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Casa de Mariana: o trem começou a andar.

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Durante algum tempo tentei conseguir alguma instituição que se dispusesse a comprar a modesta casa em que nasci, na cidade mineira de Mariana – que continua exatamente igual ao que era setenta anos atrás. O plano, como anunciei aqui na Internet, é doar para a cidade minha biblioteca de cerca de quatro mil volumes, comprados um por um, ao longo das últimas décadas. Além dos livros, pretendo dar o mesmo destino a todo o acervo de documentos, cartas e entrevistas que acumulei em cinquenta anos de trabalho como jornalista, deputado, escritor e ativista político. As gravações de entrevistas que realizei para todos os meus livros (e dezenas de reportagens) estão lá. Há coisas interessantes, que vão desde os áudios de entrevistas com personalidades – entre outros, Luís Carlos Prestes, Fernando Collor, Fidel Castro, Yasser Arafat, Eric Hobsbawn, Ulysses Guimarães, Alfredo Stroessner, Daniel Ortega, Anastácio Somoza, Mário Firmenich, Dilma, Lula, Comandante Timochenko, Julian Assange… – até acervos históricos, como, por exemplo, três décadas de correspondência trocada entre Carlos Lacerda e seu advogado Fernando Veloso (doador do material). Há também uma coleção de algumas centenas de fotos jornalísticas.
 
E tem, claro, muita coisa curiosa e sem valor, que eu chamo de “fetiches políticos” – como a placa original do carro dos pistoleiros da rua Toneleros, o relógio de ouro que Muamar Kadafi me deu (com o rosto dele estampado no mostrador), uma caixa de charutos de prata portuguesa com uma dedicatória a mim, do Comandante Fidel Castro, gravada na tampa, um taco de beisebol com um bilhete escrito nele pelo presidente Hugo Chávez…
 
Essa montanha de livros, documentos, fotos, fitas, cds, dvds e cacarecos, ainda sem catalogação, está guardada num depósito aqui em São Paulo – cuidado que me custa um razoável dinheirinho mensal.
 
Como eu havia dito aqui, se algum dia eu vier a faltar, como dizia o Roberto Marinho, não sei que destino dariam a esse material. Eu gostaria que pudesse ficar tudo em Mariana, na casa em que nasci, para ser digitalizado e disponibilizado num site para quem se interessar.
 
Quanto custaria comprar a casa, adaptá-la e digitalizar o material? Eu não sabia, mas não era difícil calcular. Na época, perguntei aqui: alguém tem alguma ideia de como levantar essa grana? Alguém ganhou a mega-sena acumulada e está precisando comprar indulgências que lhes abram as portas do céu? Eu dizia mais: por último, mas não menos importante: não estou pedindo nada, nem um tostão, por esse acervo. Estou doando.
 
Bem, aí apareceu o Ótimo Samaritano. Uma pessoa com quem não tinha qualquer relação mais próxima, me mandou um e-mail: “Manda bala, eu compro a casa para você”. A única exigência dele foi o anonimato – como costumam fazer as pessoas verdadeiramente generosas.
 
A Casa de Mariana – vai se chamar assim – não será apenas o destino do acervo. Decidimos transformá-la num centro de debates, minicursos e seminários sobre Jornalismo, História, Política, Cinema, Teatro e Literatura.
 
Entre outros, muitos outros, já se ofereceram para ministrar workshops e cursos na Casa de Mariana os seguintes profissionais:
 

