 - 14h01
Vá com o capeta!
Ricardo
17/06/2017 - 19h25
Coitados dos vermes necrófagos.
Terão uma péssima digestão depois de comerem essa velha.