Comportamento

Mania de privatizar


 
Porque a gente acha que a solução pra tudo é privatizar o que é público? Da onde vem essa ideia? Primeira coisa que a gente tem uma percepção do senso comum, uma percepção geral de que aquilo que é público é do governo, e não público em si. O parque, então, seria um parque do governo. Um teatro é do governo, uma biblioteca é do governo. Quando são bens comuns geridos pelo poder público. Tecnicamente, na teoria como funcionaria isso é: temos bens comuns dessa nação e escolhemos pessoas que vão durante um determinado tempo administrar esses bens, pessoas que têm planos de administração e a gente vota nesses planos. Não é assim que acontece, né gente? Primeiro que nosso voto já não vale mais porra nenhuma. Segundo porque a máquina de ignorância faz com que a gente vote de uma forma muito esquisita. O próprio sistema precisa ser visto, então não é assim que funciona. Junto com isso tem, há alguns anos, um sucateamento do espaço público. Uma praça não é mais de todo mundo, ela é de ninguém. Inclusive do governo, não conserta um banquinho, não cata uma flor. Pra pedir pra capinar uma praça, você tem que pedir pro espírito do Fidel Castro, sei lá pra quem você tem que fazer um pedido pra capinar uma praça. E não tem uma mobilização para que se exija do poder público que cumpra sua função que é, no mínimo, capinar a praça. Porque que a gente vai delegar todas essas funções ao setor privado? “Ai, mas Ana Roxo, também você tem que problematizar tudo? Qual o problema? Se a gente privatizar ou conceder e vai melhorar a praça, qual é o problema?” O problema é que o terceiro setor, como a iniciativa privada, tem um olhar sobre o bem, patrimônio privado, que tem regras e a gente não apita nas regras. Quando você está num shopping center que é um lugar privado, se você quer fazer qualquer outra coisa, eu quero fazer um encontro de poesia no shopping center, no way querido! Vai vim o segurança e vai dizer, não, aqui não pode. Se quiser andar de skate no shopping, não pode. Quem nos garante que essas regras e esses “não pode”, não vai ser estendido para as concessões, para as privatizações sem que a gente tenho como opinar sobre a coisa. A questão vai muito além da lógica de se está de graça eu posso ir. Porque pra entrar no shopping é de graça, agora eu não posso fazer nada naquele shopping. Porque aquilo não é meu. Patrimônio público seria meu. Não me faça ter que usar o trocadilho aqui: o que é público não é privada. O problema do espaço público ser mal gerido, não é porque ele é público, é porque ele é mal gerido. O problema é a má gestão, não é ele ser público. Junto com isso quando a gente olha pro mundo, o sucateamento do espaço público e nossa própria incapacidade de usar o espaço público como bem comum, porque a gente está muito acostumado a: o que é meu, é meu. O que é do outro, é do outro. Um individualismo tão grande, que pra gente é mais fácil lidar com um negócio: isso aí e do meu patrão, mas ele deixa eu usar. Como ele é bonzinho! Ninguém tem que ser bonzinho pra você usar o espaço público, o espaço público é seu! Importante que a gente se conscientize de que o que é público é nosso. É muito entreguista você dar por pressuposto  que o estado é incompetente sem tentar tornar o estado competente. Se apropriar dos mecanismos de deixar esse estado competente. A gente não pode deixar se cooptar pela desesperança: ah não dá certo mesmo, melhor a iniciativa privada cuidar. Porque isso também é uma máquina, também é uma indústria e também é uma construção. Porque, atualmente, quem está no poder são os mesmos donos da iniciativa privada, que vai gerir aquilo que eles estão gerindo no poder público. Então, é uma lógica muito louca da desesperança. É uma desesperança quase fabricada, como se o mundo fosse um fato dado e não tivesse como transformar. É isso que os donos do mundo querem, que a gente olhe pro mundo com desesperança.

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  1. Avatar
    Adelia Sylvia Penna Ramos says:

    Como sempre, Aninha, na mosca! Se me permite, também seria bom lembrar que o presidente, o vice, e todos os deputados, prefeitos, vereadores são NOSSOS empregados. A gente põe eles lá pra trabalhar para o Povo e é o Povo que paga os salários deles.

  2. Avatar

    Essa construção na cultura do conceito de que o que é público não presta, não funciona e deve ser privatizado é feita diariamente pela mídia empresarial canalha e suas tropas.
    O fito não reside na busca do bem comum, mas na busca de concentração de renda, fundamento primário desse capitalismo inescrupuloso.
    Por que não lançar uma campanha nacional do tipo “Vamos ocupar a praça pública!”?
    O discurso nem precisaria ser tão complexo: evolutivamente nossa espécie – e todas as outras do planeta – não têm a menor chance no longo prazo sem sermos solidários. O individualismo nos destruirá, à luz da mais tênue razão.
    Em tempo: Ana, como diria o bregofilósofo Falcão em “francês canônico”, vous êtes fodà! rssss

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