  • Afonso Borges, jornalista e produtor cultural: duas vezes por ano seu projeto intitulado “Sempre um Papo” será realizado na casa de mariana.
  • Alberto Villas, jornalista e escritor: oficinas sobre o tema “imprensa alternativa no brasil durante a ditadura militar”.
  • Américo Vermelho, fotógrafo.
  • Anthero Meirelles, ex-jornalista, economista e diretor do Banco Central: oficinas de trabalho para jornalistas especializados em Economia.
  • Daniele Ottobre, cineasta italiano especializado na temática social e ambiental: oficinas de trabalho sobre o tema “cinema documental e ambientalismo”.
  • Deonísio da Silva, filólogo e escritor. Vai ministrar oficinas sobre dois temas: uma sobre a origem de palavras e expressões e outra, intitulada “narrativas curtas”, para ensinar estudantes de jornalismo e de letras a contar uma boa história.
  • Eric Nepomuceno, jornalista, escritor e tradutor: oficinas sobre jornalismo e literatura.
  • Fernando Morais: oficinas sobre reportagem, jornalismo investigativo e jornalismo literário.
  • João Batista da Costa aguiar, artista gráfico: oficinas sobre “A feitura de um livro, da capa ao miolo”.
  • Luciana Franzolin (da London School of Photography) e Alex Mita, foóografo da agencia France Presse: workshops de fotografia e fotojornalismo.
  • Polé Láfer de Jesus: oficinas sobre ilustração jornalística.
  • Tatiana Quintella, documentarista, produtora e dona da Popcom Filmes: workshops de produção cinematográfica.

 
A negociação com o proprietário da casa ficou muito difícil, porque o preço pedido está acima do mercado imobiliário da cidade. Para não perder tempo, decidimos iniciar o trabalho de organização, seleção, catalogação e digitalização de todo o material (biblioteca + acervo). Para isso acabamos de alugar essa simpática casinha que aparece à direita, na foto, ao pé da Igreja de São Pedro. Em mais alguns dias um caminhão transportará tudo para lá.
 
Como diz o Gilberto Gil, com fé não costuma falhar.
Vamos lá. Viva a Casa de Mariana.
 

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  1. Avatar

    Sou jornalista aposentada. Estou à disposição para dar uma força em trabalhos que possam ser realizados pela internet.
    Boa sorte para todos e parabéns pela iniciativa.
    Amália Ponce

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    Gabriel Arcanjo Nogueira says:

    Preclaro Fernando: tenho, encadernados, os 2 únicos exemplares de “Repórter Três” que circularam, bem como a capa que sairia e foi censurada. Juntei tb recorte de jornal e cópia da nota do SJPESP sobre o infausto. Caso queira incorporar o volume à sua vasta biblioteca, à vontade.

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    Aparecida Petrillo says:

    Parabéns Fernando. Junto com o Professor Roque, acompanhei a sua vontade de comprar a casa onde nasceu. Se precisar conte comigo. A Casa de Mariana já é um sucesso! Abraços

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    Silvia Hernandes says:

    Pena q está tão longe de São Paulo. Eu daria algumas horas por semana p organizar esse material. Sou historiadora com especialização e muita experiência em Arquivologia.

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    Fernando Morais, sou apreciador de longa data dos teus escritos . Colaborei para que este blog se tornasse realidade e espero mais notícias sobre o andamento deste novo projeto. Certamente visitarei Mariana para também conhecer teu acervo!
    Grande abraço

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    Tanto a sua quanto a do “anonimo generoso e de coração grandioso”, são iniciativas belas e encantadoras. Com essa iniciativa o coração da “Bela Princesa” transborda de alegria.
    Quem sabe com mais este ponto turístico Mariana comece a pensar em outras maneiras de sobreviver que não seja somente a mineração.

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    CARLOS ANTONIO DA SILVA says:

    Parabéns Fernando Morais pela iniciativa. Estou à disposição para dar uma força. Sou Jornalista mas, trabalho com TI, precisando de alguma coisa… sempre as ordens!!

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    Ennio Rodrigues says:

    Ola, Fernando. Quero contribuir de alguma forma para o projeto. Sou mestrando em Comunicação do PPGOM UFOP, que fica aqui em Mariana. Como está o projeto no momento? Alguma forma de eu me envolver? Abraço!

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    Francisca Dutra says:

    Ainda bem que existem pessoas como vc, Fernando.
    Fiquei preocupada com a “simpática casinha” que alugaram para levar todo o acervo. A casa é segura para guardar tantos objetos de valor? Espero que essa minha desconfiança seja só uma coisa de mineira que sou.

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