A um mês da Constituinte, o que mudou na Venezuela?
O presidente Nicolás Maduro anuncia medidas para retirar o país da depressão econômica promovida pelo boicote imperialista. Passado um mês da eleição, o que mudou com a Constituinte?
Por Aline Piva em 09 de setembro às 18h17
Respondendo a uma das principais demandas do processo constituinte, Nicolás Maduro acaba de anunciar uma série de medidas econômicas que visam combater os gargalos que asfixiam o país: inflação, desabastecimento, fuga de divisas. Mas passado pouco mais de mês da eleição dos representantes da Assembleia Nacional Constituinte, o que mudou na Venezuela?
Internamente, o processo constituinte alcançou um dos principais objetivos: colocar um fim ao ciclo de protestos violentos e aos trancazos que paralisaram parte do país por mais de três meses. Há um claro esvaziamento do poder de mobilização da oposição. Durante meses, os porta-vozes da MUD insuflaram os ânimos dos setores mais violentos e reacionários da sociedade venezuelana, apontando para um horizonte de derrota incontestável do chavismo. Repetiram, mais uma vez, o mesmo erro de cálculo estratégico de ciclos eleitorais anteriores.
A aposta no tudo ou nada da oposição foi um tiro no pé: nem conseguiram chegar a Miraflores, nem conseguiram criar um governo paralelo. E mais: ao subestimar o povo venezuelano, ficaram em um beco sem saída. A MUD agora se vê obrigada a entrar no jogo democrático: os partidos que compõe a coalizão, como o partido do Ramos Allup ou o Voluntad Popular do Freddy Guevara, apesar de seguidamente desconhecer as autoridades eleitorais, inscreveram 196 candidatos para as próximas eleições estaduais previstas para outubro. Isso não significa dizer que abandonaram a alternativa golpista, e a ofensiva internacional contra a Venezuela é uma mostra clara disso.
Desde que a Constituinte foi estabelecida, vimos o que já vinha se anunciando há bastante tempo: uma escalada dos ataques, não só no âmbito dos organismos multilaterais, mas também vindo de países vizinhos, como Brasil, Colômbia, México, e, principalmente, dos Estados Unidos. Não contente com as ameaças de uma invasão militar direta, o governo Trump impôs uma série de novas sanções à Venezuela, em uma clara tentativa de asfixiar ainda mais a economia do país. Como se as sanções estadunidenses não bastassem, os representantes da oposição começaram uma turnê pela Europa para pedir ainda mais sanções e um bloqueio financeiro que não só irá impor novos desafios para a recuperação econômica do país, como trará certamente mais sofrimento para o povo venezuelano.
A ANC, por sua vez, começou seus trabalhos tomando decisões fundamentais para a recomposição do Estado, para o reestabelecimento do pacto social e para o destravamento do país, como a proposta de reformulação das normas de convivência dos poderes públicos e a instauração da Comissão para a Verdade, Justiça e Reparação para as vítimas da violência política no país. Os anúncios econômicos de ontem também foram um passo importante não só para fazer frente aos impactos das sanções, mas também para avançar na normalização do cotidiano do país.
Uma coisa é certa: as eleições de 30 de julho foram uma vitória tática do chavismo, que recompôs mais uma vez o equilíbrio de forças internas. O chavismo emerge remoralizado e repolitizado, e aponta para o surgimento de novas lideranças para reorganizar a base social do processo revolucionário. O povo venezuelano escolheu o diálogo, a paz, a justiça, o avanço das transformações sociais e políticas. Muito ironicamente, esses supostos paladinos da justiça e da democracia, como Freddy Gurevara e Julio Borges se mostram, mais uma vez, dispostos a tudo – inclusive a colocar em risco a vida dos venezuelanos – para tirar Maduro do poder.
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Rodrigo Fogaça Rodrigues
10/09/2017 - 20h05
O nosso amigo aí de cima esqueceu de mencionar as diversas eleições ocorridas na Venezuela nos últimos anos em que a oposição foi derrotada em quase todas… agressões à democracia é fechar rodovias de abastecimento, implorar por intervenção estrangeira, fazer conchavos com a máfia de Miami… eu acho engraçado que na maioria dos protestos da oposição se vê grande parte das pessoas de pele branca, enquanto o país é altamente miscigenado… estranho não? Tem gente que não descansa enquanto não ver uma bandeira americana fincada em solo alheio.
José Eduardo Garcia de Souza
11/09/2017 - 19h14
O que você coloca é debatível, mas não invalida a existência do relatório da ONU, dos 5.000 presos políticos e etcetera e tal que foram o ponto do meu comentário. O relatório existe. Os presos estão lá. Os mortos nas manifestações estão lá. Maduro arregou de ir à ONU. Por que é que a Aline Piva não os menciona? Será porque a tal “escolha do povo pelo diálogo, paz, justiça, avanço das transformações sociais e políticas” é mera repetição de uma linha oficial para tentar engazopar incautos e justificar uma ditadura?
José Eduardo Garcia de Souza
09/09/2017 - 20h24
Mais uma vez, a articulista ignora flagrantemente os fatos além do que os comunicados oficiais do governo de Maduro oferecem, numa tentativa patética de pintar um quadro que demonstre que Maduro detém o controle da situação pela via democrática. Isto porque ignora ou omite propositadamente menção a relatório do Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos indica a existência de uma “estratégia para reprimir a oposição política e cultivar o medo” na Venezuela e pede mais investigações sobre o estado das lierdades no país. O relatório volta a pedir ao governo de Maduro que liberte manifestantes detidos de forma arbitrária e que acabe com os julgamentos de civis por tribunais militares, fazendo referência ao “pequeno fato” de que, das cinco mil pessoas que foram detidas durante a recente vaga de protestos, mil permanecem ainda encarceradas. além de fazer denúncias de casos de tortura e maus-tratos aos prisioneiros. A articulista tampouco faz menção ao fato de que Maduro cancelou a sua participação e discurso na sessão de abertura do Conselho de Direitos Humanos da ONU, em Genebra, que começa no dia 11 deste mês. sem dúvida temendo protestos e cobranças de diplomatas oriundas não somente do relatório anteriormente mencionado mas também de protestos de venezuelanos no exílio.
E, como não poderia deixar de ser, encerra o artigo com o refrão com que Maduro tenta encobrir as suas constantes agressões à democracia e aos direitos humanos: “O povo venezuelano escolheu o diálogo, a paz, a justiça, o avanço das transformações sociais e políticas”, faltando apenas informar ali qual parte do povo venezuelano o fez, e sob que condições.